RIO – Em busca de matéria-prima para as baterias de seus veículos eletrificados, a alemã Volkswagen e a chinesa BYD disputam a compra da maior produtora de lítio no Brasil, a Sigma Lithium, segundo informações veiculadas na imprensa.
Localizada no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, hoje conhecido como Vale do Lítio, a Sigma vem chamando a atenção de investidores no cenário internacional, por oferecer um lítio “verde”, já beneficiado quimicamente, com zero emissões de carbono e baixo impacto ambiental.
Chamado de “petróleo branco”, o lítio deve ver sua demanda crescer vertiginosamente, em mais de 40 vezes até 2040, segundo projeção da Agência Internacional de Energia (IEA, em inglês).
O mundo já começa a assistir uma corrida pelo mineral. Apesar de cerca de 65% das reservas encontradas estarem no Chile, Bolívia e Argentina, é a China que concentra o processamento do lítio, com cerca de 90% da capacidade global de beneficiamento do mineral.
Entenda, a seguir, os planos das duas montadoras para o mercado de eletrificados.
Volkswagen busca barrar avanço chinês no mercado de baterias
A Volkswagen, maior montadora da Europa, tem como um dos principais objetivos da sua estratégia reduzir a dependência de componentes para veículos elétricos vindos da China.
Um dos gargalos identificados pela companhia é a exploração mineral, que hoje também é dominada por empresas chinesas mundo afora.
“O gargalo para as matérias-primas é a capacidade de mineração – é por isso que precisamos investir diretamente nas minas”, disse à Reuters, Thomas Schmall, CEO da divisão de componentes da Volkswagem, e ex-CEO da Volkswagen no Brasil.
Para mudar esse cenário, a companhia busca minas para exploração de lítio do Canadá à Indonésia, disse um alto executivo da VW ao The Wall Street Journal. Uma delas é a Sigma Lithium, segundo apuração da Exame.
Os planos da montadora alemã vão desde atender à demanda da sua própria produção de veículos elétricos até o posicionamento como fornecedora global de baterias, principalmente na Europa e na América do Norte. Para isso, criou em 2022 a subsidiária PowerCo, focada na fabricação de baterias.
A subsidiária pretende alcançar 20 bilhões de euros em vendas anuais até 2030. E já anunciou a construção de unidades produtivas de larga em escala que deverão começar a operar em 2025, na Alemanha, em 2026, na Espanha e, em 2027, no Canadá.
Um dos objetivos da VW em dominar a cadeia produtiva é justamente tornar o veículo elétrico competitivo, e fazer frente à BYD, que já possui no mercado modelos com preços acessíveis. As baterias podem representar cerca de 40% do total do custo do veículo.
No ano passado, a Volkswagen divulgou detalhes de um EV que deve ser vendido a 25 mil euros na Europa, a partir de 2025. Até 2029, a companhia planeja colocar cerca de 26 milhões de veículos eléctricos nas estradas.
BYD quer verticalizar produção de elétricos no Brasil
Maior fabricante de carros elétricos do mundo, a chinesa BYD espera investir R$ 3 bilhões na sua primeira fábrica de elétricos fora da Ásia, no Brasil.
A estratégia é intensificar ainda mais o controle da sua cadeia de abastecimentos, possibilitando oferecer carros eletrificados a preços mais acessíveis.
No Brasil, a companhia promete verticalizar toda sua produção de veículos elétricos, desde a exploração e beneficiamento do lítio, passando pela fabricação de baterias, até a produção de ônibus e automóveis.
A ideia, segundo o presidente do Conselho da BYD Brasil, Alexandre Baldy, é “fazer do Brasil um hub regional na América Latina para a BYD”, revelou em entrevista à agência epbr.
A empresa também estuda investimentos na exploração do lítio e outros minerais no país.
“Há a pesquisa para o desenvolvimento e o investimento em minerais, sobretudo o lítio (…) Olhamos investimentos no estado de Minas Gerais e no estado da Bahia, na área de mineração”, conta o executivo.
Ao Financial Times, Baldy disse ainda que a companhia discute um possível acordo de fornecimento, joint venture ou aquisição da Sigma Lithium.
Parte do lítio poderia atender a demanda que virá a partir da ampliação da fábrica de baterias da BYD em Manaus, que fornece o componente para a fabricação de ônibus elétricos em outra unidade fabril da empresa, instalada em Campinas (SP).
Além disso, a montadora chinesa também considera a exportação de lítio brasileiro para atender às suas fábricas na Ásia, e as futuras, ainda em estudo, na Hungria e no México.
Por que o lítio da Sigma interessa?
A Sigma Lithium, com sede no Canadá e comandada pela brasileira Ana Cabral-Gardner, extrai minério de espodumênio e o processa em concentrado de lítio para bateria.
A companhia espera triplicar sua capacidade de produção anual de 270 mil toneladas, na sua unidade do Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais. Hoje, a quantidade é suficiente para abastecer 617 mil carros elétricos. A ideia é que esse número chegue a 1,6 milhão de carros já em 2024.
Atualmente, a empresa listada na Nasdaq e em Cingapura está em fase de reestruturação e possível venda. O processo deve ser concluído em fevereiro.
Segundo Gardner, a Sigma atraiu o interesse de “algumas das empresas mais admiradas de baterias e veículos elétricos do mundo, incluindo montadoras e fabricantes de baterias”.
A mineradora também anunciou que deve aumentar em 25% suas reservas de lítio em Minas Gerais, depois de encontrar novas, estimadas em 26 a 30 milhões de toneladas de lítio, na quarta etapa de exploração do projeto Grota do Cirilo.
Com isso, a companhia deve chegar a 110 milhões de toneladas do mineral encontradas no Vale do Lítio, o que a posiciona como uma das maiores do mundo neste setor.
As novas reservas se somam às 77 milhões de toneladas medidas e indicadas e outras 8,6 milhões de toneladas inferidas com teor de 1,43% de óxido de lítio (Li2O).
A Sigma Lithium também pretende acelerar seu programa exploratório com uma quinta etapa de desenvolvimento. A empresa já identificou potencial para mais 20 milhões de toneladas de lítio de novas reservas nesta próxima fase.
Lítio verde
O grande diferencial do lítio produzido pela empresa é o seu caráter ambiental. Segundo a Sigma, se trata do primeiro “lítio verde do mundo”, uma vez que sua produção conta com “zero carbono, zero rejeitos, zero químicos nocivos”, com uso de energia exclusivamente renovável e 100% de água reutilizada.
“Temos uma equipe incansável e resiliente que trabalha há anos em uma missão que se tornou nosso legado coletivo: apoiar a revolução dos veículos elétricos, fornecendo o material de lítio mais sustentável do mundo”, afirma Gardner.
Ela explica que a Sigma é uma produtora de grande escala e baixo custo, mas também tem estimativas de recursos minerais para potencialmente ultrapassar 110 milhões de toneladas de depósitos a céu aberto.
“Esta escala sublinha nossa relevância estratégica para se tornar a base das cadeias de suprimentos globais que entregarão a descarbonização das baterias de veículos elétricos”, disse a CEO em comunicado oficial.