Na recuperação econômica observada após a crise associada à pandemia da Covid-19, a elevação dos preços dos combustíveis tem sido marcante. No Brasil, bem como em outros mercados emergentes, a dor no bolso tem sido agravada pela desvalorização cambial. A desvalorização do real já vem impactado o custo de vida da população faz mais de um ano.
No Congresso Nacional tramitam algumas propostas para subsidiar o consumo de óleo diesel, gás de cozinha e gasolina. Aqui trato especificamente do mercado de óleo diesel e pontuo que o mercado está com demanda acima do volume observado em anos anteriores à crise econômica da Covid-19.
Na Figura 1 mostro a série mensal da ANP do preço de comercialização no varejo de óleo diesel até maio de 2022. Entre 2015 e 2017 o preço médio estava em torno de R$ 3 o litro, mas com a desvalorização cambial, o preço médio foi se aproximando de R$ 4 por litro. No contexto de recuperação da crise da Covid-19, com restrição de oferta clássica, o preço médio do óleo diesel estava em R$ 6,8 em maio. Sabemos que hoje este valor está mais elevado.
Figura 1 – Preço Médio Mensal de Revenda de Óleo Diesel, 2015-2022
Para completar uma análise deste mercado é importante observar o volume de venda de óleo diesel. Abaixo mostro o volume de venda, em m3, por mês, entre 2015 e 2022. O período 2015-2019 é apresentado como média e acrescentado um desvio-padrão para cima e para baixo para descrever o intervalo de variação – este intervalo está na área cinza.
A linha verde é o preço médio em 2021 e a laranja o preço de 2022 (por simplicidade, não apresento 2020). Comparando 2021 com a média de 2015-2019, observa-se que o volume de venda foi 11% superior, na média, entre os meses – esta elevação no consumo chegou a ser 14% maior em julho de 2021. Em 2022 o mercado continua aquecido, com volume 12,5% maior do que a média 2015-2019. O máximo de diferença da média foi 17% em fevereiro de 2022.
Figura 2 – Preço Médio Mensal de Revenda de Óleo Diesel, Média 2015-2019, 2021 e 2022
Efeitos da desoneração podem se perder na cadeia
No caso de redução de impostos, as empresas podem não repassar toda a variação, pois isso depende da demanda. Se a elasticidade da demanda por óleo diesel for baixa, quem vende enxerga uma forma de se apropriar da redução de impostos. Adicionalmente, se o mercado está com demanda alta, as empresas possuem poucos incentivos para reduzir o preço do óleo diesel.
Neste caso, a redução de tributos não teria o efeito desejado de reduzir preços. Em outras palavras, quando se reduz impostos para sustentar a demanda já aquecida, o consumidor de óleo diesel terá incentivo extra para manter o volume atual e o varejista terá incentivo para, pelo menos, manter o preço corrente.
Sendo assim, a depender do mercado local, o subsídio ao óleo diesel poderá não ser repassado para o consumidor final. Provavelmente, a consequência deste tipo de política terá pouco impacto sobre o preço na bomba, uma vez que a demanda por diesel se encontra elevada.
O caso americano
Este ano, os Estados americanos Maryland, Connecticut, e Georgia realizaram redução de impostos sobre a gasolina e óleo diesel — Connecticut não suspendeu imposto sobre diesel. Em períodos distintos, esses estados suspenderam impostos sobre gasolina e óleo diesel por aproximadamente três meses.
Um estudo realizado por pesquisadores da Wharton Business School, da Universidade da Pennsylvania, mostrou que a redução de impostos não foi repassada integralmente para os consumidores de gasolina e diesel.
Cobrimos por aqui:
- Por decreto, Bolsonaro vai usar os postos para mostrar queda dos preços
- Estados pedem, no STF, suspensão de alíquota única para ICMS de combustíveis
- Subsídios para GNV, gasolina e etanol vão à sanção
O repasse máximo para o preço final ficou entre 60 e 70% da redução original e não durou até o final da “promoção” de suspensão dos impostos. Por exemplo, em Connecticut a suspensão de impostos foi de 25 centavos de dólar e a redução máxima média (líquida) foi de 23 cents, chegando a 14 cents trinta dias antes do fim da suspensão de impostos.
Um estudo mais preciso, conduzido por professores do MIT e da Universidade da California, analisou o corte de impostos nos Estados americanos de Illinois e Montana em 2000 e 2001. Eles também mostram que é repassado, para o consumidor, até 70% da queda de impostos, mas adicionam maior detalhe — pois separam a redução de preços em locais com maior concorrência de outros com menor força competitiva.
Os autores encontraram evidência de que em localidades com maior competição ocorreu, naturalmente, maior redução de preços frente ao corte de impostos. [1]
Isto sugere que quando existe menor concorrência, varejistas possuem menor incentivo em competir utilizando preços mais baixos. O caso de menor concorrência também ocorre quando a demanda está aquecida. [2] Portanto, no presente momento a introdução de subsídios para óleo diesel poderá ter pouco impacto para o consumidor final em diversas localidades.
[1] Joseph D. Doyle Jr. e Krislert Samphantharak. $2.00 Gas! Studying the effects of a gas tax moratorium. Journal of Public Economics, 92, 2008.
[2] Severin Borenstein e Andrea Sheppard. Dynamic Retail Pricing in Retail Gasoline Market. Rand Journal of Economics, 27, 1996.
Victor Gomes é professor do Departamento de Economia da Universidade de Brasília.