A descentralização do sistema elétrico será inevitável com a eletrificação da economia, especialmente do setor de transporte, afirma Fabio Carrara, CEO e fundador da Solfácil – financiadora de geração distribuída (GD) no Brasil.
O executivo acredita que o sistema, como existe hoje, não vai dar conta da demanda, pois será bem maior que a atual.
“Apesar do Brasil estar com sobra de energia, historicamente, sabe-se que quando o país começa a crescer minimamente, o sistema fica um pouco sob pressão. Agora está acontecendo na mobilidade elétrica o que aconteceu no solar em 2015 e 2016”, avalia Carrara, em entrevista à agência epbr.
“O mercado de diesel, etanol e gasolina é duas vezes maior do que o mercado elétrico, em reais consumidos de combustível. Vai haver uma transição rápida disso para a rede, e a rede não vai aguentar, então a descentralização vai ser necessária”, completa.
Etanol pode segurar o ritmo
Contudo, o movimento para eletrificação da mobilidade no Brasil pode não ser tão rápido e tão intenso como na Europa, Estados Unidos e China, – que apostam nessa rota de descarbonização –, uma vez que por aqui o etanol já é um mercado consolidado.
Enquanto os veículos 100% elétricos disparam no cenário mundial como a solução mais eficaz para reduzir as emissões fósseis, o mercado brasileiro vê crescer a popularidade dos modelos híbridos – movidos a combustível e eletricidade.
O país registrou um crescimento de mais de 20 mil emplacamentos de veículos eletrificados (totalmente elétricos, híbridos convencionais e híbridos plug-in) apenas no primeiro semestre de 2023.
Os automóveis têm conquistado a preferência dos consumidores. Em 2022, aproximadamente 62% das vendas de eletrificados no país foram de versões híbridas.
Incentivo para gerar a própria energia elétrica
Segundo Carrara, com o avanço da eletrificação, a descentralização será inevitável e, em alguns casos, até mesmo incentivada.
“Aposto que vai ter um momento, um futuro, que o incentivo vai ter que ser dado para que o consumidor saia da concessionária e mandatoriamente, se morar em uma casa, tenha que produzir a energia dele, porque senão o sistema não vai dar conta”.
No segmento de geração distribuída de energia, são 23,6 GW de potência instalada da fonte solar no Brasil, segundo último levantamento da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar).
Para Carrara, essa expansão dos últimos anos da GD é resultado do alto preço da tarifa elétrica paga pelo consumidor, em contraste com a geração de energia renovável barata que existe no Brasil.
“A ascensão da GD brutal no Brasil é uma reação ao preço da energia impraticável. Está mostrando que o sistema elétrico brasileiro criou uma das energias elétricas mais caras do planeta Terra. E a GD é uma forma de deixar a energia na ponta mais barata para o consumidor”.
Início do ano desaquecido
Depois de uma forte expansão da geração distribuída em 2022, o primeiro semestre de 2023 teve uma queda de 19% da demanda de módulos fotovoltaicos, comparado ao mesmo período do ano passado, apesar de ter ultrapassado os 7 GW, segundo Estudo Estratégico: Geração Distribuída 2023, feito pela Greener.
“O ano de 2023 começou desafiador para o mercado de GD, porque houve uma antecipação muito grande de demanda no final de 2022 pela mudança do marco regulatório, mas o mercado começa a retomar ao patamar um pouco normal agora para o segundo semestre”, acredita Carrara.
Aprovada em 2022, a Lei nº 14.300/2022, considerada marco legal da GD, gerou uma corrida dos consumidores para assegurar a isenção de parcela da Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD) até 2045. O benefício só valia para as instalações feitas até 7 de janeiro de 2023.
No longo prazo, o executivo também acredita que o desenvolvimento tecnológico e barateamento das baterias também deve impulsionar o mercado de GD.
“Fato é que no longo prazo vai ser um mercado de baterias e a curva que nós temos de picos de consumo às duas da tarde, ou sete da noite, isso vai ser flat no longuíssimo prazo.
E quem vai fazer o papel de transformar essa curva em flat vai ser as baterias. Vai acontecer uma hora”, avalia.
Expansão da atuação
Além do financiamento, a Solfácil expandiu sua atuação para outros segmentos do setor solar, se posicionando em modelos de negócio mais independentes do regulatório possível, segundo o CEO.
“Fomos a primeira fintech solar do Brasil. Mas hoje nos consolidamos como um ecossistema. Também somos distribuidores de equipamentos fotovoltaicos, então, além de ajudar o integrador a financiar, também ajudamos ele a ofertar o equipamento, e temos também seguros para essa transação”, explica Carrara.
A companhia já financiou mais de R$ 2,2 bilhões de reais em empréstimos solares, sendo a segunda maior emissora de títulos verdes no Brasil e a quarta na América Latina, de acordo com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).
“Estruturamos vários FIDCs no mercado. Temos acessado o mercado de crédito com bastante frequência, com nomes bastante relevantes, desde Goldman Sachs, Itaú, que entraram nos FIDCs que nós estruturamos”.