A BR Distribuidora e a Golar Power trabalham na formação de uma sociedade para atuar na distribuição de gás natural liquefeito (GNL). Mas apesar do plano da Petrobras de liquidar a posição remanescente de 37,5% no capital da BR, a presença da petroleira no negócio desperta preocupações concorrências no Cade.
A BR Distribuidora pode exercer uma opção de compra de até 50% da Golar Distribuidora, operação que pode não apenas a entrada das duas empresas no segmento, como representar um crescimento do mercado de distribuição de GNL, ainda incipiente no Brasil.
“As partes pretendem aliar a expertise do grupo Golar na logística de GNL com a infraestrutura e experiência da BR na distribuição de combustíveis para desenvolver uma nova solução energética para o mercado brasileiro”, diz o documento enviado ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), que analisa a operação.
A BR é a maior distribuidora do país, em participação de mercado. Atua na logística e comercialização de combustíveis líquidos, incluindo o segmento de aviação, opera bases e terminais. Em 2019, a Petrobras conclui a oferta de ações que levou a pulverização do controle da BR Distribuidora, deixando de ser uma subsidiária integral.
A Golar é uma multinational com presença nos mercados de GNL e energia. No Brasil, tem uma unidade flutuante de armazenamento e regaseificação de GNL (FSRU) e 50% das Centrais Elétricas de Sergipe (Celse). É o projeto integrado de GNL e geração de energia no Porto de Sergipe.
Também é proprietária da FSRU Golar Winter, afretada para a Petrobras, no terminal da Bahia, que está em processo de arrendamento.
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A Petrobras está preparando a oferta das ações remanescente na BR Distribuidora, como parte do seu programa de venda de ativos.
A entrada no mercado de GNL coincide com a intenção da BR de deixar a distribuição de gás natural, vendendo sua participação na ES Gás, empresa de economia mista criada no Espírito Santo para assumir a concessão no estado. O governo, atualmente comandado por Renato Casagrande (PSB), também pretende reduzir a sua participação na ES Gás, tornando-se um sócio minoritário.
Cade quer informações sobre consórcio Gemini
O plano da Petrobras de liquidar toda a sua participação na BR Distribuidora não foi suficiente para eliminar questionamentos adicionais do Cade sobre a operação. A Petrobras (40%) é sócia da White Martins (60%) no consórcio Gemini, única empresa no país a atuar na distribuição de GNL, por meio da marca GásLocal, em São Paulo.
A operação é alvo de um processo no Cade que se estende há quase uma década.
O Cade solicitou explicações adicionais sobre a posição dominante da Petrobras no suprimento de gás natural, a ligação indireta com o Gemini e as relações comerciais entre a Golar e a Petrobras no fornecimento de GNL.
BR e Golar argumentam que a relação entre os negócios é distante, já que a White Martins é controladora do Gemini e a Golar Power será a operadora da Golar Distribuidora mesmo no caso de a BR exercer sua opção de compra de 50% do capital. E que não há ligação societária entre a Golar e a White Martins.
Além disso, a Golar afirma que, na verdade, quer entrar no mercado para competir com o Gemini.
“A Golar Distribuidora está sendo constituída para desenvolver um mercado ainda muito pouco explorado no Brasil, o que naturalmente exigirá do grupo Golar investimentos significativos para estruturar e viabilizar o modelo operacional projetado, assim como exigirá sua exposição aos riscos do negócio (…) A Golar Distribuidora é o veículo pelo qual o Grupo Golar poderá contribuir com toda a sua expertise na oferta de GNL para fazer frente à GásLocal, que ainda hoje é o único player na distribuição de GNL no Brasil”, afirma a empresa.
O consórcio Gemini foi alvo de uma intervenção do Cade motivada por denúncia da Comgás – negócio consiste na entrega de gás pela Petrobras, liquefação e distribuição do GNL incorporando a capilaridade da White Martins na operação.
A Comgás vê prejuízo porque o GNL da GásLocal compete na sua área de concessão – a base fica em Paulínea (SP) – ao mesmo tempo em que ela fica sujeita às condições comerciais praticadas pela própria Petrobras.
O caso se arrasta há anos e a Comgás fez uma série de reclamações sobre o descumprimento de decisões do Cade; o Gemini nega. A consultoria EY foi contratada para monitorar as práticas comerciais do consórcio e a atuação é acompanhada pelo Cade.
Reveja a entrevista com Rafael Grisolia, CEO da BR Distribuidora, e Eduardo Antonello, CEO da Golar Power na epbr gas week, e maio de 2020.
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Aposta na pequena escala para desenvolvimento de mercado
A parceria em negociação é reflexo da aposta da Golar — e agora da BR Distribuidora — na oferta de GNL em pequena escala no Brasil, uma modalidade que tem certos limites em termos de competitividade, mas é vista como uma opção para desenvolvimento de mercados não atendidos pela rede de transporte e distribuição de gás natural, e até mesmo concorrer com o gás canalizado.
As empresas descrevem o negócio como uma oportunidade de “desenvolvimento de uma nova solução de energia, mais econômica e menos poluente,
para clientes de pequena escala em todo o país”.
Em regra, as empresas calculam que os efeitos no mercado tem uma limitação geográfica – “o produto pode ser transportado até um raio de 1.000 km a partir da planta de liquefação ou do navio metaneiro, com perdas de até 15%”. E sem riscos de criar focos de concentração de mercado, porque o GNL concorre com outros combustíveis no segmento industrial e de transporte.
Pelo contrário, defendem que o GNL será uma alternativa ao suprimento de energia, até mesmo para frotas.
“O processo de armazenamento e transporte do gás na forma liquefeita envolve custos elevados, o que faz com que o GNL deixe de ser um substituto perfeito para o gás natural canalizado. (…) Apesar do alto investimento inicial para a construção da infraestrutura dutoviária, os custos marginais da distribuição do gás natural canalizado são inferiores aos custos para o estoque e transporte do gás liquefeito (…) Ainda que haja um período de transição, a experiência mostra que a oferta de gás natural canalizado em uma determinada região acaba por deslocar irreversivelmente a demanda por GNL”, afirmam.
Inspirado em um modelo europeu — os Corredores Azuis — a Golar mapeou diversas rotas potenciais de tráfego de veículos pesados em podem ser instalados postos para atendimento a essa frota com GNL.
Além da entrada do suprimento por terminais de regaseificação, o GNL pode chegar a outras regiões do país por meio de cabotagem, com containers especiais e bases de liquefação de menor porte nos portos. A Golar já desenvolve esse alternativa na região Nordeste, em estados como Maranhão e Pernambuco.