RIO — O cenário de redução das exportações da China para os Estados Unidos com as políticas econômicas do presidente Donald Trump criou um momento oportuno para o Brasil atrair investimentos chineses no mercado de energia, na visão do CEO e fundador da Rystad Energy, Jarand Rystad.
O executivo vê espaço para o Brasil receber investimentos em tecnologias chinesas em segmentos como veículos elétricos, equipamentos industriais, painéis solares e turbinas eólicas, por exemplo. Para isso, ele ressalta: é necessário manter a estabilidade nas regras setoriais.
“O Brasil e a China já têm um relacionamento excelente. E, com menos razões e incentivos econômicos para a China focar as exportações para os Estados Unidos, a capacidade disponível para atender ao Brasil vai ficar ainda maior”, disse Rystad em entrevista à agência eixos durante uma visita ao Rio de Janeiro para o Rio Energy Forum, evento organizado pela consultoria no começo de junho.
As oportunidades também se estendem à área de biocombustíveis, mercado no qual o Brasil historicamente colabora com os Estados Unidos, segundo a vice-presidente e chefe da área de Pesquisa em Novas Energias da Rystad nos EUA, Marina Domingues.
Para ela, os sinais que os EUA deram ao bloquear o acesso do etanol brasileiro a linhas de crédito no país alteraram essa dinâmica. “Isso faz o relacionamento entre o Brasil e os EUA se tornar um pouco menos estratégico, enquanto o Brasil tem uma relação mais forte e crescente com a China”, diz.
Rystad vê espaço para o país aproveitar a colaboração com os chineses para ampliar a frota de veículos elétricos. Na visão dele, isso pode incentivar o uso de biocombustíveis em outros segmentos além do transporte rodoviário, como navegação e aviação.
Negócios na COP30
Nesse sentido, o CEO da consultoria norueguesa acredita que o Brasil tem uma oportunidade, como anfitrião da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP), para incentivar investimentos em projetos de baixo carbono.
“Acredito que o Brasil pode ser muito pragmático para encontrar boas maneiras de criar regras que incentivem as empresas a investir de maneira proativa em tecnologias verdes”, diz.
Ele reconhece que o cenário internacional é desafiador, com os EUA recuando em políticas de incentivo à transição energética. Mas lembra que ainda assim o país vai continuar a bater recordes de investimentos em projetos de baixo carbono este ano.
“É verdade que o mundo está mais polarizado. De certa forma, talvez alguns países nem querem mais ter voz nesses temas. Mas, por outro lado, isso facilita a tomada de decisões progressistas pelos outros países”, aponta.
Barril mais baixo e custos mais altos
No mercado de petróleo, Rystad destaca que o atual cenário geopolítico criou mais incertezas para a economia global.
Ele lembra que a ampliação de tarifas, sobretudo pelos EUA, também está levando à expectativa de uma menor demanda mundial por petróleo, com um crescimento do consumo abaixo do esperado para este ano.
Esse contexto levou muitas empresas do setor a segurar investimentos, pelo menos por alguns meses. “Existe muita incerteza sobre os níveis de custos”, diz.
No entanto, o executivo acredita que é possível que a disrupção nas cadeias de fornecimento afetem mais os Estados Unidos do que outros países.
“Internacionalmente, ainda é incerto qual vai ser o impacto. É possível que as cadeias de fornecimento não sejam tão afetadas. Mas pode ser que isso ocorra, caso sejam aplicadas tarifas defensivas, que aumentem os custos”, afirma.
Nesse contexto, ele destaca que o Brasil está numa posição única no mercado internacional para ampliar a produção de óleo e gás.
“A maior parte dos países já entrou em declínio. Apenas Brasil, Guiana e poucos outros países ainda podem ver o crescimento da produção. O país precisa abraçar isso e entregar resultados”, ressalta.
Num contexto de empresas mais cautelosas com os investimentos, Rystad acredita que para atrair investimentos vai ser necessário manter regras estáveis e transparentes, incluindo em questões como impostos e exigências de conteúdo local.
“Os governos precisam ter clareza de que está mais difícil competir pela atenção das petroleiras”, afirma.
O vice-presidente sênior e diretor de Pesquisa para a América Latina, Daniel Leppert, lembra que a tendência é de continuidade da pressão de preços mais baixos para o petróleo ao longo dos próximos anos.
“Isso claramente cria mais incerteza na busca por oportunidades marítimas, nas quais os investimentos são de longo ciclo e levam muitos anos. Então é importante tentar minimizar as incertezas locais”, diz Leppert.
Novas fronteiras
No entanto, os especialistas não veem no atual cenário um impeditivo para a abertura de novas fronteiras no país, como a Margem Equatorial.
Eles acreditam que existe apetite das petroleiras por esses investimentos, já que têm ocorrido perfurações exploratórias em regiões como Guiana, Suriname e Namíbia.
O CEO da consultoria aponta, no entanto, que é necessário ter pressa, já que o tempo para o desenvolvimento de uma bacia chega a 20 anos e nas próximas duas décadas a demanda global por petróleo vai cair.
“Vai ser necessário ter bolsos grandes para buscar por essas novas oportunidades”, ressalta.