Biocombustíveis

RenovaBio: produtores de etanol dizem que política cumpre objetivos apesar de cenários adversos

Na segunda (21/11), distribuidoras levaram ao MDIC propostas de reforma no programa de descarbonização do mercado de combustíveis

RenovaBio: produtores de etanol dizem que política cumpre objetivos apesar de adversidades, após críticas das distribuidoras de combustíveis. Na imagem: Vista aérea das instalações e tanques de armazenamento em usina de etanol, principais emissores de CBIOs (Foto: Divulgação Celfenergia)
(Foto: Divulgação Celfenergia)

BRASÍLIA – Produtores de biocombustíveis saíram em defesa da Política Nacional de Biocombustíveis (RenovaBio) nesta semana, após críticas das distribuidoras ao funcionamento do programa.

Na visão de Unica, Bioenergia Brasil e Indústrias de Bioenergia de Mato Grosso (Bioind MT), as propostas de reforma no RenovaBio descaracterizam a política de descarbonização a favor de interesses “meramente comerciais” e ignoram fatores externos que impactaram o mercado nacional de combustíveis.

Desde que passou a valer no Brasil, em 2020, a obrigação para que as empresas compensem as emissões dos combustíveis fósseis que distribuem, o cenário macroeconômico atravessou diversas turbulências, com efeitos também sobre o funcionamento da nova política. [Veja linha do tempo ao final da matéria]

Os produtores listam pandemia de covid-19, quebra de safra de cana-de-açúcar por questões climáticas e intervenções federais no RenovaBio para rebater as críticas das distribuidoras.

E dizem que a política cumpre seus objetivos, apesar das adversidades políticas e econômicas.

Com cerca de 109 milhões de CBIOs emitidos, o programa evitou o lançamento desse mesmo volume de toneladas de CO2 à atmosfera entre 2020 e 2023, já que cada crédito equivale a uma tonelada de carbono evitada durante a produção de etanol, biodiesel ou biometano.

De acordo com a Bioind MT, a política também está alavancando investimentos na indústria, para melhorar sua eficiência energética e ambiental.

“As indústrias de bioenergia de Mato Grosso têm, ano a ano, feito volumosos investimentos tanto para rastreamento e mensuração das informações sobre sua matéria-prima, quanto para desenvolver e implantar soluções para reduzir suas emissões”, diz a associação que representa produtores de etanol de milho.

Terceiro maior produtor de etanol do Brasil e líder na produção do biocombustível de milho, o Mato Grosso deve contribuir, nesta safra, com a produção de 5,5 bilhões de litros do renovável.

“O programa é considerado pelo diretor geral da Agência Internacional de Energia [IEA] como a maior iniciativa de redução de emissões de gases de efeito estufa (GEE) na matriz de transportes do mundo”, defende a Unica (União da Indústria de Cana-de-Açúcar).

O que querem as distribuidoras

Na segunda (20/11), um grupo formado pelas maiores distribuidoras do país retomou oficialmente a agenda de mudanças do programa de descarbonização do setor de combustíveis, alegando que o RenovaBio falhou em elevar a oferta de biocombustíveis e representa um peso nos consumidores de gasolina e diesel.

A frente batizada de Movimento + Bio é formada por Vibra, Ipiranga, e Brasilcom, federação que representa mais de 40 empresas com atuação regional. E pretende transferir a obrigação de compra de créditos de descarbonização (CBIOs) para as refinarias, além de transformar o RenovaBio em um mercado regulado de carbono compatível com outros setores.

As propostas foram entregues a Uallace Moreira Lima, secretário de Desenvolvimento Industrial, Comércio, Serviços e Inovação.

Produtores rebatem

“O posicionamento das distribuidoras esquece que houve uma pandemia, com impactos inegáveis ao consumo. Em sequência, por conta de iniciativas eleitoreiras, o mercado nacional de combustíveis sofreu interferências de ordem tributária que ceifaram a competitividade do etanol frente à gasolina, fator determinante para forte redução da sua utilização.”, diz a nota da Bioenergia Brasil.

“É importante registrar que entre 2021 e 2022, o setor sofreu com o clima, secas e geadas, e nem assim houve risco de desabastecimento”, completa a coalizão formada por associações e sindicatos de produtores de etanol.

Para a Unica, a postura do grupo de distribuidoras tenta pressionar o governo para desfigurar o RenovaBio e beneficia apenas os combustíveis fósseis.

Em nota, a associação rebate a acusação das distribuidoras sobre escassez de CBIOs, afirmando que, no final de setembro, a oferta de créditos superou o volume necessário para cumprimento das metas anuais, com 6 milhões de títulos sendo aposentados acima da exigência, em antecipação às metas para março de 2024.

A Bioenergia Brasil alerta ainda que a transferência de obrigação para o refino concentraria a demanda por CBIOs na Petrobras.

“Na prática, as distribuidoras que subscrevem a matéria desejam transferir a parte obrigada do RenovaBio delas próprias para os produtores de combustíveis fósseis, o que na prática quer dizer jogar cerca de 80% da obrigação na mão de uma única empresa, a Petrobras”, diz o texto.

Nesta quarta (22/11) a Frente Parlamentar do Biodiesel (FPBio) se uniu ao coro em uma nota onde “solidariza com os produtores de etanol”.

A frente presidida pelo deputado federal Alceu Moreira (MDB/RS) avalia que há uma tentativa de desestabilizar a discussão proposta pela Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) na consulta pública que recebe sugestões de aperfeiçoamento do programa.

“Este é o caminho que o Brasil deve seguir. Consultar todos os setores interessados – inclusive os contrários – para, então, fortalecer, qualificar ainda mais, ampliar o alcance do RenovaBio e, assim, criar caminhos para descarbonizar a economia”, defende a FPBio em nota assinada também pelas associações da indústria Abiove, Aprobio e Ubrabio.

Pandemia, quebra de safra e intervenção bolsonarista

De acordo com a Unica, pelo menos quatro fatores impactam o mercado de etanol desde que o RenovaBio entrou em operação.

“Entre 2020 e meados de 2022, a pandemia de covid-19 reduziu consideravelmente o consumo de combustíveis, exigindo ajustes nas metas do RenovaBio”, lista.

Além disso, o setor sofreu prejuízos na produtividade agrícola por causa do clima atípico na safra 2021/2022, o que levou a uma redução na moagem de cana-de-açúcar em mais de 80 milhões de toneladas.

Outro fator que ajudou a reduzir o consumo de etanol foi a desoneração da gasolina, em março de 2022, como tentativa do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) de conter o aumento dos preços dos combustíveis. Com isso, o biocombustível perdeu sua competitividade em relação ao fóssil, e o consumidor escolheu usar mais gasolina.

Foi também em 2022 que um decreto editado por Bolsonaro deu mais prazo para as distribuidoras comprovarem o cumprimento das metas de aquisição de CBIOs, o que, na visão dos produtores, prejudicou a dinâmica do mercado.

A Unica argumenta que apesar do cenário atípico, o RenovaBio “manteve o seu funcionamento inalterado e tem permitido mudanças importantes no setor produtivo para a ampliação da eficiência ambiental dos biocombustíveis”.

Linha do tempo: