Internacional

Brasil tenta maior integração com Bolívia, alvo de tentativa de golpe contra Luis Arce

Militares amotinados invadem palácio presidencial, em novo capítulo da fragilidade política de principal parceiro brasileiro no mercado de gás natural 

26.06.2024 Luis Arce empossa novos comandantes militares após tentativa de golpe (reprodução Facebook)
26.06.2024 Luis Arce empossa novos comandantes militares após tentativa de golpe (reprodução Facebook)

BRASÍLIA – As chancelarias do Brasil e da Bolívia vem trabalhando há semanas em uma visita oficial do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao país, prevista para 9 de julho, como parte de um roteiro na América Latina.

A visita tem o objetivo de marcar o retorno de Lula ao país, presidido por Luis Arce, alvo de uma tentativa de golpe de estado nesta quarta (26/6), quando tropas amotinadas, lideradas pelo ex-comandante do Exército Nacional, Juan José Zúñiga, invadiram o palácio presidencial.

Na agenda, está uma tentativa de maior integração latinoamericana, que tem o mercado de gás natural e as ricas reservas minerais do país como tema central das discussões, que envolvem estatais e agentes privados brasileiros.

A Bolívia é o principal parceiro do Brasil no mercado de gás natural, único país integrado por meio de gasodutos. O Brasil importou 14 milhões de m³ por dia de gás boliviano em 2023, atendendo a um quarto da demanda nacional.

Não foi possível confirmar, até o momento, se a viagem está mantida. Lula convocou uma reunião de emergência e o governo brasileiro condenou “nos mais firmes termos a tentativa de golpe” na Bolívia.

Ao fim do dia, os militares golpistas deixaram a Plaza Murillo. E Zúñiga foi preso.

A nova crise ocorre em meio ao acirramento das crises internas, provocada pela nova tentativa de Evo Morales de afrontar a legislação do país e voltar ao poder, revivendo um movimento que levou a sua derrubada e exílio.

Ambos são do Movimiento al Socialismo (MAS), principal partido de esquerda do país. Em 2016, em uma afronta constitucional e após derrota em um plebiscito, Morales foi reeleger, sendo derrubado em 2019 por um movimento militar apoiado pela direita boliviana. Retornou ao país com a eleição de Luis Arce, em 2020.

Bolívia em crise afasta investimentos

O governo da Bolívia vem intermediando a aproximação da YPFB com agentes industriais no mercado brasileiro, no embalo dessa nova onda de interesse mútuo no desenvolvimento de negócios entre os países – o que incluiu a sonhada importação de gás natural barato de Vaca Muerta, na Argentina.

Para o país, o interesse brasileiro em Vaca Muerta é uma oportunidade de vender gás natural boliviano e não apenas remunerar a infraestrutura da YPFB pela passagem do energético argentino.

E fazer isso atraindo investimentos para exploração e industrialização do gás no país, o que inclui fertilizantes. Arce representa um movimento reformista, que busca alterar regras internas para voltar a receber investimentos na exploração de reservas de gás natural, potássio e lítio.

Hoje, a Bolívia tem um ambiente de negócios proibitivo, com baixo retorno para agentes privados e internacionais. O governo de Arce esperava pacificar o país a partir das eleições de 2025, e avançar com uma pauta reformista que inclui uma nova Lei de Hidrocarbonetos.

A Petrobras têm mantido contatos frequentes com a YPFB e o governo boliviano, reaproximação iniciada por Jean Paul Prates e agora sob o comando de Magda Chambriard.

Morales acirrou disputa com Arce

O ex-presidente boliviano, Evo Morales, intensificou a pressão sobre o governo de Luis Arce. O acirramento da tensão política que culminou na tentativa de golpe no país nesta quarta vem se agravando desde o início do ano, com levante de camponeses e apoiadores liderados por Morales.

Em janeiro, o movimento convocado pelo ex-presidente – que governou o país por 14 anos e foi derrubado do poder após vencer a eleição de 2019 – parou a principal estrada da Bolívia por 11 dias.

O trecho que liga a capital La Paz à cidade de Santa Cruz de la Sierra ficou obstruído, provocando um prejuízo estimado pelo governo Arce em US$ 600 bilhões.

Evo mira nas eleições presidenciais de 2025 e convocou seus apoiadores após ser desqualificado como candidato para o pleito, em dezembro de 2023. O Tribunal Constitucional Plurinacional (TCP) fixou em dois mandatos (contínuos ou não) o tempo máximo em que o presidente e o vice poderão ocupar o cargo.

Morales renunciou após ter sido eleito para um terceiro mandato e refugiou-se, por um ano, na Argentina, a fim de evitar um mandado de prisão após Jeanine Áñez assumir a presidência.

Em 2022, Áñez foi condenada a dez anos de prisão, acusada de golpe de estado contra o antecessor.

Ela própria condenou a tentativa de golpe.

“Repúdio total à mobilização dos militares na Plaza Murillo na tentativa de destruir a ordem constitucional”, publicou. “O MAS com Arce e Evo deve sair através da votação em 2025. Nós, bolivianos, defenderemos a democracia”.