BRASÍLIA – As chancelarias do Brasil e da Bolívia vem trabalhando há semanas em uma visita oficial do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao país, prevista para 9 de julho, como parte de um roteiro na América Latina.
A visita tem o objetivo de marcar o retorno de Lula ao país, presidido por Luis Arce, alvo de uma tentativa de golpe de estado nesta quarta (26/6), quando tropas amotinadas, lideradas pelo ex-comandante do Exército Nacional, Juan José Zúñiga, invadiram o palácio presidencial.
Na agenda, está uma tentativa de maior integração latinoamericana, que tem o mercado de gás natural e as ricas reservas minerais do país como tema central das discussões, que envolvem estatais e agentes privados brasileiros.
A Bolívia é o principal parceiro do Brasil no mercado de gás natural, único país integrado por meio de gasodutos. O Brasil importou 14 milhões de m³ por dia de gás boliviano em 2023, atendendo a um quarto da demanda nacional.
Não foi possível confirmar, até o momento, se a viagem está mantida. Lula convocou uma reunião de emergência e o governo brasileiro condenou “nos mais firmes termos a tentativa de golpe” na Bolívia.
Ao fim do dia, os militares golpistas deixaram a Plaza Murillo. E Zúñiga foi preso.
A nova crise ocorre em meio ao acirramento das crises internas, provocada pela nova tentativa de Evo Morales de afrontar a legislação do país e voltar ao poder, revivendo um movimento que levou a sua derrubada e exílio.
Ambos são do Movimiento al Socialismo (MAS), principal partido de esquerda do país. Em 2016, em uma afronta constitucional e após derrota em um plebiscito, Morales foi reeleger, sendo derrubado em 2019 por um movimento militar apoiado pela direita boliviana. Retornou ao país com a eleição de Luis Arce, em 2020.
Bolívia em crise afasta investimentos
O governo da Bolívia vem intermediando a aproximação da YPFB com agentes industriais no mercado brasileiro, no embalo dessa nova onda de interesse mútuo no desenvolvimento de negócios entre os países – o que incluiu a sonhada importação de gás natural barato de Vaca Muerta, na Argentina.
Para o país, o interesse brasileiro em Vaca Muerta é uma oportunidade de vender gás natural boliviano e não apenas remunerar a infraestrutura da YPFB pela passagem do energético argentino.
E fazer isso atraindo investimentos para exploração e industrialização do gás no país, o que inclui fertilizantes. Arce representa um movimento reformista, que busca alterar regras internas para voltar a receber investimentos na exploração de reservas de gás natural, potássio e lítio.
Hoje, a Bolívia tem um ambiente de negócios proibitivo, com baixo retorno para agentes privados e internacionais. O governo de Arce esperava pacificar o país a partir das eleições de 2025, e avançar com uma pauta reformista que inclui uma nova Lei de Hidrocarbonetos.
A Petrobras têm mantido contatos frequentes com a YPFB e o governo boliviano, reaproximação iniciada por Jean Paul Prates e agora sob o comando de Magda Chambriard.
Morales acirrou disputa com Arce
O ex-presidente boliviano, Evo Morales, intensificou a pressão sobre o governo de Luis Arce. O acirramento da tensão política que culminou na tentativa de golpe no país nesta quarta vem se agravando desde o início do ano, com levante de camponeses e apoiadores liderados por Morales.
Em janeiro, o movimento convocado pelo ex-presidente – que governou o país por 14 anos e foi derrubado do poder após vencer a eleição de 2019 – parou a principal estrada da Bolívia por 11 dias.
O trecho que liga a capital La Paz à cidade de Santa Cruz de la Sierra ficou obstruído, provocando um prejuízo estimado pelo governo Arce em US$ 600 bilhões.
Evo mira nas eleições presidenciais de 2025 e convocou seus apoiadores após ser desqualificado como candidato para o pleito, em dezembro de 2023. O Tribunal Constitucional Plurinacional (TCP) fixou em dois mandatos (contínuos ou não) o tempo máximo em que o presidente e o vice poderão ocupar o cargo.
Morales renunciou após ter sido eleito para um terceiro mandato e refugiou-se, por um ano, na Argentina, a fim de evitar um mandado de prisão após Jeanine Áñez assumir a presidência.
Em 2022, Áñez foi condenada a dez anos de prisão, acusada de golpe de estado contra o antecessor.
Ela própria condenou a tentativa de golpe.
“Repúdio total à mobilização dos militares na Plaza Murillo na tentativa de destruir a ordem constitucional”, publicou. “O MAS com Arce e Evo deve sair através da votação em 2025. Nós, bolivianos, defenderemos a democracia”.