Na redução da mistura obrigatória de biodiesel para 10% (B10), ao longo de todo o ano de 2022, o Ministério da Economia foi voto vencido: defendeu que o mandato fosse reduzido para 6%, com objetivo de conter o impacto da política de descarbonização nos preços finais do diesel.
A proposta inicial da equipe econômica de Paulo Guedes contou com o apoio do Ministério da Infraestrutura, de Tarcísio de Freitas.
A Casa Civil, órgão da Presidência da República, deixou claro que não aceitaria um percentual superior a 10%, o que acabou definido pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), em 29 de novembro.
A Infraestrutura “posicionou-se a favor da proposta de 6% do Ministério da Economia com, no máximo, um teor de 10%”, diz a ata da reunião.
O Ministério de Minas e Energia (MME) defendeu a retomada do teor de 13%, citando inclusive os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil na agenda climática.
“É importante enfatizar que a proposta aqui apresentada, a partir do Ministério da Economia, apoiada pela Casa Civil, permitirá, dada a atual conjuntura, conferir previsibilidade para o ano de 2022”, registrou o MME.
“Ao mesmo tempo, proteger em algum grau, a sociedade, dentro dos limites de atuação do governo federal, da exposição à volatilidade dos preços das commodities”, afirma a pasta de Bento Albuquerque, que preside o conselho.
A Agricultura foi favorável à retomada do mandato para 13% e 14%.
No fim, prevaleceu o B10. Segundo projeções da equipe econômica, a retomada para 13% e 14%, como previsto originalmente, elevaria os preços finais médios do diesel em 2,2% durante 2022, em relação à mistura de 10%.
Na comparação com o B6, o diesel com 13% a 14% de biodiesel ficaria entre 3,3% e 5% mais caro. Comparando B10 e B6, o aumento de custo é de 1,9% a 2,5%.
Pressão pelo B10 é antiga
A mistura de biodiesel vem sendo reduzida pontualmente desde 2020, em razão de choques no mercado de combustível durante esses dois anos de pandemia de covid-19. Isso ocorre também em outros países.
O B10 atende a um pleito de transportadoras e do mercado varejista de combustíveis.
Em julho, entidades do mercado de combustível lançaram uma nova campanha pela redução. Nota foi assinada por IBP e Brasilcom (distribuidoras), Abicom (importadores), Fecombustíveis (varejo), Anfavea (indústria automobilística), além da Confederação Nacional do Transporte (CNT) e atribui o pedido pela manutenção do B10 às incertezas técnicas em relação ao aumento da parcela de biodiesel nos motores a diesel.
A CNT chegou a propor que a mistura fosse zerada em resposta à inflação.
Robustas razões para o B6
A mistura de 6% é o piso previsto em lei e pode ser adotada por “justificado” interesse público.
Em análises internas na Economia, a consultoria jurídica concorda que há “robustas razões de fundamentação e justificativa da medida administrativa, sob a ótica econômica e técnica” para justificar a redução para 6%, “de modo a buscar conciliação com os demais objetivos de política pública”.
Assim, não haveria empecilhos para adotar o 6%, tão pouco para a proposta intermediária de 10%, que vai vigorar em 2022.
“Além dos efeitos sobre a competitividade da economia brasileira e o bem-estar do consumidor, o percentual obrigatório de mistura do biodiesel no diesel também apresenta efeitos concorrenciais negativos, contrários à política econômica do país”, argumenta a equipe econômica.
As análises foram produzidas na Secretaria de Advocacia da Concorrência e Competitividade (SEAE), do Ministério da Economia.
Os bastidores da decisão pelo B10 constam em documentos solicitados por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI) e foram confirmados pela epbr com fontes de ministérios que compõem o CNPE.
Diesel cada vez mais caro em ano eleitoral
Todas as análises, no fim das contas, demonstram que a tendência é de aumento nos preços das commodities.
O consumidor de diesel, combustível de maior demanda no país, sofre com a desvalorização do real e a inflação global, com pressão dos preços da soja, dos óleos vegetais e do petróleo.
A Petrobras, por exemplo, manteve os preços do diesel 100% fóssil ao realizar o corte recente na gasolina, que encerrou uma sequência de quase seis meses de alta.
Diferentes fontes do governo comentaram que discutir preços é um “debate perdido”. Há impactos, de fato, na frustração de expectativas do setor, que contou entre 2018 e 2019 com a progressão do mandato de 10% a 15%, em 2023.
O entendimento dentro do governo é que o cenário torna impossível negar que o biodiesel deixa o diesel mais caro. E há pressão do Planalto por medidas para baratear os combustíveis em 2022, quando Jair Bolsonaro tentará a reeleição, pelo PL.
No CNPE, a Infraestrutura alertou, inclusive, para as ameaças de greve dos caminhoneiros. “O setor se encontra muito pressionado por preços e (…) houve 16 tentativas de greve por parte dos caminhoneiros devido a isso”.
Até mesmo nas projeções do Ministério da Agricultura o resultado é uma crescente pressão dos preços do biodiesel, em linha com a Economia e estimativas do mercado internacional e doméstico.
A pasta alertou para os impactos da redução da mistura do biodiesel na oferta de farelo de soja para agropecuária, mas a conclusão é que não há desestruturação da cadeia de produção de carnes com 10% obrigatório de biodiesel.
Pelo modelo da Secretária de Competitividade, o preço do B10 deve sair de R$ 5,26 por litro em janeiro de 2022, para R$ 5,30 em dezembro, uma alta de 0,76%.
Negociações em curso para atendimento ao mercado a partir de janeiro já indicam que o óleo diesel pode atingir máximas históricas em 2022.
A partir do ano que vem, entra em vigor a comercialização direta entre produtores de biodiesel e distribuidoras, que marca os fins dos leilões regulados pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) e intermediados pela Petrobras.
Com colaboração de Larissa Fafá