BRASÍLIA – O secretário de Economia Verde, Descarbonização e Bioindústria do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), Rodrigo Rollemberg, está convicto que será possível aprovar o marco legal do mercado regulado de carbono ainda este ano.
O governo fechou um texto para apreciação do Congresso Nacional e o plano é chegar à conferência climática da ONU marcada para novembro nos Emirados Árabes, a COP28, com a lei aprovada.
Em entrevista à agência epbr, ele avalia que o ambiente político está “muito favorável” à aprovação do projeto que cria uma sistema cap-and-trade no Brasil, semelhante ao adotado pela União Europeia, por exemplo. Rollemberg também afirma que o marco legal é uma prioridade para o governo Lula (PT).
“São várias frentes parlamentares tratando desse tema da transição energética e tudo isso conflui com a aprovação do projeto”, comenta o secretário.
Rollemberg conta que o projeto está pronto, no momento sob análise jurídica dos dez ministérios envolvidos, e foi construído de forma conjunta com o setor produtivo.
“Eu acredito que até semana que vem conclui essa parte dos ministérios e deve ir para a Casa Civil”.
Além de ter apoio dentro do governo, do Congresso, e do setor que será obrigado a relatar e compensar suas emissões, o secretário também está otimista em relação ao agronegócio – que não entra no mercado regulado –, pela possibilidade de aumentar receitas comercializando créditos no mercado voluntário.
Uma retrospectiva sobre o mercado de carbono brasileiro
O setor empresarial, liderado pelo CEBDS, construiu uma proposta em 2020, no Projeto PMR Brasil (.pdf), estudo coordenado pelo extinto Ministério da Economia em parceria com o Banco Mundial sobre precificação de carbono.
A segunda fase do projeto, que seria a implementação – PMI (Partnership for Market Implementation) – foi rejeitada pela pasta sob o comando do ex-ministro Paulo Guedes, mas parte do trabalho foi aproveitada no PL 528/2021, apresentado pelo ex-deputado Marcelo Ramos (PSD/AM) em 2021.
Naquele ano, começou a promessa de que o Brasil teria um mercado de carbono regulado antes da COP. Era a COP26.
O PL, no entanto, não foi aprovado antes da conferência da ONU e acabou desconfigurado quando caiu na relatoria de Carla Zambelli (PSL/SP), na Comissão de Meio Ambiente.
O governo de Jair Bolsonaro também travou o avanço da proposta original apoiada pelo setor produtivo, e chegou a publicar um decreto em 2022 – sem diálogo com a indústria.
Como o decreto deixou várias questões em aberto, ganhou força no Senado Federal o PL 412/2022, que regulamenta o Mercado Brasileiro de Redução de Emissões (MBRE). A intenção era aprovar antes da COP27, o que também não aconteceu.
O PL 412/2022 é o projeto com as discussões mais avançadas hoje e o atual governo estuda a possibilidade de apresentar sua proposta via um substitutivo para o texto já em tramitação, ou em um PL novo.
A estratégia, diz Rollemberg, será definida pela Casa Civil e Secretaria de Relações Institucionais.
A seguir, os principais pontos da entrevista com o secretário de Economia Verde, Rodrigo Rollemberg:
Desde 2021, o Brasil tenta, sem sucesso, aprovar o marco legal do mercado regulado de carbono antes das COPs. O que está diferente agora para que isso aconteça de fato?
RR: Eu tenho convicção que nós vamos aprovar [antes da COP28] o projeto muito parecido com o que está sendo elaborado conjuntamente, que está passando por uma lapidação das consultorias jurídicas.
Primeiro, porque há uma percepção muito clara da importância disso. Hoje, a visão que o governo do presidente Lula tem em relação ao tema é completamente diferente do governo passado.
Segundo, porque ela é uma pauta basicamente econômica. E depois porque a gente fez uma construção conjunta com o setor produtivo, especialmente com CNI e CEBDS, as entidades representativas dos setores que são grandes emissores. Então o projeto está bem consensuado.
Além disso, tem a COP no final do ano e o Brasil vai precisar levar um portfólio de projetos aprovados, que são acenos importantes para o mercado internacional.
O ambiente político está muito favorável à aprovação do projeto. São várias frentes parlamentares tratando desse tema da transição energética e tudo isso conflui com a aprovação do PL.
A ideia é fazer um novo PL ou apresentar um substitutivo?
RR: Essa decisão quem vai tomar é a Casa Civil e a SRI (Secretaria de Relações Institucionais). O projeto está pronto, o governo pode apresentar um PL ou pode negociar com um dos relatores a incorporação das teses do governo em um substitutivo.
O que a proposta do governo traz de diferente em relação ao texto que está no Senado?
RR: Ele é muito mais detalhado. Primeiro, define o limite de emissões. A partir de 25 mil toneladas de CO2/ano as empresas passam a ser reguladas. Entre 10 mil e 25 mil toneladas de CO2/ano, as empresas são obrigadas a comunicar suas emissões.
A implantação será gradual e o mercado vai funcionar no modelo cap-and-trade, que é o modelo defendido pela indústria.
Nele, é definido um limite de emissão. Quem ficar abaixo do limite gera crédito, quem emitir mais vai ter que compensar. Uma parte terá que ser compensada no próprio mercado regulado, outra poderá ser compensada no voluntário.
Tem um limite de quanto pode ser compensado no voluntário?
RR: Esse percentual que poderá ser compensado no mercado voluntário será definido em uma regulamentação pela autoridade competente, mas se fala em torno de 20%. Essa autoridade também será definida no processo de regulamentação, se vai ser criada uma nova ou se vai ser algum órgão já existente. (…) é importante que [essa autoridade] seja técnica.
Como o governo pretende garantir a credibilidade desse mercado?
RR: Eu defendo que a gente desenvolva metodologias, métricas, monitoramento, relato e verificação reconhecidas internacionalmente, para que a gente não fique dependente de certificação de empresas estrangeiras que demoram e são caras. Com isso, podemos dinamizar o mercado de carbono no Brasil.
Está prevista alguma interação com o mercado internacional?
RR: Sim. Toda a legislação foi construída com essa preocupação. Até porque, no nosso entendimento, isso dá uma oportunidade muito grande para o Brasil atrair capital estrangeiro com a venda de créditos de carbono.
Está previsto algum tipo de interoperabilidade com o RenovaBio, a primeira política brasileira para obrigar um setor a compensar suas emissões com a compra de créditos?
RR: A princípio não. Estamos tratando como um mercado separado. Importante [dizer] que ali o mercado já está funcionando bem. Talvez as empresas petrolíferas, que no processo de produção emitem – e estão fora do RenovaBio – estas sim deverão ser reguladas.
E como fica o agro?
RR: Em todo lugar do mundo, o agro fica fora do mercado regulado. Como a implantação é gradual, eu acho que esse mercado vai acabar sendo uma grande alternativa para o agro, que pode ser um grande instrumento de compensação, com créditos de sistemas agroflorestais.
Tenho a impressão que o agro também será bastante convencido de que a proposta é muito boa para o setor.