Energia

A nova TFPG e a suposta pertinência com a atuação estatal

Sem a devida transparência, setor petrolífero tem ampla margem para judicialização sobre a constitucionalidade e legalidade da TFPG, avaliam Camila Cândido, Thianne Martins e Larissa Mantuan

A nova TFPG do Rio de Janeiro e a suposta pertinência com a atuação estatal. Na imagem: FPSO Cidade de Saquarema em produção no campo de Tupi, antigo Lula (Foto: Divulgação SBM Offshore)
FPSO Cidade de Saquarema em produção no campo de Tupi, antigo Lula (Foto: Divulgação SBM Offshore)

Em 21 de dezembro de 2023, em meio à agitação da criação e alteração das normas tributárias federal, estadual e municipal que ocorre em todo fim de ano, a indústria petrolífera do estado do Rio de Janeiro, mais uma vez, foi alvo de nova tentativa de tributação de suas atividades pela Taxa de Controle, Monitoramento e Fiscalização das Atividades de Exploração e Produção de Petróleo e Gás (TFPG), por meio da Lei nº 10.254/2023.

A nova taxa tem como fato gerador o exercício regular do poder de polícia estadual, em especial ambiental, sobre as atividades de exploração, produção, escoamento, transporte, refino, liquefação, regaseificação, carregamento, estocagem, acondicionamento, importação, exportação e processamento de petróleo ou gás natural, quando relacionadas às atividades de exploração e produção.

Além das atividades relacionadas ao descomissionamento e abandono de áreas de exploração, desenvolvimento e produção e aquelas relacionadas à preservação, conservação, recuperação, controle e desenvolvimento sustentável dos recursos naturais, entre os quais o solo e o subsolo.

A partir de abril de 2024, a TFPG será exigida, mensalmente, dos operadores de contratos de concessão, partilha ou cessão onerosa, autorizados a realizar a exploração e produção de petróleo e gás, no montante de 10.000 Unidades Fiscais de Referência – UFIR-RJ (R$ 4,5373 em 2024), por área sob contrato, nos termos da regulamentação a ser editada pelo Poder Executivo que, possivelmente, será divulgada em breve. 

Embora seja trivial que 10.000 UFIR-RJ correspondem a R$ 45.373,00, o mesmo não se pode afirmar a respeito da interpretação do trecho “por área sob contrato” previsto na Lei para fins de cálculo da TFPG, já que os esclarecimentos sobre o referido cálculo ficaram a cargo do Poder Executivo.

De todo modo, espera-se que a abrangência conceitual não extrapole aquela estabelecida nas normas da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), na qual a “área sob contrato” corresponde ao bloco ou campo objeto de um contrato de concessão, contrato de cessão onerosa ou contrato de partilha de produção.

Em todo caso, pelo texto legal é possível inferir que a TFPG será mensalmente exigida dos contribuintes  ao valor de R$ 45.373,00 por cada área sob contrato. Nesse cenário, surgem dúvidas acerca da pertinência entre a nova Taxa e o custo efetivo da atuação do poder de polícia estatal. 

Adotando-se como premissa que a TFPG custeará o poder de polícia exercido pelo Instituto Estadual do Ambiente (Inea) no Rio de Janeiro e considerando os dados da atual Proposta de Lei Orçamentária Anual estadual de 2024, na hipótese de 12 meses de cobrança sobre cerca de 40 áreas sob contrato, o total arrecadado com a referida Taxa corresponderia a quase 60% do orçamento autorizado para o Controle Ambiental do Inea sobre as atividades de todos os setores que fiscaliza no Estado.

Nesse exemplo, a fatia exigida do setor petrolífero para custear o poder de polícia exercido pelo Inea representaria inegável desproporcionalidade sobre o escopo total de atuação daquele Instituto no controle ambiental no âmbito do estado do Rio de Janeiro, sendo capaz de cobrir, inclusive, os custos da mesma natureza com as atividades dos demais setores fiscalizados.

Isso porque, para além da indústria do petróleo e gás natural, o Inea é responsável pela fiscalização de diversos outros setores, tais como aqueles relacionados à extração mineral, agricultura e extração de vegetais e silvicultura, pecuária e criação de outros animais, produtos de minerais não metálicos, siderúrgica e metalúrgica, mecânica, material elétrico e de comunicações, material de transporte, madeira, mobiliário, papel e papelão, borracha, couros, peles e produtos similares, química, produtos farmacêuticos e veterinários, têxtil, matérias plásticas, construção civil, álcool e açúcar, entre outros.

Diante da obscuridade quanto à pertinência da cobrança da TFPG e o custo real da atuação do poder de polícia estatal sobre as atividades que serão por ela tributadas, bem como a consequente desconfiança que tal cenário poderá suscitar nos contribuintes, é indispensável que o Estado do Rio de Janeiro demonstre com dados objetivos sua referibilidade.

Sem a devida transparência, novamente, percebe-se uma ampla margem para judicialização e questionamento sobre a constitucionalidade e legalidade da TFPG pelo setor petrolífero que, para além do alto risco e custo de investimentos sobre suas atividades, tem pela frente um cenário tributário ainda incerto, decorrente da publicação da Emenda Constitucional n° 132/2023

Este artigo expressa exclusivamente a posição das autoras e não necessariamente da instituição para a qual trabalham ou estão vinculadas.

Camila Cândido Bispo, advogada do Toledo Marchetti Advogados (Foto: Divulgação)
Camila Cândido
Larissa Peterle Mantuan é advogada do Toledo Marchetti Advogados, com atuação em direito tributário, pós-graduanda em Tributação e Negócios pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e bacharel em Direito pela Universidade Federal do Espírito Santo – UFES (Foto: Divulgação)
Larissa Mantuan
Thianne de Azevedo Silva Martins é advogada do Toledo Marchetti Advogados, com atuação nas áreas tributária e aduaneira pós-graduada em Direito e Processo Tributário pela Fundação Escola Superior do Ministério Público; Bacharela em Direito pela Universidade Candido Mendes.
Thianne Martins

Camila Cândido Bispo é advogada do Toledo Marchetti Advogados, com atuação em direito tributário, pós-graduanda em Gestão Tributária pela Universidade de São Paulo/Esalq e em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Bacharel em Direito pela Universidade São Judas Tadeu.

Larissa Peterle Mantuan é advogada do Toledo Marchetti Advogados, com atuação em direito tributário, pós-graduanda em Tributação e Negócios pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e bacharel em Direito pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES).

Thianne de Azevedo Silva Martins é advogada do Toledo Marchetti Advogados, com atuação nas áreas tributária e aduaneira pós-graduada em Direito e Processo Tributário pela Fundação Escola Superior do Ministério Público; Bacharela em Direito pela Universidade Candido Mendes.