RIO – A Pré-Sal Petróleo S.A. (PPSA) pode assumir, por meio de leilões do gás natural que cabe à União nos contratos de partilha, um papel estratégico na convergência entre a oferta e a demanda nos próximos anos e, assim, estimular novos investimentos em infraestrutura de gás, de acordo com especialistas do setor.
A diretora de gás natural do Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP), Sylvie D’Apote, destaca que o mercado brasileiro passará até o fim da década por um choque de oferta e que os produtores precisam de uma perspectiva de demanda para investir em novos projetos. Segundo ela, isso passa por políticas públicas que ajudem a casar os dois lados.
Esse encontro entre oferta e demanda não é simples, mas a PPSA poderia ajudar a construí-lo, na avaliação do CEO da Gas Energy, Rivaldo Moreira Neto.
O consultor defende que o gás da União poderia ancorar leilões de venda de gás no longo prazo para testar efetivamente o apetite do mercado.
“A PPSA pode ser um ponto de partida para isso”, afirmou Moreira Neto, ao participar nesta quarta (22/11) do painel “Caminhos para o mercado de gás”, no 6º Fórum Técnico da PPSA, no Rio de Janeiro.
Ele defende que os leilões poderiam, eventualmente, priorizar segmentos que consigam descarbonizar suas operações por meio do aumento do consumo de gás.
“Ou que [o governo] escolha segmentos específicos, é legítimo qualquer governo decidir”, complementou.
Leilões ajudam a reduzir incertezas
O professor do Instituto de Energia da PUC, Edmar de Almeida, acredita que leilões são instrumentos importantes para ajudar a reduzir o grau de incertezas com que a indústria de gás lida na decisão de investimentos. Ele relembra o caso do setor elétrico.
“Hoje não precisa mais [de leilões de longo prazo], devido a um outro contexto de mercado, mas naquela época [2004, pós-racionamento] foi fundamental”, disse.
Almeida cita o modelo alemão adotado para desenvolvimento do mercado de hidrogênio verde, por meio de leilões casados de oferta e de demanda – segundo o qual os fornecedores do gás apresentam os preços de venda do produto e, ao mesmo tempo, as indústrias apresentam o preço que estão dispostas a pagar.
“Aí se houver um match [convergência] automático, ótimo. Se não tiver, saberemos exatamente qual o subsídio, apoio, incentivo necessário para fazer esse casamento e se é possível, de fato, descarbonizar o carvão [na siderurgia] e deixar de se consumir coque de petróleo na indústria de cimento”, comentou.
Para ele, o principal papel da PPSA no desenvolvimento do mercado, contudo, não está na venda do gás natural da União, mas sim no uso de sua expertise técnica nas discussões de governo sobre políticas públicas.
“O papel da PPSA é ajudar o governo, as instituições do Estado brasileiro a construir um alinhamento das expectativas dos agentes da cadeia, uma visão de futuro. Sem reduzir o grau de incerteza vai ser muito difícil investir. A PPSA tem um papel privilegiado nisso, porque ela tem muitas informações que muitos agentes do Estado não têm. Ela está lá conversando com as empresas, sabe as dificuldades técnicas de se produzir gás, de escoar, sobre o porquê se faz a reinjeção…”, completou.
Mercado à espera do Gás para Empregar
O diretor do Departamento de Gás Natural do Ministério de Minas e Energia, Marcello Weydt, afirmou que o governo tem apostado no diálogo com os agentes do mercado, na estruturação do Gás para Empregar.
Segundo ele, um primeiro relatório dos grupo de trabalho do programa deve ficar pronto em março de 2024.
“O timing da decisão política é muito importante”, comentou Moreira Neto.
Segundo o consultor, o setor industrial vive um momento de definições sobre o futuro de seus planos de descarbonização e a falta de clareza sobre para aonde vai a política do gás já tem resultado na migração de clientes industriais para energias alternativas, como a biomassa.
A previsão da PPSA é que a produção de gás natural dos contratos de partilha totalize cerca de 3,3 milhões de m3/dia em 2024 – dos quais cerca de 200 mil m3/dia cabem à União.
Esses volumes são crescentes: a previsão é que, no pico, a parcela de gás da União atinja os 3,5 milhões de m3/dia em 2029. A previsão da PPSA é que, nos próximos dez anos, a receita gerada pela comercialização do gás da União totalize R$ 4 bilhões.
Confira a cobertura da epbr no 6º Fórum Técnico da PPSA