Em um relatório de cinquenta páginas, o ministro do Tribunal de Constas da União (TCU), Aroldo Cedraz, justifica porque decidiu aceitar a medida cautelar solicitada pela Secretaria de Fiscalização de Infraestrutura de Petróleo, Gás Natural e Mineração (SeinfraPetróleo) e retirar os blocos S-M-645 e S-M-534 da 15ª rodada da ANP.
De acordo com os técnicos do tribunal de contas, ofertar os prospectos de Saturno, Titã e Dione, no pré-sal da Bacia de Santos em regimes regulatórios distintos, concessão e partilha, e em dois leilões poderia provocar um prejuízo de R$ 2,37 bilhões para a União, além de desrespeitar boas práticas da indústria, por gerar uma iminente unitização.
Além de decidir pela retirada dos blocos, o TCU também determina uma série de aprimoramento nos procedimentos de delimitação dos leilões. Veja abaixo as considerações feitas pela SeinfraPetróleo quanto à tramitação das ações que levaram ao formato da 15ª rodada e da 4ª rodada de partilha:
Qual a lógica das perdas de R$ 2,37 bilhões?
Os técnicos do TCU não cravaram, exatamente, que o país perderia R$ 2,37 bilhões caso o formato dos leilões fosse mantido.
A questão é que, para a SeinfraPetróleo, os dados disponíveis e os estudos apresentados continham esse risco de perda dos R$ 2,37 bilhões, enquanto a visão da ANP e do MME, sobre a mitigação de tal risco, leva em conta aspectos incertos, como o efeito que a concorrência e a qualidade dos prospectos de Saturno, Titã e Dione teriam nos leilões, em termos de melhoria das ofertas, tanto de bônus (concessão) quanto de participação no excedente de óleo (partilha).
O TCU considerou, de acordo com o relatório, os próprios critérios usados pela ANP para simular o retorno para os cofres públicos. As premissas da simulação do tribunal foram o fluxo de caixa descontado com a mesma metodologia adotada pela ANP, e carga fiscal (o government take) equivalente a 75% do valor presente líquido dos projetos (VPL).
Isto é, para atingir os 75% de carga fiscal do VPL no cenário que foi desenhado pela ANP e aprovado pelo CNPE (oferta de parte dos prospectos em partilha e parte em concessão), o TCU calculou que seria necessário o pagamento de R$ 7,377 bilhões em bônus de assinatura, mais as participações governamentais da concessão.
Ao mesmo tempo, na simulação em que é levada em conta a oferta de todos os prospectos pelo regime de partilha, o método chega a um bônus de R$ 6,250 bilhões para atingir os 75% de carga fiscal, neste caso com uma alíquota de partilha de 15,42%.
Como a soma dos bônus mínimos dos blocos S-M-534 (parte de Titã) e S-M-645 (parte de Saturno) era de R$ 3,55 bilhões na 15ª rodada e, o bloco Saturno, na 4ª rodada de partilha, tem um bônus fixo de R$ 1,45 bilhão, o TCU chega a conclusão que a contratação das áreas garante uma arrecadação com bônus de R$ 5 bilhões, ou seja, um déficit de R$ 2,37 bilhões para alcançar os R$ 7,377 bilhões, necessário para a carga fiscal de 75%.
“(…) os riscos assumidos pelo CNPE, pelo MME e pela ANP que foram transferidos para o mercado definir o quanto deve recompor equivalem a uma diferença desfavorável para a União de R$ 2,37 bilhões”, afirma o relatório assinado pelo ministro Aroldo Cedraz.
E o que dizem MME e ANP?
O ministério colocou que a estratégia de dividir os prospectos em três blocos aumenta a competição pelas áreas, porque empresas de diferentes portes podem disputar e se associar com outras para participar da licitação. Diz também que a fragmentação reduz o risco de uma licitação sem nenhuma oferta.
Em seu posicionamento, o MME defende que o regime de concessão é mais atrativo: a alíquota de royalties é de 10%, frente 15% na partilha, e a gestão do projeto é menos complexa.
“Entende-se que a oferta dos blocos S-M-534 e S-M-645 sob regime de concessão (…) está alinhada com a atual política de E&P, permitindo viabilizar uma maior pluralidade de operadores e o induzindo ao fortalecimento da atividade exploratória no País”, afirma o MME.
Procurada ontem (29/3), a ANP optou por não comentar a decisão do TCU e reafirmou a expectativa de um leilão de sucesso.
“A retirada dos blocos S-M-534 e S-M-645 pelo TCU não afeta significativamente a atratividade da 15ª rodada (…) Os 68 blocos que serão ofertados estão entre os mais promissores já selecionados pela ANP para uma rodada. A previsão de arrecadação de aproximadamente R$ 3,5 bilhões para a 15ª rodada e para a 4ª rodada do pré-sal está mantida”, afirmou a agência, em nota.
Decisão do TCU coloca fim do polígono do pré-sal em pauta
Divergência quanto a unitização
Outro ponto muito explorado no relatório do TCU trata da unitização futura desses ativos caso sejam contratados separadamente. Para o tribunal, isso é uma falha regulatória que pode “passar uma imagem negativa do país” e que vai na contramão das “melhores práticas da indústria de petróleo”. O TCU avalia, inclusive, que isso desvaloriza as áreas nos leilões.
A ANP, por sua vez, defende que unitização não é um problema e “pelo contrário, uma maior subdivisão de áreas propiciaria um maior competividade e atratividade”. Diz também que definir blocos para minimizar risco de unitização não é prática da indústria.
O MME completa que sempre haverá o risco de unitização, tendo em vista que a delimitação dos prospectos para os leilões leva em conta um conhecimento geológico limitado e apenas após a delimitação dos campos é possível bater o martelo quanto a extensão dos reservatórios.
Unitização assusta, por Armando Cavanha
Lembrando que os blocos S-M-534, S-M-645 e os bloco Saturno englobam diferentes prospecto (ver mapa no fim da matéria). O prospecto de Saturno é o maior deles e a estimativa é que a maior parte do reservatório esteja na área do S-M-654, com um excedente no polígono do pré-sal.
A segunda maior área seria de Titã, também com a maior parte fora do polígono, no bloco S-M-534, e uma extensão na área de partilha.
Assim o bloco delimitado para 4ª rodada de partilha, também chamado de Saturno, tem as extensões de Saturno e Titã, além do prospecto de Dione. Juntos, os três têm um volume de óleo in place, não riscado, de 12,26 bilhões de barris.