Diálogos da Transição

Onde está o Brasil na rota da eletrificação?

Pesquisa encomendada pelo iCS mostra que setor empresarial avança na eletrificação da frota, mesmo considerando insuficiente a política de incentivos

Eletrificação no Brasil: Na imagem, Projeto Linha Verde, com pontos de recarga também nas bases operacionais, iniciado pela Neoenergia em 2021 (Foto: Neoenergia/Divulgação)
Projeto Linha Verde, com pontos de recarga nas bases operacionais, iniciado pela Neoenergia em 2021 (Foto: Divulgação/Neoenergia)

newsletter

Diálogos da Transição

APRESENTADA POR

Editada por Nayara Machado
[email protected]

Pesquisa realizada pelo Cebds (Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável), encomendada pelo iCS (Instituto Clima e Sociedade), mostra que há um movimento do setor empresarial em direção à eletrificação da frota, mesmo considerando insuficiente a política de incentivos.

O estudo ouviu 16 grandes empresas com atuação no Brasil, parte delas com compromisso de zerar suas emissões de CO2 até 2030 e que já tem veículos elétricos na frota.

Embora vejam uma vantagem comparativa dos preços de operação dos carros elétricos, já que os custos de combustíveis podem sofrer alta variação — como estamos assistindo agora — há ainda uma série de questões impedindo que a tecnologia ganhe escala.

Entre elas: melhor infraestrutura de carregamento, sistemas e tecnologias que facilitem a gestão de dados; estabelecimento e fomento a redes de colaboração entre todos os setores envolvidos, desde a geração de energia até as fabricantes de veículos.

O levantamento entrevistou:

  • Varejo: Grupo Carrefour
  • Mineração: Anglo American e CBA
  • Energia: Neoenergia e Schneider Electric
  • Tecnologia: Grupo Sabará e Amazon
  • Infraestrutura: Ecorodovias
  • Serviços: Sesc
  • Telecomunicações: Telefônica
  • Bebidas: Ambev
  • Beleza: Natura
  • Saúde: Intermédica
  • Petroquímica: Braskem
  • Florestas: Suzano
  • Papel e embalagens: WestRock

São empresas que estão apostando na descarbonização de frotas como ferramenta relevante na agenda de neutralidade climática.

A Neoenergia, por exemplo, desenvolveu um caminhão elétrico para uso nas atividades de serviços de distribuição de energia elétrica.

O novo veículo é o primeiro no país a contar com sistema que permite o carregamento diretamente na rede elétrica — permitindo recargas durante o trajeto, sem precisar voltar para a base.

“A eletrificação da frota é uma das etapas principais para que a Neoenergia alcance a meta de reduzir em até 50% a intensidade de emissões de carbono até 2030. Hoje, os modelos híbridos e elétricos já são realidade na frota da companhia”, comenta William Nascimento, superintendente de Serviços Gerais.

Parte dos investimentos tenta superar o gargalo de infraestrutura.

Internamente, a companhia iniciou, em março de 2020, a substituição da frota de veículos leves por modelos híbridos e elétricos. Hoje, há 90 veículos híbridos e 63 totalmente elétricos.

Também instalou eletropostos nas suas sedes administrativas e iniciou em 2021 o projeto Linha Verde, para a instalação de pontos de recarga também nas bases operacionais.

PUBLICIDADE

Logo PotencializEE

Ausência de um marco legal e de harmonia entre as políticas existentes é um dos fatores que deixa o Brasil atrás de outras economias quando o assunto é eletrificação.

Embora as vendas de veículos eletrificados leves no Brasil tenham crescido 115% no primeiro trimestre de 2022, chegando a 9.844 unidades, a participação de mercado é pequena. Apenas 2,6% no primeiro trimestre.

Considerando somente os veículos elétricos plug-in, esse percentual cai para 0,8%.

A título de comparação, na Europa, as vendas de elétricos plug-in chegaram a 19% do mercado em 2021. Na China, a 15%. Nos Estados Unidos, a 4%.

Aqui, a eletrificação deve passar pelos biocombustíveis, com híbridos e veículos com célula a etanol e a hidrogênio.

Em 2021, a Toyota, cujo híbrido é líder no mercado brasileiro de elétricos, vendeu 56,6% dos veículos eletrificados no país. E lançou esta semana o piloto de um carro movido a célula de combustível a hidrogênio.

A empresa aguarda políticas públicas que possam viabilizar o lançamento de veículos 100% elétricos e a célula a hidrogênio, que já rodam em outros países, conta Rafael Chang, CEO da montadora no Brasil, em entrevista ao jornalista Gabriel Chiappini.

“Esse processo tem que ser planejado, para ter uma transição ordenada”, afirma.

Uma preocupação do executivo é que esse processo ocorra sem o tempo adequado, a exemplo de uma regulação que exija a redução da frota doméstica a combustão.

Entre as políticas defendidas pela companhia no Brasil, está a harmonização entre diferentes mecanismos regulatórios que visam a redução das emissões no setor automotivo e de combustíveis.

Atualmente, programas como o Renovabio, o Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos Automotores — Proconve — e o Rota 2030 estipulam diferentes metodologias e aplicações para mensurar a pegada de carbono e outros gases poluentes.

Um grupo de trabalho do governo, coordenado pelos Ministérios da Economia (ME) e de Minas e Energia (MME), discute propostas e alternativas para criar uma metodologia para Eficiência Energética Ambiental dentro do programa Combustível do Futuro. A proposta está prevista para sair no final de junho.

No Congresso, dois projetos de lei propõem incentivos.

Um deles é o PL 6.020/2019 da senadora Leila Barros (PDT/DF), que determina que as empresas beneficiadas por renúncias fiscais no programa Rota 2030 deverão aplicar 1,5% do benefício tributário em pesquisas sobre o desenvolvimento da tecnologia para veículos elétricos.

Também condiciona investimentos na geração de energia elétrica no interior de veículos a partir do etanol.

Aprovado na Comissão de Ciência e Tecnologia do Senado, ele aguarda agora análise da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE).

Outro é o PL 403/2022, do senador Irajá (PSD/TO), também na CAE, que isenta veículos elétricos e híbridos do Imposto de Importação até 31 de dezembro de 2025.

A proposta tenta estender os incentivos de uma resolução de setembro de 2020, do Comitê-Executivo de Gestão (Gecex), que zerou a alíquota de 35% para a maioria dos casos de importação de veículos elétricos ou híbridos, e reduziu a 2% ou 4% em algumas situações.

Cobrimos por aqui:

Eventos extremos cada vez mais extremos

No Brasil, mais de 25% das mortes por chuvas nos últimos nove anos ocorreram em 2022, de acordo com um levantamento da Confederação Nacional dos Municípios (CNM).

A CNM mostra que, no período de 1º de janeiro de 2013 a 31 de maio de 2022, 1.756 óbitos foram contabilizados, sendo 457 apenas neste ano. A lista não notificou todas as mortes ocorridas em Pernambuco, que chegaram a 128 até esta sexta-feira (3/5).

Antes de 2022, o ano mais letal por chuvas no país era 2019, com 297 mortes registradas, seguido por 2021 quando foram notificados 290 óbitos e 2020, com 216, de acordo com o Sistema Integrado de Informações Sobre Desastres do Ministério do Desenvolvimento Regional (S2ID/MDR).

Essa foi a pior tragédia em Pernambuco desde a enchente que tomou conta do estado em 1975, onde 104 pessoas perderam a vida.

Petrobras testa coprocessamento no QAV

A Petrobras anunciou hoje (3/6) a conclusão do primeiro teste de produção de querosene de aviação com conteúdo renovável do país.

Segundo a companhia, o produto integra a nova geração de combustíveis sustentáveis do portfólio, e consiste no coprocessamento (processamento conjunto) de querosene de origem fóssil e óleo vegetal, utilizando unidades de refino existentes. 

O teste aconteceu na Refinaria Presidente Getúlio Vargas (Repar), no Paraná, e usou óleo de soja.

Parte do Programa BioRefino da Petrobras, o produto segue o mesmo processo do Diesel R5, que conta com cerca de 4% a 5% de conteúdo renovável — A saga do novo diesel da Petrobras. Até o fechamento desta edição, a Petrobras não havia informado a parcela de conteúdo renovável nem a quantidade de emissões que poderiam ser evitadas com o novo QAV.

Artigos da semana

A transição energética justa no Brasil: a transição precisa ser indutora não apenas da mudança da matriz energética na direção de uma economia de baixo carbono, mas de uma economia mais inclusiva e justa, escrevem Emílio Matsumura e Nathalia Paes Leme, do Instituto E+.

A cautelar da discórdia que impacta o bolso de milhões: medida cautelar da Aneel abre oportunidade para reflexão sobre o processo do regulador em suas decisões, escreve Fernando Teixerense, diretor de Relações Institucionais da Abrace.

Dirija hoje, pague amanhã: propostas para subvenção de combustíveis, em tempos de crise, por Marcos Cintra, Aurélio Amaral e Juliana Melcop.