RIO — Depois da tentativa frustrada do governo, de reduzir a tributação estadual sobre o diesel e estabelecer uma alíquota nacional ad rem, por meio do PLP 11 (Lei complementar nº 192/2022), o Brasil deveria repensar o modelo tributário do mercado de combustíveis e implementar o mecanismo de cobrança ad valorem, mas sem substituição tributária. Esta é a proposta do Departamento de Estudos Econômicos (DEE) do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).
Entenda a sopa de letrinhas:
- ad rem: valor fixo sobre determinada quantidade (EXE: R$/litro)
- ad valorem: percentual sobre o valor (EXE: % sobre preço final)
O Cade propõe a incidência de um percentual sobre a receita obtida com a venda dos derivados, sem substituição tributária, no último elo da cadeia.
As sugestões estão presentes no Cadernos do Cade: Mercados de distribuição e de varejo de combustíveis líquidos (na íntegra, em .pdf), publicado nesta quarta-feira (11/5). O órgão antitruste apresentou um conjunto de ideias que podem ajudar a reduzir os preços dos combustíveis no mercado brasileiro.
Relembre: O PLP 11, sancionado em março, foi uma tentativa de o governo federal, com apoio da base, forçar a criação da alíquota única nacional de ICMS que não varia com as oscilações dos preços na bomba. Os estados, contudo, driblaram a desoneração, acatando parte da reforma, mas não a redução da carga. Após o Congresso aprovar a desoneração do ICMS do diesel S10 e S500, os estados, por meio do Confaz, definiram uma alíquota que praticamente preservou a arrecadação e a carga tributária sobre o combustível.
O estudo retoma algumas ideias já propostas pelo órgão antitruste no passado e inclui não só o aspecto tributário, como outras medidas que visam a aumentar a concorrência e competitividade no setor — dentre as quais iniciativas já implementadas, como a venda direta de etanol, e outras ainda pendentes, como a permissão de postos autosserviços.
“Obviamente que há questões atinentes à segurança deste tipo de sistema [postos autosserviços] que cabem ser feitas por especialistas do setor. No entanto, no que tange a aspectos de caráter econômico, o Cade entende que este sistema tende a reduzir custos com encargos trabalhistas com consequente redução do preço final ao consumidor e dotar o consumidor de maior poder de escolha entre abastecer pessoalmente seu próprio carro ou escolher um posto com serviços de frentistas. Ou seja, a existência de uma forma mais eficiente do ponto de vista econômico e com menor custo ao consumidor de prestação de serviços não pode ser barrada apenas porque desagrada alguns setores específicos da sociedade, em detrimento do bem-estar geral da sociedade”, cita o estudo do DEE/Cade.
Lei traz melhorias, mas não é a ideal
No aspecto tributário, o DEE/Cade é enfático ao defender a extinção do modelo de substituição tributária do ICMS.
O Cade alega que o Preço Médio Ponderado a Consumidor Final (PMPF) para cálculo do ICMS devido por substituição tributária tem, como efeito, o aumento do preço dos produtos. O estudo argumenta que:
- Com a tabela de preços, o agente econômico tende a seguir o valor sugerido pelo próprio governo, desincentivando-se preços mais baixos;
- O tabelamento induz uma coordenação entre agentes, o que é funcionalmente análogo à cartelização, sem os custos da realização de um ilícito (combinação expressa);
- O PMPF pune o agente que quer um preço mais baixo que o “sugerido” como base de cálculo tributário. Isso porque, se o agente precificar abaixo do preço tabelado, terá de entrar com uma ação judicial solicitando a devolução do ICMS pago a mais.
“Para um ambiente concorrencial sadio, decisões de precificação não devem ser induzidas desta forma, motivo pelo qual o PMPF deve ser repensado e, preferencialmente, extinto”, conclui o DEE.
O estudo destaca que a Lei Complementar nº 192/2022 tende a resolver parte dos problemas apontados, por instituir uma cobrança monofásica, ad rem (valor fixo por unidade vendida), na produção ou importação dos combustíveis. Não haveria, assim, mais cobrança com base no PMPF.
No entanto, o Cade considera que, embora traga melhorias, o modelo aprovado pelo Congresso este ano não é o ideal. O órgão defende o modelo ad valorem.
E alega que tributos como o PIS/Cofins e a Cide, na forma de um valor fixo por litro, resultam em distorções, “já que alguém que vende o litro da gasolina mais barato paga percentualmente mais imposto do que outro agente que vende combustível caro”.
“Deste modo, cabe ao Estado brasileiro repensar a referida forma de cobrança, se este seria ou não o melhor sistema a ser adotado. Por enquanto, por questões pragmáticas tendentes à facilitação do trabalho de monitoramento de ilícitos fiscais, preferiu-se essa simplificação. No entanto, talvez, no futuro, possa se ter um sistema justo, que incentive preços mais baixos, cobrando-se um percentual e não um valor fixo por mercado vendida, caso, talvez, se equacione os custos de monitoramento de práticas ilícitas”, cita o estudo do DEE/Cade.