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BRASÍLIA e Rio – Em sessão extraordinária nesta sexta (10), a Aneel aprovou por unanimidade uma arbitragem inédita entre a União e a Transnorte Energia (TNE) para chegar a um acordo sobre a linha de transmissão (LT) projetada para interligar Roraima ao Sistema Interligado Nacional (SIN).
Com mais de dez anos de atraso, o último trecho do Linhão de Tucuruí foi contratado para conectar as capitais de Manaus (AM) e Boa Vista (RR). A TNE é uma sociedade entre a estatal Eletronorte e a Alupar.
O que está em discussão é o valor da receita anual que a concessionária vai receber pela linha de transmissão, questão que já foi judicializada com derrota para a União, condenada a rescindir o contrato e ressarcir a TNE em R$ 540 milhões.
A arbitragem suspende discussões administrativas e na Justiça.
O melhor cenário é o de início das obras em 2022, em cerca de 7 meses. Povos indígenas já sinalizaram que não vão vetar a construção da linha e, segundo previsão do MME, a entrada em operação é possível em 36 meses.
Com o atraso no licenciamento, as empresas tentaram revisar o valor do contrato com a Aneel, que negou o reajuste pedido para reequilíbrio econômico e financeiro da concessão. Após levar o caso à Justiça, a própria TNE formalizou, em março, a proposta de arbitragem.
O acordo foi costurado com o Ministério de Minas e Energia (MME), que se opôs ao cancelamento do contrato, além da Funai e do Ibama.
O que está em discussão é a remuneração da linha de transmissão – a Receita Anual Permitida (RAP), que é regulada pela Aneel. A TNE quer a incorporação de um capex adicional de R$ 1 bilhão, em boa parte atribuído à demora no licenciamento ambiental.
Em valores não corrigidos, a Aneel aprovou uma receita de R$ 329 milhões, por 17,5 anos. A TNE queria R$ 395 milhões em um contrato de 27 anos.
Arbitragem ocorrerá apenas após conclusão do licenciamento (emissão de LI). E de uma nova rodada de análise da receita da TNE na Aneel. Sem a licença, o projeto continuará parado.
Além da conexão do último estado totalmente isolado do país, a linha poderá servir ao escoamento da energia gerada em Roraima, caso da UTE Jaguatirica II, em construção pela Eneva.
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Licença pode sair em 6 meses, mas sem garantias
No melhor cenário, as obras começam em 2022. Será feito um compromisso com os órgãos envolvidos no licenciamento para emitir a licença de instalação (LI) em até 180 dias, após a assinatura dos termos da arbitragem, prevista para ocorrer dentro de um mês.
Mas não há garantias, segundo explicou a procuradora-federal Bárbara Bianca Sena, na quinta (9), quando o assunto foi discutido na diretoria da Aneel.
“A licença ambiental de instalação deverá ser emitida em 180 dias. [Mas] o compromisso não obriga os órgãos envolvidos no licenciamento ambiental a emitir a licença. Eles continuam no exercício pleno de suas funções atribuídas pela lei e não ficam obrigados a emitir a licença. Mas se o fizerem, terão que fazer em até 180 dias”, disse.
Dez anos de atraso
- Licitada em 2011, a linha de transmissão Manaus-Boa Vista faz parte do megaprojeto de interligação da região Norte do país ao Sistema Interligado Nacional (SIN), que ficou conhecido como Linhão de Tucuruí. Deveria ter entrado em operação em 2015.
- Sem a conexão, Roraima segue como o único estado completamente isolado do país, dependente da geração local e, no passado, de importações da Venezuela, que foram suspensas no governo Bolsonaro.
- Em 2015, a TNE desistiu do projeto e tentou a rescisão amigável do contrato junto à Aneel. Essa discussão levou três anos e em 2018, o MME negou o fim dos contratos;
- Entre 2019 e 2021, a concessionária discutiu o reajuste do contrato na Aneel, sem chegar a um acordo. Acabou levando o caso à Justiça, que já deu uma decisão favorável à rescisão, com indenização das empresas. A União foi condenada a pagar R$ 540 milhões, mas a dívida não foi executada.
- Com a arbitragem, se espera encerrar as ações judiciais e administrativas e chegar a uma solução para remuneração da TNE. Em contrapartida, a empresa se compromete a dar início imediato às obras, assim que a licença de instalação for emitida pelo Ibama (condição para início da arbitragem).
O licenciamento ambiental envolve a Funai, que participa da análise do componente indígena, e o Ibama, responsável pelo licenciamento ambiental. O projeto da linha corta, nas margens de uma estrada federal, a terra indígena de povos Waimiri Atroari, na floresta Amazônia.
Ainda está em finalização o protocolo de consulta que está sendo feito junto à comunidade indígena, uma vez que as linhas de transmissão passam por 122 quilômetros desse território.
A demora na conclusão levou o presidente Jair Bolsonaro a incluir o empreendimento como de interesse à Política de Defesa Nacional em 2019. Decisão, na prática, não teve efeito.
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Manutenção do contrato é solução mais econômica, defende o MME
De acordo com análises do MME, a manutenção da concessão e, consequentemente, a redução do prazo significa uma economia de 1,54 bilhão a R$ 3,1 bilhões em combustíveis para abastecimento das termelétricas, que hoje atendem ao sistema isolado de Roraima.
Com a arbitragem, o MME calcula que é possível concluir a linha em 36 meses.
Relicitar o mesmo projeto — repetindo o traçado — levaria de 79 a 94 meses; enquanto estudar um traçado alternativo e lançar novo leilão, poderia levar de 89 a 122 meses até a entrada em operação, informou a pasta à Aneel.
Diversas alternativas locacionais foram consideradas, mas a fronteira entre os estados é cercada de territórios indígenas e áreas de proteção ambiental. No licenciamento prévio, prevaleceu a opção pela faixa de servidão da estrada existente, que já corta a reserva Waimiri Atroari.
A decisão da Aneel foi tomada em sessão da agência nesta sexta (10) sem a transmissão habitual no Youtube ou divulgação dos resultados à imprensa.
Foi pauta da reunião de ontem (9), mas a discussão foi interrompida por pedido de vistas do diretor Efrain da Cruz, o que levou à reunião extraordinária desta sexta (10).
A proposta foi relatada pela diretora Elisa Bastos e, no fim das contas, aprovada por unanimidade.
Na decisão final, foi retirada a criação de um grupo de trabalho com setores da agência (SCT, SFE, SFF, SAF e SLC) para assessorar a Procuradoria-Federal na arbitragem.
Potencial de geração de Roraima é estímulo para LT
Nas análises, o MME cita a possibilidade de exportar energia gerada no estado para outras regiões como mais um estímulo para a construção da linha. Entre os projetos estão Jaguatirica II, uma usina termoelétrica a gás natural em construção pela Eneva, que vai gerar energia em Boa Vista a partir da produção do campo de Azulão, no Amazonas.
O gás será liquefeito e transportado por caminhões até Boa Vista.
Foi uma das saídas encontradas para aumentar a garantia de suprimento ao estado. A UTE foi contratada em um leilão específico para atendimento ao sistema isolado de Boa Vista.
Outra usina citada é a hidrelétrica Bem Querer, ainda em fase de projeto, na Empresa de Pesquisa Energética (EPE). Trata-se de uma usina de grande capacidade, com 650 MW de potência, que demandaria R$ 5 bilhões em investimento, nos valores de 2017.
Em razão dos impactos ambientais, a construção de grandes usinas hidrelétricas com reservatório perdeu espaço no planejamento brasileiro. Projetada para o rio Branco, em Roraima, a UHE Bem Querer não prevê o alagamento de unidades de conservação ou terras indígenas.
O argumento é que a linha Manaus-Boa Vista, portanto, poderia injetar mais energia hídrica (renováveis) no SIN, reduzindo a dependência de térmicas mais caras e poluentes, como as movidas a diesel e óleo combustível, não apenas em Roraima.
“A usina, fonte de energia renovável, contribuirá para a segurança energética do estado de Roraima e para a maior oferta de energia hidrelétrica ao SIN nos meses em que são esperados maiores despachos térmicos, contribuindo para a redução desses despachos e da emissão de gases de efeito estufa”, defende o governo.