Opinião

O dever da Câmara e o devedor contumaz

Marco do devedor contumaz é essencial para fortalecer arrecadação e preservar segurança econômica e institucional do país, escreve Emerson Kapaz

Emerson Kapaz, presidente do Instituto Combustível Legal (ICL)
Emerson Kapaz, presidente do Instituto Combustível Legal (ICL)

A Câmara dos Deputados tem diante de si uma responsabilidade histórica: aprovar o Projeto de Lei Complementar (PLP) 125/2022, que cria um marco nacional para o combate ao devedor contumaz — aquele que transforma a sonegação e inadimplência sistemática de tributos em modelo permanente de negócio.

Trata-se de uma medida essencial não apenas para fortalecer a arrecadação, mas para preservar a segurança econômica e institucional do país.

Segundo levantamento do Instituto Combustível Legal (ICL), o setor de combustíveis acumula R$ 207 bilhões em dívidas ativas federais e estaduais. Quando aplicado as regras do PLP 125/22, que caracteriza e tipifica o devedor contumaz totalizarão R$ 174,2 bilhões, valor suficiente para financiar em 1,25x todas as despesas com segurança pública.

São recursos que poderiam reforçar o efetivo policial, modernizar a fiscalização e investir em inteligência, mas que hoje permanecem retidos por empresas que fazem da fraude fiscal um método recorrente de operação.

Só junto à União, essas dívidas chegam a R$ 86 bilhões — equivalente a 4x ao orçamento federal de segurança pública em 2024 (R$ 21 bilhões).

O PLP 125/2022 não trata do contribuinte que enfrenta dificuldades pontuais, mas do devedor contumaz — aquele que cria empresas de fachada, manipula declarações fiscais e utiliza artifícios jurídicos para escapar do pagamento de impostos por longos períodos.

No setor de combustíveis, essa prática distorce a concorrência, encarece o preço ao consumidor e alimenta esquemas criminosos.

Dados do Tribunal de Contas da União (TCU) mostram que mais de 60% da dívida ativa da União está concentrada nas mãos de devedores estruturais, totalizando cerca de R$ 1,4 trilhão.

O fenômeno se repete em setores como bebidas, cigarros, telecomunicações e mineração. O PLP 125 propõe um modelo claro para distinguir o inadimplente eventual do fraudador habitual e deliberado, com critérios objetivos e uniformes para todos os entes federativos.

O texto também fortalece a cooperação entre Receita Federal, Ministérios Públicos e secretarias estaduais de Fazenda, permitindo o compartilhamento de informações e a atuação coordenada contra redes de sonegação estruturada.

Essa integração é essencial para que as punições tenham efetividade e para que o fisco possa atuar preventivamente, em vez de reagir tardiamente à fraude.

Levantamentos técnicos do ICL, baseados em dados de arrecadação e fiscalização, indicam que aproximadamente 10% do mercado de combustíveis ainda opera de forma irregular, com práticas organizadas de evasão tributária, adulteração de qualidade e quantidade, pirataria, contrabando e furto e roubo de cargas.

Esse comportamento não é apenas um problema fiscal — é uma ameaça direta à economia formal, à livre concorrência e a ética concorrencial.

O combate ao devedor contumaz é, portanto, uma pauta de interesse público e republicano. Significa proteger o empresário correto, que gera empregos e cumpre suas obrigações, e responsabilizar quem se aproveita da leniência do sistema para enriquecer ilicitamente.

O PLP 125 representa um avanço institucional que o Brasil não pode adiar. A aprovação da proposta consolidará uma política fiscal moderna, justa e transparente, capaz de separar o contribuinte em dificuldade do criminoso tributário e de recuperar recursos preciosos para o Estado.

A Câmara tem, agora, a oportunidade de demonstrar compromisso com o país real — aquele que trabalha, paga impostos e exige justiça fiscal. Combater o devedor contumaz é defender a segurança pública, a concorrência leal e a democracia.


Emerson Kapaz é presidente do Instituto Combustível Legal (ICL).

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