A transição explicada

Neoindustrialização: o que podemos aprender com Illinois

Competitividade exige visão de longo prazo, estratégia coordenada e execução disciplinada, escreve Stefania Relva

Stefania Relva, diretora de Transformação Industrial do Instituto E+ Transição Energética
Stefania Relva, diretora de Transformação Industrial do Instituto E+ Transição Energética

Durante evento recente com líderes globais em Londres, tive a oportunidade de fazer uma pergunta ao governador de Illinois, Jay Robert “J.B.” Pritzker, logo após sua palestra: como ele estava conseguindo atrair indústrias para o estado?

A resposta foi direta e inspiradora: “Para desenvolver a indústria, precisamos de três coisas. Primeiro, gente bem treinada, porque se alguém vai investir, quer ter certeza de que haverá pessoas para trabalhar nos próximos 40 anos. Não 10, não 20, não 30, mas 40 anos. Segundo, capacidade de escoar a produção com uma infraestrutura eficiente. Terceiro, eletricidade. Illinois tem as três, por isso estamos crescendo.”

Essa fala ressoa fortemente com a realidade do Brasil.

Temos uma juventude criativa, diversa e cheia de potencial, mas ainda precisamos acelerar e estruturar programas continuados de qualificação, conectados às demandas da indústria 4.0 e da economia verde, para garantir mão de obra consistente e preparada para os desafios tecnológicos, digitais e ambientais das próximas décadas.

Além disso, nossa matriz elétrica majoritariamente limpa e renovável é um ativo estratégico de enorme valor, mas sua expansão precisa ser planejada de forma a acompanhar o crescimento da demanda industrial, assegurando previsibilidade de preços, estabilidade regulatória e incentivos para eletrificação de processos produtivos.

No entanto, é na infraestrutura de escoamento que enfrentamos talvez nosso maior desafio: os custos logísticos elevados e a baixa integração intermodal continuam a ser entraves estruturais. Investimentos em ferrovias, hidrovias, portos e corredores de exportação são urgentes para reduzir o chamado “Custo Brasil” e tornar a indústria nacional competitiva nos mercados globais.

Illinois, de fato, já está colhendo resultados concretos da sua estratégia industrial — não se trata apenas de promessa, mas de impacto real.

No último ano fiscal, mais de 700 empresas se comprometeram a expandir ou se transferir para o estado, com anúncios de investimentos que somam US$ 25,8 bilhões e projetam a criação de quase 19 mil empregos.

Os setores prioritários incluem manufatura avançada, energia limpa, life sciences, microeletrônica/quântica, agrotecnologia e logística.

Dentre os projetos, na semana passada começaram oficialmente as obras das instalações da PsiQuantum no Illinois Quantum and Microelectronics Park (IQMP). O parque, que visa consolidar Illinois como líder nacional na corrida global pela inovação quântica, também deve sediar empresas globais como IBM, Diraq e Infleqtion.

Em paralelo, a empresa de combustíveis Avina, de New Jersey, planeja construir uma fábrica de combustível sustentável para aviação de US$ 820 milhões, aproveitando-se da elevada produção de soja e milho do estado.

Na área de veículos elétricos, a canadense Damera abrirá sua primeira fábrica de montagem nos Estados Unidos na região, enquanto a montadora Rivian, com sede na Califórnia, construirá um parque de fornecedores de US$ 120 milhões.

O recado de J.B. Pritzker é cristalino: competitividade não se constrói no curto prazo, ela exige visão de longo prazo, estratégia coordenada e execução disciplinada.

Para o Brasil, o caminho passa por articular políticas industriais modernas, integrar iniciativas públicas e privadas e transformar suas vantagens naturais em vantagens competitivas reais.

Se conseguirmos alinhar talento, infraestrutura e energia, não apenas teremos condições de atrair investimentos de peso, mas poderemos nos posicionar como líder global da nova economia verde, protagonizando a transição industrial e capturando oportunidades de inovação, geração de empregos de qualidade e crescimento sustentável para as próximas décadas.

*Stefania Relva é diretora de Transformação Industrial do Instituto E+ Transição Energética.

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