As gigantes do petróleo norte-americanas ExxonMobil e Chevron experimentaram nesta quarta (26/5) duas rebeliões de acionistas descontentes com a indefinição de propostas para o futuro de baixo carbono.
Na Holanda, uma ação movida por organizações da sociedade civil conseguiu uma decisão favorável para obrigar a Shell a cortar suas emissões em 45%. A companhia vai recorrer.
De acordo com reportagem do The Guardian, um pequeno investidor ativista chamado Engine No. 1 conquistou duas cadeiras no conselho da ExxonMobil, após ter questionado a estratégia climática da empresa.
Uma contagem preliminar de votos mostrou que os acionistas apoiaram Gregory Goff e Kaisa Hietala – diretores com experiência em transição energética indicados pelo Engine No. 1 –, informou a gigante do petróleo.
Desde dezembro, o Engine No. 1 solicita que a empresa diversifique gradualmente seus investimentos migrar dos combustíveis fósseis para outras fontes.
Mas a companhia aposta em uma demanda forte por óleo e defende expansão da perfuração, e a captura e armazenamento de carbono como estratégia climática.
Para o fundo, que buscou quatro assentos no conselho, a Exxon deveria se comprometer com a neutralidade de carbono até 2050.
Enquanto isso, a maioria dos acionistas da Chevron se rebelou contra o conselho da empresa votando 61% a favor de uma proposta ativista do grupo holandês Follow This para forçar a petroleira a cortar suas emissões de carbono.
A vitória na Chevron foi a terceira insurreição bem-sucedida coordenada pelo Follow This contra os conselhos das empresas petrolíferas dos EUA.
O grupo também conseguiu no início desse mês, por meio de votos, que ConocoPhillips e Phillips 66 cortassem suas emissões.
Mark van Baal, fundador do Follow This, disse que as revoltas dos acionistas marcam uma mudança de paradigma dos investidores e uma vitória na luta contra as alterações climáticas.
“Os investidores institucionais entendem que nenhum investimento é seguro em uma economia global destruída por uma mudança climática devastadora”, disse Van Baal.
“Estamos bem posicionados para responder”, diz CEO da Exxon
Em comunicado, a ExxonMobil afirmou que possui “planos claros para novas reduções [de emissões] até 2025, consistentes com os objetivos do Acordo de Paris.
“Ouvimos hoje dos acionistas sobre o desejo deles de continuar esses esforços, e estamos bem posicionados para responder”, disse Darren Woods, presidente do conselho e CEO da ExxonMobil.
“Damos as boas-vindas a todos os nossos novos diretores e esperamos trabalhar com eles de forma construtiva e coletiva em nome de todos os acionistas”.
A Chevron, por sua vez, destacou a resiliência de suas operações no primeiro ano de pandemia e “que está tomando medidas para reduzir a intensidade de carbono de suas operações e ativos, aumentar o uso de energias renováveis e compensações em apoio a seus negócios e investir em tecnologias de baixo carbono”.
“A Chevron tem navegado pelos desafios do último ano melhor do que a maioria em nossa indústria”, disse Michael Wirth, presidente e CEO da Chevron.
“Estamos otimistas quanto ao futuro, pois trabalhamos para proporcionar maiores retornos e menos carbono”.
Tribunal holandês ordena corte de emissões na Shell
Também nesta quarta, em uma ação inédita, um tribunal holandês decidiu que a unidade da Shell no país (Royal Dutch Shell) deve reduzir suas emissões de CO2 em 45% até 2030 em relação aos níveis de 2019.
Isso inclui as emissões de suas próprias operações e dos produtos de energia que vende.
A decisão de um tribunal distrital de Haia pode ter consequências para as demais empresas de petróleo.
O redirecionamento de investimentos para negócios da economia de baixo carbono é um tema que avança já há algum tempo e afeta empresas no mundo inteiro e em diferentes setores.
A Shell vai recorrer da decisão
“Estamos investindo bilhões de dólares em energia de baixo carbono, incluindo carregamento de veículos elétricos, hidrogênio, energias renováveis e biocombustíveis”, afirmou o diretor de Projetos e Tecnologia da Shell, Harry Brekelmans.
Em comunicado, a companhia listou uma série de iniciativas tomadas desde 2017 que culminaram no compromisso de atingir a neutralidade de carbono em 2020.
“É necessária uma ação urgente sobre a mudança climática e é por isso que aceleramos nossos esforços para nos tornarmos uma empresa de energia com emissões líquidas zero até 2050, em sintonia com a sociedade, com metas de curto prazo para acompanhar nosso progresso”, diz Harry Brekelmans.
A ação foi movida no Tribunal Distrital de Haia pela Friends of the Earth Netherlands (Milieudefensie) ao lado de seis ONGs – Action Aid Netherlands, Both ENDS, Fossil Free Netherlands, Greenpeace Netherlands, Young Friends of The Earth Netherlands and the Wadden Sea Association (Waddenvereniging).
“Esta é uma vitória monumental para nosso planeta, para nossos filhos e é uma parada rumo a um futuro habitável para todos”, comemorou Donald Pols, diretor da Friends of the Earth Holanda.
“O juiz não deixou margem para dúvidas: a Shell está causando uma perigosa mudança climática e deve parar seu comportamento destrutivo agora”, diz.
Roger Cox, advogado da organização afirma que “este é um ponto de inflexão na história. Este caso é único porque é a primeira vez que um juiz ordenou a uma grande empresa poluidora o cumprimento do Acordo Climático de Paris. Esta decisão também pode ter grandes consequências para outros grandes poluidores.”
“Nossa esperança é que este veredicto desencadeie uma onda de litígio climático contra os grandes poluidores, para forçá-los a parar de extrair e queimar combustíveis fósseis”, afirma Sara Shaw.
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Financiamento na agenda do setor
Em entrevista ao Backstage Rio Oil & Gas 2020, em dezembro do ano passado, Paula Costa, CFO da Enauta, já alertava para a nova dinâmica do mercado.
“Tem dois fatores que influenciam o capital para a indústria de óleo e gás. Muitos credores sofreram com projetos de shale e, embora seja uma dinâmica diferente, isso acaba influenciando de alguma forma. Eles [os credores] acabam sendo mais seletivos”, explica.
Segundo a executiva, bancos internacionais que tradicionalmente financiavam projetos de E&P, hoje têm preferência por empresas com princípios de ESG.
“Deixou de ser uma prerrogativa das empresas, que por vontade própria decidiram incorporar isso à cultura, e passou a ser uma demanda para que essas empresas tenham acesso ao capital”, completa.
Com informações do The Guardian e ClimaInfo