diálogos da transição

"Meteoro x dinossauros": elétricos, combustão e etanol na disputa pelo mercado brasileiro

Em meio a discussão sobre imposto de importação de veículos, BYD chama concorrentes de dinossauros: "uma empresa chinesa coloca carro elétrico na garagem da classe média e os dinossauros surtam"

Carros movidos a etanol transportam delegações que participam de reuniões de chanceleres do G20 no Rio (Foto: Divulgação MRE)
Carros movidos a etanol transportam delegações que participam de reuniões de chanceleres do G20 no Rio (Foto: Divulgação MRE)

NESTA EDIÇÃO. Montadoras tradicionais e a chinesa BYD travam uma batalha pelo mercado brasileiro de veículos.

Elevação das tarifas de importação de carros desmontados provocou troca de farpas públicas entre fabricantes.

Nos bastidores, disputa tecnológica alcança também os biocombustíveis.


EDIÇÃO APRESENTADA POR

Montadoras tradicionais no mercado automotivo brasileiro protagonizaram esta semana uma troca de farpas com a chinesa BYD em meio a uma acirrada disputa pelos consumidores nacionais.
 
É um mercado relevante. No primeiro semestre de 2025, o país emplacou 1,2 milhão de veículos novos, uma alta de 4,8% em relação ao mesmo período do ano passado, segundo a Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave).
 
Desse total, quase 87 mil unidades eram elétricas ou híbridas — um crescimento de 9,5% em relação às vendas no primeiro semestre de 2024. E a BYD liderou essa demanda.
 
Essa disparada na venda de eletrificados da BYD tem acendido o alerta em fabricantes reunidas na Anfavea (associação do setor) como Volkswagen, Toyota, Stellantis e General Motors, que esta semana intensificaram os pedidos ao governo Lula (PT) para manutenção dos impostos de importação sobre carros desmontados.
 
O pedido ocorreu às vésperas de uma reunião do Comitê Executivo de Gestão da Câmara de Comércio Exterior (Gecex-Camex) para discutir um pleito da BYD de redução temporária da tarifa para importação de carros desmontados de veículos elétricos ou híbridos.
 
Em uma carta divulgada no Linkedin, o presidente da Volkswagem, Ciro Possobom, apela ao presidente Lula por “igualdade de condições para competir”. Na visão da montadora alemã, o incentivo à importação de veículos desmontados abala os investimentos anunciados no país para ampliação do parque industrial.
 
São cerca de R$ 180 bilhões em investimentos previstos no contexto da política automotiva Mover, que concede incentivos à fabricação de modelos mais eficientes e sustentáveis. 
 
Stellantis (R$ 30 bi), Volkswagen (R$ 16 bi), Toyota (R$ 11 bi), General Motors (R$ 7 bi) e BYD (R$ 5,5 bilhões) estão incluídas no montante. 
 
A pressão surtiu algum efeito: na quarta (30/7), o Gecex, vinculado ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), decidiu antecipar em um ano e meio o fim do cronograma de elevação tarifária.
 
A partir de janeiro de 2027, veículos híbridos ou elétricos desmontados passam a recolher imposto de importação de 35%. 
 
Em contrapartida, a BYD conseguiu a ampliação das quotas de importação com alíquota zero para veículos desmontados (CKD) e semidesmontados (SKD), pelo prazo de seis meses, para US$ 463 milhões no total.



A BYD também reagiu com uma carta (.pdf). Nela, a chinesa chama as concorrentes de dinossauros e diz que os consumidores já fizeram suas escolhas.
 
Explica ainda que o pedido de redução temporária do imposto parte da lógica de que não faz sentido aplicar o mesmo nível de tributação sobre veículos 100% prontos trazidos do exterior e sobre veículos que são montados no Brasil.
 
Segundo a montadora, a montagem aqui gera empregos locais, movimenta a cadeia logística e paga encargos. 
 
“Isso não é nenhuma novidade, outras montadoras já adotaram a mesma prática antes de ter a produção completa local”, alega.
 
“Agora, chega uma empresa chinesa que acelera fábrica, baixa preço e coloca carro elétrico na garagem da classe média, e os dinossauros surtam. (…) A carta [das montadoras a Lula] fala em “concorrência desleal”. Porque nada é mais desleal do que alguém jogar o jogo — e ganhar”, critica.
 
Vale dizer que há poucos dias o governo federal também concedeu isenção total para carros populares de baixa emissão, em uma medida que vai beneficiar, a princípio cinco montadoras: Volkswagen (Polo), Chevrolet (Ônix), Renault (Kwid), Hyundai (HB20) e Stellantis (Mobi e Argo).

Mais do que um duelo elétricos x combustão, esta é mais uma das contradições que o Brasil precisa enfrentar em sua jornada de transição energética.
 
O governo Lula tomou a decisão política de abraçar os biocombustíveis como plataforma de sustentabilidade — inclusive tenta exportá-la —, mas o avanço da eletrificação soa como uma ameaça aos investimentos tanto em carros híbridos e flex, quanto na própria indústria de bioenergia.
 
Afinal, além de disputar com a gasolina, o etanol agora enfrenta a concorrência da eletrificação. E a oferta do biocombustível tende a aumentar nos próximos anos.


Por falar em etanol, entraram em vigor nesta sexta (1º/8) os aumentos das misturas obrigatórias de etanol à gasolina, que passa de 27% para 30% (E30), e de biodiesel ao diesel, de 14% para 15% (B15). O governo brasileiro conta com E30 e B15 para reduzir a dependência de importações.
 
Tarifaço. Produtores de açúcar e etanol da Paraíba calculam perdas de R$ 40 milhões na cadeia produtiva com tarifas do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, sobre produtos brasileiros. Segundo estimativas do Sindialcool da Paraíba, o impacto será maior para o açúcar, já que o produto responde por cerca de 49% do total das exportações do estado.
 
Licenciamento ambiental. O MPF defende, em nota técnica entregue ao Palácio do Planalto, o veto a mais de 30 dispositivos da Lei Geral do Licenciamento Ambiental. Segundo o Ministério Público, a norma aprovada em 17 de julho pelo Congresso “contém dispositivos que comprometem a proteção ambiental e violam preceitos constitucionais”. 
 
Leilão do GSF. Cinco grupos venceram o leilão das dívidas judiciais relacionadas às liminares do GSF (fator de escala de geração, na sigla em inglês), concluído pela CCEE nesta sexta (1º/8). Empreendimentos da Eletrobras, Cemig, Rio Paranapanema, Santa Fé e ArcelorMittal movimentaram R$ 1,4 bilhão em negociações e poderão prorrogar as concessões de hidrelétricas.
 
Crise climática. Uma combinação de três fenômenos tem ameaçado cada vez mais os ecossistemas das regiões sul e equatorial do oceano Atlântico: ondas de calor marinhas, acidificação alta e concentração de clorofila baixa. Antes de 2016, era incomum que esses casos ocorressem ao mesmo tempo. De lá para cá, passaram a acontecer todos os anos.
 
E crise de hospedagem. A dificuldade de encontrar acomodações a preços acessíveis para a COP30 está levando países a pressionarem o Brasil para tirar o evento ambiental da capital do Pará. O embaixador André Corrêa do Lago, presidente da COP em Belém, admitiu o problema e diz que o governo busca soluções para convencer o setor hoteleiro a oferecer valores mais baixos durante a conferência, em novembro.
 
Florestas produtivas. A Petrobras vai aderir ao Programa Nacional de Florestas Produtivas, do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar. Agenda do governo federal na COP30, a iniciativa mira restauração agroflorestal, com integração entre lavoura, pecuária e floresta.

Precisamos repactuar o sistema elétrico brasileiro As mudanças dos últimos anos impõem um novo modelo, que modernize a legislação, englobe uma visão sistêmica e tenha força para se sobrepor a interesses particulares, escreve Max Xavier Lins
 
Você sabe como serão as refinarias do futuro? Renovar o parque de refino brasileiro para atender internamente à demanda é essencial para a segurança energética no Brasil, escrevem executivos da Acelen
 
Economia de até R$ 9,1 bi em jogo Mesmo com reservatórios cheios e térmicas mais caras, modelo de despacho segue calibrado para cenário crítico da crise hídrica de 2021, elevando custos e risco inflacionário, escreve Franklin Miguel

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