diálogos da transição

Licenciamento ambiental flexível amplia tensão no governo: ainda não acabou

Presidente Lula terá 15 dias úteis para decidir se veta novo licenciamento ou assume desgaste a poucos meses de receber a COP30

Licenciamento ambiental flexível amplia tensão no governo Lula (Foto: Ricardo Stuckert/PR)
Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante Visita e Cerimônia de Entrega de Máquinas Agrícolas a Municípios de Minas Gerais no âmbito do Programa Nacional de Modernização e Apoio à Produção Agrícola (PROMAQ). Contagem (MG), em 12/6/2025 (Foto: Ricardo Stuckert/PR)

NESTA EDIÇÃO. Texto aprovado às pressas segue para sanção ou veto de Lula (PT) e a tendência é acirrar tensões entre as alas ambiental e de infraestrutura do governo.
 
Presidente terá 15 dias úteis para decidir se veta a proposta ou assume desgaste a poucos meses de receber a COP30.


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Com 267 votos a favor e 116 contra, a Câmara dos Deputados aprovou, na madrugada desta quinta (17/7) — e à véspera do recesso parlamentar — a nova Lei Geral do Licenciamento Ambiental, flexibilizando o rito para empreendimentos que vão do agro à mineração, passando também por energia.
 
A votação terminou por volta das 3h40, sob o atropelo de Hugo Motta (Republicanos/PB), que limitou os debates para assegurar a conclusão dos destaques. 
 
E contou com o protagonismo da Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), uma das principais interessadas na aprovação do texto — grande articuladora também da vitória no Senado em maio.
 
O dia amanheceu amargo para ambientalistas, que apelidaram o projeto de “PL da Devastação”, e enxergam o Brasil da COP30 acelerando na contramão.
 
“O resultado será um ambiente urbano com múltiplos projetos prejudiciais à saúde, como grandes indústrias, mineradoras ou aterros sanitários, que, sem o controle municipal, se tornarão vizinhos indesejados de moradias, escolas e unidades de saúde, expondo a população a riscos constantes e inaceitável”, aponta Juliano Bueno, diretor do Instituto Arayara.
 
Uma das críticas é em relação ao “autolicenciamento” previsto no texto. 
 
Significa que apenas uma declaração do empreendedor preenchida em formulário pode ser suficiente para a instalação de projetos de alto impacto, sem uma análise mais aprofundada e discussão com comunidades afetadas, como ocorre hoje. 
 
Por outro lado, grupos ligados ao setor de energia comemoraram a aprovação, defendendo que o novo marco legal não elimina salvaguardas ambientais, nem extingue a exigência de estudos de impacto ou retira o direito à consulta de povos indígenas.
 
“Ao estabelecer regras claras e diferenciadas conforme o impacto de cada atividade, o PL 2159/2021 reforça o princípio da proporcionalidade e a racionalidade na gestão pública, elementos essenciais para a sustentabilidade de longo prazo”, diz em nota o Instituto Acende Brasil, que tem na sua lista de clientes grandes empresas e associações do setor de energia.
 
A organização reconhece, no entanto, que ajustes podem ser necessários.
 
“A nova lei não é perfeita, como nenhuma lei é. Mas os eventuais ajustes e salvaguardas adicionais podem e devem ser tratados por meio de vetos presidenciais e, principalmente, por regulamentação no âmbito do Poder Executivo”, completa.



Essa é a visão da ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva (Rede), que desde a aprovação do texto no Senado trabalhou para que ele tivesse mais tempo de discussão na Câmara, em uma tentativa de impedir que a matéria seguisse para sanção de Lula (PT) com o afrouxamento de regras. 
 
“Não protege a natureza, não agiliza os processos e ainda prejudica os interesses econômicos do Brasil. Nós vamos atrapalhar o acordo da União Europeia com o Mercosul em função desses afrouxamentos”, disse na noite de ontem, quando ainda tinha esperança que o texto saísse de pauta.
 
Um dos entraves históricos para a conclusão do acordo é justamente a desconfiança dos europeus em relação à proteção ambiental em países como o Brasil. Viés que tem sido usado pela França, por exemplo, para proteger seu agronegócio da concorrência sulamericana.
 
A recente investida de Trump contra o Brasil também pode ter ganhado um aliado, como analisa Giovana Girardi, da Pública.
 
Nesta quinta (em um evento não relacionado com a aprovação da lei do licenciamento), o governo dos Estados Unidos, por ordem direta do presidente Donald Trump, abriu uma investigação contra o Brasil por práticas comerciais estariam restringindo ou onerando o comércio com as empresas norte-americanos. 
 
Entre os pontos do documento assinado pelo Escritório do Representante Comercial dos EUA (USTR) estão, ironicamente, as alegações de que “corrupção sistêmica e uso de documentos fraudulentos” permitem que madeira e produtos agrícolas ilegais cheguem ao mercado dos EUA.

O próximo capítulo será a disputa interna pelos vetos de Lula
 
A área ambiental do governo defende que o projeto é ‘irremediável’. 
 
O texto, no entanto, tem apoio da área de infraestrutura do governo Lula e no Planalto. Rui Costa (Casa Civil) e Marcos Cavalcanti (PPI), além de ministros como Renan Filho (Transporte) e Alexandre Silveira (MME) são porta-vozes da defesa pela criação das novas modalidades de licenciamento ambiental.
 
O presidente Lula tem prazo de 15 dias úteis para sancionar ou vetar o projeto na íntegra ou em partes.
 
Para o Observatório do Clima, a única opção é vetar por inteiro.
 
“Não há como salvar o texto com vetos pontuais. O licenciamento ambiental pode ser aperfeiçoado, mas isso deve ser feito com participação da sociedade e critérios técnicos e científicos”, diz uma nota divulgada nesta quinta.
 
A organização encomendou um estudo que analisa que a nova lei não resolve a quantidade excessiva de regras e procedimentos e, na contramão, abre espaço para que estados e municípios criem suas próprias regras sem parâmetros nacionais mínimos. Veja na íntegra (.pdf)


Tarifaço. O vice-presidente e ministro, Geraldo Alckmin (PSB), teve nesta quinta-feira (17/7), uma nova reunião com empresários sobre a tarifa de 50% anunciada pelos EUA sobre importação de produtos brasileiros. O encontro por videoconferência reuniu representantes de setores potencialmente afetados pela tarifa, sucroenergético e biocombustíveis, de aeronaves, carne bovina, celulose a suco de laranja.
 
Etanol reage a Trump. Em resposta à abertura de investigação sobre as práticas comerciais do Brasil, a indústria do etanol divulgou nota nesta quinta-feira (17/7) defendendo que o biocombustível brasileiro tem baixa intensidade de carbono e está em conformidade com critérios robustos e auditáveis de sustentabilidade. A nota é assinada pela Unica e Bioenergia Brasil.
 
Gás para data centers. A construção de uma política pública para atrair investimentos em data centers não deve deixar fontes fósseis de lado, defende o vice-presidente da Siemens Energy para América Latina, André Clark. Segundo ele, o gás natural é “inexorável nesse jogo”.
 
Taxonomia para os corredores a gás. A inclusão do gás natural como combustível de transição na Taxonomia Sustentável Brasileira será fundamental para viabilizar os corredores sustentáveis e incentivar, assim, a substituição do diesel pelo gás na frota de veículos pesados, defende o secretário-executivo do Ministério dos Transportes, George Santoro.
 
Por falar na ANP… O superintendente da agência reguladora Luciano Lobo informou nesta quinta-feira (17/7) que a agência disse aos funcionários que vai fechar as portas durante três dias por semana, para economizar recursos e tentar chegar até o final do ano.
 
Presidente da Eletronuclear deixa cargo. Raul Lycurgo Leite deixou a função na quarta-feira (16/7). Ele estava no comando da estatal desde dezembro de 2023, quando substituiu Eduardo Grand Court, que presidiu a empresa entre outubro de 2022 e o fim do ano seguinte.
 
Resposta de demanda. O ONS negociou 229 MW no segundo leilão de resposta da demanda, realizado na quarta-feira (16/7). Na primeira edição, no ano passado, foram contratados 93 MW. O deságio máximo foi de 32,5%.
 
R$ 5 bi para expansão elétrica no ES. A distribuidora EDP Espírito Santo firmou nesta quinta (17/7) um novo contrato de concessão com validade de 30 anos e anunciou que pretende investir R$ 5 bilhões em expansão e modernização da rede elétrica no estado até 2030.
 
GD desacelera. A capacidade instalada da micro e minigeração distribuída (MMGD) cresceu 4,697 GW no Brasil nos primeiros seis meses de 2025, indicando uma desaceleração em relação ao mesmo período do ano anterior. Mesmo assim, entre janeiro e junho de 2025, a MMGD teve uma alta de 12,78%, superando 41 GW.
 
Solar na Transpetro. Visando ampliar a descarbonização das operações, a Transpetro inaugurou nesta quinta (17/7) a segunda usina solar da empresa, no terminal de Belém (PA), cidade que sediará a COP30 em novembro. Os planos para aprofundar a redução de emissões incluem o mercado livre de energia.
 
Trainee na Light. A Light está com inscrições abertas, até 19 de agosto, para o Programa de Trainee 2025. Os participantes terão acesso a cursos, mentorias e vivência prática no setor elétrico. Podem se inscrever os recém-formados em Administração, Engenharia, Comunicação, Direito, Economia e Tecnologia da Informação, entre outros. 

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