RIO – O ministro de Minas e Energia (MME), Alexandre Silveira (PSD), pediu que a Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) priorize, em sua agenda, a regulação do programa de desconcentração do mercado de gás natural (o gas release), após perder queda de braço dentro do governo em torno da inclusão do assunto no relatório do Paten.
Silveira era um dos apoiadores da proposta do senador Laércio Oliveira (PP/SE) para incluir o gas release no relatório do Programa de Aceleração da Transição Energética (Paten), mas a iniciativa encontrou resistências no Senado e em outras áreas do governo federal.
Ao fim, o Senado marcou para quarta (4/12) a votação do projeto, mas sem a inclusão do capítulo do gás.
Em ofício enviado nesta segunda (2/12) ao diretor-geral da ANP, Rodolfo Saboia, Silveira cita que o gas release é uma demanda de diferentes agentes do setor (indústrias, produtores independentes, comercializadores e distribuidores, por exemplo) e é “significativamente relevante” para o mercado.
Pede, então, que a agência, “dentro de suas competências legais e regulamentares” e “respeitada sua autonomia e governança”, avalie priorizar o programa de desconcentração.
Recomendar a priorização da ordem de execução dos temas a serem regulamentados pela ANP é uma das competências do recém-criado Comitê de Monitoramento do Setor de Gás Natural (CMSGN), cuja agenda prioritária ainda está sendo formulada.
MME cita inércia regulatória
Uma nota técnica, assinada pelo diretor do Departamento de Gás Natural do MME, Marcello Weydt, destaca que hoje há uma “inércia regulatória” que dificulta a implementação de um ambiente mais competitivo e aberto do setor.
A Lei do Gás, de 2021, atribuiu à ANP a competência de acompanhar o mercado e, a seu exclusivo critério, adotar medidas para promover a efetiva concorrência nos diversos elos da indústria – desde que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) seja consultado.
Na sequência, em 2022, o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) reforçou o gas release como uma das diretrizes da transição para um mercado concorrencial.
A ANP chegou a publicar uma nota técnica, com o diagnóstico da concentração do mercado de gás no Brasil. Apontou, na ocasião, que houve avanços com a liberação de capacidade na malha de transporte e início do processamento do gás de terceiros nas UPGNs, mas que os ganhos até agora “ainda representam uma redução pequena, se não marginal”, da participação de mercado da Petrobras.
E incluiu então, em 2023, o gas release na agenda regulatória. Contudo, a Análise de Impacto Regulatório (AIR) ainda não avançou. E, mais recentemente, em julho, a agência suspendeu os cronogramas de ações com início previsto para 2025, dentre elas a AIR para o programa de desconcentração.
As idas e vindas no Senado
Laércio Oliveira introduziu em outubro, no relatório do Paten, um capítulo novo, dedicado ao mercado de gás natural.
O primeiro parecer apresentado na Comissão de Infraestrutura do Senado propôs a redução compulsória da participação de mercado de qualquer agente que detenha mais de 50% da oferta de gás – o que direciona a política para a Petrobras.
A proposta enfrentou resistências da estatal e, após alinhamento com o MME e negociações com a própria Petrobras, o Laércio Oliveira alterou a sugestão original, para preservar o gás natural produzido pela Petrobras e o gás natural liquefeito (GNL) importado da proposta de criação de uma política de desconcentração do mercado.
O foco passou a ser impedir a estatal de comprar gás de outros produtores nacionais, além de impor limites à petroleira na importação da Bolívia – e, futuramente, da Argentina. Ficou de fora, porém, do relatório final do Paten.
Quem é quem
A Petrobras, como agente dominante, chegou a afirmar, em documento enviado ao governo e a parlamentares, que a proposta original incluída no Paten inviabilizaria novos investimentos da companhia em Sergipe. As críticas foram vocalizadas por Rogério Carvalho (PT/SE), no plenário do Senado.
A estatal, contudo, negociou uma proposta alternativa e conseguiu preservar o seu volume de produção nacional na política.
A inclusão do gas release no Paten foi uma bandeira levantada pelos grandes consumidores industriais. Abrace e a CNI manifestaram apoio (com ressalvas) ao relatório de Laércio Oliveira.
A Abpip (produtores independentes) e a Abegás (distribuidoras) também são defensores de um programa de redução da concentração de mercado. Há um entendimento de parcela do setor, porém, de que o assunto deve ser discutido dentro da ANP, e não via Congresso.
Abegás (distribuidoras) e IBP (produtores), por exemplo, defenderam estudos mais aprofundados sobre o gas release, com Análise de Impacto Regulatório (AIR).