Reforma do GLP

"Empresas eram mal remuneradas", diz Sindigás sobre crescimento de margens

"O oligopólio é uma característica desse setor. São setores que são oligopólicos e não tem muito o que se fazer", afirma Sérgio Bandeira de Mello; ANP propõe reforma do GLP

Sérgio Bandeira de Mello, presidente do Sindigás
Sérgio Bandeira de Mello, presidente do Sindigás | Sindigás/Reprodução

BRASÍLIA – O presidente do Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Gás Liquefeito de Petróleo (Sindigás), Sérgio Bandeira de Mello, disse que o crescimento nas margens do setor se deu porque os outros combustíveis tiveram aumento de preço, o que tornou o GLP mais competitivo, inclusive se comparado à energia elétrica.

“As margens efetivamente tiveram uma evolução positiva. Eu acho que as empresas conseguiram remunerar melhor as suas atividades, que eram pessimamente remuneradas antes. Se você pegar o histórico, elas tinham um retorno sobre o capital empregado péssimo”, afirmou à agência eixos.

Uma nota técnica da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) mostrou um crescimento quatro vezes maior do que a inflação das margens líquidas de distribuidoras de GLP.

Os dados mostram que a média da margem líquida dos distribuidores passou de 7,7% em 2019 para 13,7% em 2023 – ou de R$ 285,22 por tonelada para R$ 821,90/t.

“Eu não considero que as fotografias tiradas no relatório da EPE mostram que as empresas tiveram uma rentabilidade melhor do que elas tiveram no passado. A rentabilização depende da dinâmica de mercado e da competição do GLP com outros energéticos”, disse Bandeira de Mello.

Ele defende que essa dinâmica não reflete a regulação do setor. A análise da EPE foi feita, após uma iniciativa da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) e faz parte da proposta de reforma da regulação do GLP, retomada esse ano.

“Eu não considero que a precificação melhor das empresas seja resultado da regulação”, disse o executivo.

Ele também afirma os efeitos estão mais ligados a precificação da Petrobras. “Durante muitos anos, a Petrobras artificializou os preços em patamares muito baixos. Talvez tenha oprimido um pouco a formação de preços das empresas”, comentou.

Em 2020, o governo federal reverteu a chamada diferenciação de preços do GLP, uma política em que a Petrobras praticava preços menores para combustível destinado a consumidores domésticos, em botijões de 13 kg.

No mesmo ano, a companhia vendeu a distribuidora Liquigaz, em uma operação que levou ao desmembramento da empresa para as distribuidoras Copagaz, Itaúsa, Nacional Gás Butano (NGB) e Fogás. Em 2018, uma primeira tentativa de venda para o grupo Ultra fracassou, em razão da alta concentração do mercado.

Reforma terá pouco efeito no setor de GLP

Sobre as propostas da ANP para reforma do setor, Bandeira de Mello reconheceu que há barreiras econômicas para entrada de novos competidores, mas afirma que a mudança na regulação terá efeito limitado.

Ele aponta que, no relatório da Análise de Impacto Regulatório (AIR), fica claro o incômodo diante do fato de poucos agentes operarem no setor e o alto nível de concentração no mercado.

“O oligopólio é uma característica desse setor. São setores que são oligopólicos e não tem muito o que se fazer. Várias empresas estão abrindo negócios com o granel, por exemplo, e são empresas regionalizadas. Se elas tentarem ser nacionais, não vão competir em escala com as grandes”, afirmou.

Umas das propostas da ANP é modificar o controle sobre os botijões, dado que as regras atuais vinculam os vasilhames às empresas, levando a uma logística reversa e de destroca. Na análise da agência, a barreira de entrada — necessidade de aquisições de botijões — e os custos na cadeia prejudicam a competição.

A proposta é liberar o enchimento fracionado dos botijões e também de outras marcas, mediante sistemas de rastreio, o que o Bandeira de Mello defende que deve ocorrer antes da reforma. “A inovação deve vir antes da regulação”.

Segundo Bandeira de Mello, o ciclo de embalagens retornáveis deve ser pensado para que o problema não caia na mão do consumidor.

“Um botijão hoje dura 50 anos em circulação. O consumidor que compra uma carga de gás hoje, pode ser que em dois meses aquele botijão não possa mais ser engarrafado. Se o vasilhame é devolvido para o sistema, o problema é da Ultragaz, de requalificar ou sucatear. Se tirarmos isso e pensarmos somente em quem foi o último a engarrafar, pode ser que o problema seja de quem comprou”, explicou.

Enchimento fracionado e rateio no suprimento

Quanto ao enchimento fracionado, o presidente do sindicato defende procedimentos rigorosos que garantam a segurança e ponderou que a mudança implicaria aumento de custos para a ANP, que enfrenta graves problemas orçamentários. “Vai mudar o sistema para aumentar o custo de fiscalização?”, questionou.

Ele também argumenta que, enquanto algumas empresas terão “obrigação de fazer”, outras poderão usufruir da flexibilização. “A gente chamaria isso aí de expropriação regulatória. Eu invisto e o outro usa”.

No que diz respeito ao rateio de GLP em polos deficitários, o presidente do Sindigás disse não ter ainda uma posição consolidada. O presidente da entidade defendeu um modelo no qual a Petrobras deveria acatar o pedido das empresas e aplicar multas caso a compradora não cumpra com a retirada da quantidade solicitada.

“As empresas nos polos deficitários sempre pedem uma quantidade grande do produto e a Petrobras sempre oferece muito menos do que as empresas querem porque a Petrobras não tem. Se uma empresa pede 100 e tira 90, tem que cobrar. Essa sempre foi a solução que a gente indicou para a Petrobras”, frisou.

Liberação para outros usos

O presidente do Sindigás classificou como “extremamente positiva” a possibilidade de liberação do GLP para outros usos, permitindo que o combustível possa ser utilizado em motores, calefação, aquecimento de saunas e piscinas e motores veiculares. O tema faz parte de uma série de propostas colocadas em consulta prévia pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).

Para o executivo, não há mais motivos para restringir o uso do produto, pois não deverá haver aumento significativo de demanda que comprometa o abastecimento nacional.

“A gente sabe que não existe um impacto sobre a formação de preço, pelo contrário, na verdade, quem é o price maker [formador de preços] é a China. Não tem um aumento de demanda que vai mudar a precificação”, avaliou.