NESTA EDIÇÃO. Enquanto China e Europa despontam como promissoras na redução de emissões de CO2 até 2050, emergentes vão ficando para trás na corrida de obstáculos.
Até mesmo os EUA, com a IRA, demonstram dificuldades de acelerar a transição. E um retorno de Trump pode piorar esse cenário.
A conta só aumenta: a Wood Mackenzie estima serem necessários US$ 78 trilhões em investimentos de baixo carbono até 2050 — acima dos US$ 75 trilhões do relatório do ano passado.
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Líderes globais chegarão a Baku, capital do Azerbaijão, a partir de 11 de novembro, com a missão de destravar recursos para combater a crise climática, principal tema da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças do Clima (COP29), mas também precisarão abordar conflitos globais.
Publicada esta semana, uma análise da Wood Mackenzie aponta que choques sucessivos nos mercados internacionais ameaçam descarrilar o progresso e jogar o mundo no caminho dos 3°C – o dobro do 1,5°C apontado como seguro por cientistas.
Uma boa notícia pode vir da China, maior emissora global. Diversas agências e consultorias internacionais têm estimado que o país pode estar perto do seu pico de emissões.
A Woodmac calcula que com as metas de eletrificação, redução do uso de carvão em termelétricas e avanço na fabricação de suprimentos para energia solar e baterias o país asiático pode ter o maior declínio absoluto nas emissões líquidas relacionadas à energia em 2050 – 7,8 bilhões de toneladas a menos que em 2024.
A Europa também aparece com a possibilidade de cortar 2 bilhões de toneladas de carbono no setor de energia, graças ao seu Esquema de Comércio de Emissões (ETS), os PPAs para energia eólica e solar e a política RePowerEU com incentivos para diversificação e renovação da matriz.
Mas o progresso não será tão rápido em outros lugares. Nem mesmo nos Estados Unidos, onde a Lei de Redução da Inflação (IRA, em inglês) está concedendo subsídios bilionários para incentivar a indústria de baixo carbono.
“Com uma colcha de retalhos de regimes de precificação de carbono, infraestrutura nacional permitindo incerteza e a política energética baseada em incentivos do IRA, o capital não está sendo implantado rápido o suficiente para concretizar uma trajetória líquida zero nos Estados Unidos”, avalia o relatório.
Além disso, o país passa por eleições presidenciais, que encerram no dia 5 de novembro, e podem mudar os rumos da política energética e climática do segundo maior emissor de carbono do planeta.
Os desenvolvedores de energia eólica offshore dos EUA, por exemplo, estão preocupados com os impactos de uma vitória do republicano Donald Trump, que prometeu abandonar esse tipo de projeto por meio de uma ordem executiva em seu primeiro dia no cargo.
Trump também tem apoiado abertamente a agenda de produtores de combustíveis fósseis, inclusive com a promessa de revogar regulações ambientais.
Imagine aqui
Se não está fácil para rico, imagine para os países da América Latina, África e Sudeste Asiático.
A Woodmac observa que essas regiões precisam lidar com uma combinação de instabilidade em políticas energéticas e macroeconômicas e desafios de acessibilidade para tecnologias emergentes.
“Para dar suporte a um caminho de zero líquido, as principais alavancas disponíveis por meio da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC) incluem um banco climático global, o lançamento de mercados globais de carbono sob o Artigo 6 do Acordo de Paris e Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) mais ambiciosas em 2025”, recomenda.
US$ 78 trilhões até 2050
O mundo está ficando sem tempo para atingir a meta de emissões líquidas zero até 2050 definida no Acordo de Paris, em 2015.
Com os cientistas alertando que nenhum país grande está no caminho para cumprir os objetivos propostos para 2030, as metas de 2050 vão ficando ainda mais difíceis de alcançar.
A Woodmac estima que o net zero até 2050 exigirá um investimento total de US$ 78 trilhões em upstream, fornecimento de energia, infraestrutura de rede, minerais críticos e tecnologias emergentes — acima dos US$ 75 trilhões do relatório do ano passado.
Significa dobrar o investimento anual em suprimento de energia e infraestrutura de baixo carbono para cerca de US$ 3,5 trilhões.
Neste cenário, a participação de renováveis na matriz elétrica global alcançaria 94%, enquanto os veículos elétricos representariam 91% das vendas de carros novos. Isso é sustentado por um preço de carbono a cerca de US$ 157 a tonelada.
“Não agir de forma rápida e decisiva corre o risco de colocar até mesmo uma meta de 2 ˚C fora de alcance”, alerta o relatório.
Desafios seguem os mesmos
Segurança energética, barreiras comerciais e custos seguem desafiando o avanço de políticas ambiciosas, distribuição de investimentos e até mesmo negociação de acordos internacionais que enderecem a urgência da transformação econômica demandada pela crise climática.
As guerras na Ucrânia e no Oriente Médio são um exemplo de como o sistema energético atual, dominado por petróleo e gás, está vulnerável, aponta a Woodmac.
Ao mesmo tempo, a concentração da cadeia de suprimentos para renováveis na China preocupa Europa e Estados Unidos, que já estão impondo algumas barreiras às importações.
Na análise da consultoria, o mundo precisará depender da fabricação chinesa ou se preparar para pagar um custo mais alto ou atrasar a transição.
E por falar em custo, o relatório conclui que apesar de a demanda de investimento anual ter aumentado para US$ 3,5 trilhões, a determinação de governos e empresas de pressionar avanços na transição enfraqueceu.
“Atrasos na autorização estão aumentando os custos e dificultando o desenvolvimento dos projetos”, aponta.
Cobrimos por aqui
- Mundo depende da bioenergia de emergentes para o net zero
- COP29 se aproxima com impasse sobre financiamento climático
- Emissões globais de energia avançam, mesmo com recordes de renováveis
- Menos de uma a cada cinco empresas está em direção ao zero líquido
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