Diálogos da Transição

África não quer ajuda, quer investimentos em energia

Continente africano tem 600 milhões de pessoas sem eletricidade, mas só recebe 2% dos investimentos globais em energia limpa

Comissária de infraestrutura e energia da União Africana, Amani Abou-Zeid (Foto: Itaipu Binacional)
Comissária de infraestrutura e energia da União Africana, Amani Abou-Zeid (Foto: Itaipu Binacional)

NESTA EDIÇÃO. Lar de 20% da população global, o continente africano recebe apenas 2% dos investimentos em energia limpa – enquanto 600 milhões de pessoas estão desconectadas do sistema elétrico.
 
Brasil propõe coalizão global de planejamento energético para subsidiar estratégias de países africanos.


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Com metade da sua população sem acesso a eletricidade, os países africanos querem um redirecionamento dos investimentos globais em energia para inaugurar uma nova fase econômica no continente e tirar pessoas da pobreza, disse nesta quinta (3/10) a comissária de infraestrutura e energia da União Africana, Amani Abou-Zeid.
 
“Nós queremos transferência tecnológica, fabricação em nosso país. Queremos investimentos. Você não vai me ouvir dizer que queremos ajuda. Não é sobre isso que estamos falando”.
 
Abou-Zeid conversou com jornalistas em Foz do Iguaçu (PR), após uma reunião da União Africana com a delegação brasileira na Clean Energy Ministerial, evento paralelo ao G20 de Transições Energéticas.
 
Na reunião, o ministro brasileiro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, propôs a criação de uma coalizão global para o planejamento energético. A intenção é compartilhar a experiência brasileira em políticas de acesso a energia, como o Luz para Todos, de forma a subsidiar os países da região na formulação de suas estratégias para a transição.
 
“Vamos desenvolver um planejamento técnico que se adapta às necessidades específicas de cada região”, explicou Silveira.

Cerca de 1,3 bilhão de pessoas vivem no continente africano, metade delas – 600 milhões – sem acesso a eletricidade. Significa que essas pessoas não conseguem fazer coisas básicas, como armazenar comida na geladeira, carregar o smartphone, acender uma lâmpada quando fica escuro.

Enquanto o mundo discute carros elétricos, novos combustíveis, hidrogênio verde, ou seja, a segunda onda da transição energética, uma parcela significativa da população mundial ainda nem entrou na primeira.

“Nós vimos aqui no G20, o Brasil também falando sobre o impacto social da falta de energia e nós vemos exatamente dessa forma, a energia como um meio para o fim para reduzir a pobreza e outros problemas sociais”, comentou Abou-Zeid.



Assim como o Brasil, países africanos também têm reservas de minerais para transição energética e despontam como potenciais produtores de hidrogênio verde, dois setores que prometem movimentar uma nova economia global.
 
Mais do que atrair investimentos nessas indústrias, essas nações querem garantir que isso se converta em prosperidade para sua população.
 
Segundo a comissária da União Africana, apenas 2% dos investimentos globais em energia limpa vão para o continente, uma contradição que precisa de ação para colocar em prática os compromissos que são assumidos em COPs e G20s.
 
“A questão da energia renovável é muito importante para a economia local, para as diferentes regiões. Nós podemos usar isso como catalisador para outras questões, criar empregos e valor localmente, com a manufatura de componentes e equipamentos de energia renovável, veículos elétricos e baterias. Brasil e África estão alinhados em questões como a obtenção ética de componentes para veículos elétricos e baterias”.

A superação da pobreza energética é parte da agenda de transição para fontes mais limpas de energia, mas só será abordada adequadamente se houver participação de mulheres nas decisões políticas, disse na quarta (2/10) a secretária executiva do Ministério das Mulheres, Maria Helena Guarezi.
 
“Pobreza energética é um tema importante que todo mundo precisa participar. Mas só pode ser tratado com a qualidade devida se as mulheres estiverem nos processos de participação das decisões. E esse é o grande desafio que estamos colocando aqui no G20”.
 
Para Guarezi, embora a participação feminina em fóruns de discussão política venha aumentando, é preciso dar mais visibilidade.
 
“Que transição energética nós queremos construir sem as mulheres?”, questiona. “Nós, mulheres, somos as que mais sofremos com os desastres climáticos, mas nós também temos soluções que podem ajudar no processo de descarbonização. Temos muitas mulheres no debate, mas elas não estão visibilizadas”.


Pobreza energética. Alexandre Silveira (PSD) e a copresidente da agência UN-Energy da ONU, Damilola Ogunbiyi, acordaram a construção de um pacto global para o combate à pobreza energética no mundo, em especial, nos países africanos. O ministro também acertou a construção de um projeto nos países da África, por meio da EPE, com base no Luz Para Todos.
 
Risco climático. Análise da plataforma de divulgação ambiental CDP revela que há um potencial inexplorado de US$ 165 bilhões em receitas para o setor privado no combate a riscos climáticos da cadeia de suprimentos. Segundo o relatório, empresas que cortaram suas emissões de Escopo 3 economizaram US$ 13,6 bilhões em todo o mundo, sendo US$ 298,18 milhões na América Latina.
 
Bridgetown III. Um novo plano financeiro (.pdf) de 15 pontos da Iniciativa de Bridgetown para ajudar os países em desenvolvimento no enfrentamento à crise climática espera que cerca de US$ 950 bilhões da lacuna de financiamento do clima e da natureza sejam fechados por fontes nacionais. Outros US$ 850 bilhões devem vir de fontes externas. Os bancos de desenvolvimento precisam desbloquear US$ 500 bilhões em empréstimos extras, enquanto impostos e um preço global de carbono também são essenciais para a concretização.
 
UE adia lei antidesmatamento. A Comissão Europeia afirmou nesta quarta-feira (2) que deverá propor um adiamento de um ano na implementação de sua principal política de combate ao desmatamento, atendendo a pedidos de indústrias e países, entre eles o Brasil. (Forbes)
 
Ambientalistas criticam. Para a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), o instrumento seria um mecanismo importante para induzir a redução do desmatamento brasileiro. “No momento em que temos a maior parte do território brasileiro afetada pela fumaça de queimadas em quase todos os biomas, é lamentável que a implementação da EUDR seja adiada”, afirma Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Apib. (Observatório do Clima)
 
Área para gado. Nove em cada 10 hectares desmatados na Amazônia entre 1985 e 2023 abriu lugar para pastagens. Com isso, as áreas de pasto ocupam hoje 14% do bioma, uma área equivalente ao estado de Minas Gerais. O dado consta no estudo sobre ocupação do solo divulgado nesta quinta-feira (3/10) pela rede MapBiomas. (O Globo)
 
Em chamas. Os incêndios em áreas de mata no estado de São Paulo aumentaram nesta quarta-feira (2). De acordo com a Defesa Civil, dez municípios paulistas estão com focos de incêndio ativos na área rural. Nesta terça-feira (1º), os municípios atingidos eram três. (Agência Brasil)