Transição energética no G20

G20: construção de mercado global para SAF requer acordo sobre padrões de sustentabilidade

Pelo menos 43 companhias já se comprometeram a usar cerca de 16,25 bilhões de litros de SAF em 2030, com mais acordos sendo anunciados regularmente

Heloísa Borges, Diretora de Petróleo, Gás e Biocombustíveis da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), e Jane Hupe, diretora do programa ambiental da Organização da Aviação Civil Internacional (Icao, na sigla em inglês), durante evento paralelo da programação da 15ª Clean Energy Ministerial e 9ª Mission Innovation, que acontecem em paralelo à Reunião Ministerial de Energia do G20, em Foz do Iguaçu (PR), em 1-10-2024 (Foto Divulgação G20 Brasil)
Heloísa Borges, Diretora de Petróleo, Gás e Biocombustíveis da EPE, e Jane Hupe, diretora do programa ambiental da Icao, durante evento paralelo da programação da 15ª Clean Energy Ministerial e 9ª Mission Innovation, que acontecem em paralelo à Reunião Ministerial de Energia do G20, em Foz do Iguaçu (PR) | Foto Divulgação G20 Brasil

FOZ DO IGUAÇU (PR) – Se o mundo quiser construir um mercado robusto para os combustíveis sustentáveis de aviação (SAF, em inglês), com capacidade para substituir gradualmente o querosene fóssil, precisa avançar na definição de um padrão internacional, disse na terça (1/10) a diretora de Petróleo, Gás e Biocombustíveis da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Heloísa Borges.

“Para construir um mercado, nós temos de concordar, a nível internacional, sobre as normas. Não só as normas sobre especificação. Temos que falar sobre a contabilidade do carbono”.

Borges participou de um evento paralelo ao encontro ministerial do GT de transições energéticas do G20, que se reúne esta semana com o desafio de chegar a uma declaração de ministros indicando algum acordo em relação aos biocombustíveis.

Na visão da diretora da EPE, a discussão de um acordo em torno da contabilidade de carbono precisa abrir caminhos para que cada país possa, a partir dos seus recursos naturais, suas disponibilidades de feedstocks, proporcionar combustíveis sustentáveis para o mundo.

Para cumprir o compromisso internacional de redução de emissões na aviação (Corsia), o mundo precisa escalar rapidamente a oferta de combustíveis de baixo carbono, o que requer investimentos de US$ 3,2 trilhões globalmente e uma corrida por matérias-primas que atendam padrões de sustentabilidade.

Segundo a Associação Internacional de Transporte Aéreo (Iata), a participação do SAF no mercado global é de apenas 3% de todos os combustíveis renováveis produzidos.

A organização aponta que todo o volume produzido até agora foi comprado e utilizado. Em 2023, o transporte aéreo desembolsou mais de US$ 756 milhões para adquirir o produto e a expectativa é que o fornecimento triplique em 2024, em relação a 2023, chegando a 1,8 bilhão de litros.

Pelo menos 43 companhias já se comprometeram a usar cerca de 16,25 bilhões de litros de SAF em 2030, com mais acordos sendo anunciados regularmente.

“É um grande esforço. Temos que começar agora e estamos fazendo isso no Brasil”, comenta Borges.

Ela cita o Combustível do Futuro, política recém aprovada pelo Congresso brasileiro para incentivar o mercado doméstico, e o estudo recém lançado pela EPE que aponta que é preciso investir em diferentes rotas tecnológicas de produção de SAF, abrindo o leque de matérias-primas, de forma a viabilizar o combustível renovável em escala e a custo competitivo.

O Corsia

Jane Hupe, diretora do programa ambiental da Organização da Aviação Civil Internacional (Icao, na sigla em inglês), explica que o Corsia – lançado em 2020 de forma voluntária, mas passa a ser obrigatório em 2027 – foi a primeira política internacional para o SAF.

“Para fazer isso, nós tivemos que colocar um modelo inteiro em lugar: estes são os padrões. Se você quiser cumprir, você tem que cumprir com estes padrões. Cada avião que voa em voos internacionais, eles têm que reportar para a Icao todos os anos sobre suas emissões de CO2”.

Para compensar suas emissões dentro da política, as companhias aéreas precisam passar por um complexo framework. Essa complexidade, garante Hupe, é o que atesta a sustentabilidade.

“Temos tudo certificado por um esquema de certificação de sustentabilidade. Nós aprovamos esses esquemas na Icao, então, tudo é muito bem controlado”.

Segundo a diretora, o desafio agora é alcançar a escala necessária para atingir o net zero até 2050. A visão da Icao é de que será preciso diversificar ao máximo o parque industrial, rompendo a lógica do refino fóssil, que é concentrado em países produtores de petróleo.

“Nós precisamos das refinarias. O objetivo [do Corsia] tem que vir com a construção de capacidade, financiamento e o framework de política certo”.

No caso da certificação, ela explica que a Icao não define diretamente quais matérias-primas serão utilizadas, elas precisam passar pelo framework.

“É agnóstico no feedstock. Passa ou falha. Se passar, passa. Não passa, não passa. A mesma coisa com os processos. Nós temos 11 processos que foram aprovados. E no final, quando a gota sai, nós certificamos que é sustentável”.

Segundo Hupe, essa “gota sustentável” precisa estar em todos os 193 países do globo.

“Nós queremos o combustível produzido por 193 países. Para isso, estamos fazendo um enorme esforço em construção de capacidade para SAF. Agora nós temos mais de 20 estudos de visibilidade em países emergentes. 20 se tornando 50. Então é um enorme esforço. Mas para nós, SAF tem um significado muito importante. Tem que ser global, tem que ser harmonizado”, completa.