Muitos responderiam ao questionamento do título dizendo que sim, afinal somos autossuficientes em petróleo. A ideia propagada é de que o lucro da produção de petróleo poderia, em parte, ser repassada ao consumidor final. A empresa ficaria com alguma parcela do lucro para reinvestir nas suas atividades. Resolvi esmiuçar alguns números sobre esta questão. Vamos lá.
Avaliando o balanço da Petrobras no seu FORM F 20, documento enviado à SEC nos EUA, tem-se os seguintes números a respeito do E&P em 2018:
- Lucro líquido do E&P: US$ 12,19 bi
- Produção de óleo e gás: 869,8 MMboe/ano
- Lucro líquido/boe: US$ 14,00
Vamos agora supor que a empresa repassasse metade disso em benefício do refino, ou seja, seria dado um desconto de US$ 7/boe ao refinador (US$ 0,08/litro de óleo). Ao câmbio de 4:1, seria R$ 0,32/litro de óleo de desconto. A título de comparação, o ICMS sobre o litro da gasolina em Porto Alegre em março de 2019 foi de R$ 1,26. Os impostos e contribuições Federais foram de R$ 0,65/litro neste mesmo mês.
Se a Petrobrás repassasse os R$ 0,32/litro de desconto para suas refinarias…
…o desconto seria em benefício do diesel e da gasolina apenas? QAV, por exemplo, não?
…como ficariam os refinadores privados (Dax Oil, Riograndense e Refit)?
…como ficariam os importadores?
…que garantias teríamos de que os distribuidores repassariam o desconto aos postos?
…que garantias teríamos de que os postos repassariam o desconto aos consumidores?
…como ficaria o mercado de etanol e biodiesel?
…a Petrobrás importaria combustível sozinha caso a demanda aumentasse?
Vale lembrar que a empresa fez exatamente isso de 2011 a 2014 (figura 1), durante o Governo Dilma, ao não repassar a alta do barril de petróleo ao mercado doméstico. O resultado foi um brutal prejuízo à empresa, da ordem de US$ 30 bilhões de dólares, no referido período com subsídio aos combustíveis, redução da sua capacidade de investimentos com recursos próprios, além de inviabilizar investimentos privados no setor. Ademais, ao subsidiar os fósseis, afundamos o mercado de biocombustíveis no país, entre outras distorções causadas por este tipo de intervenção econômica.
Figura 1 – Lucro líquido da Petrobrás no E&P e refino de 2007 a 2018 (Fonte: Relatório Anuais Petrobras)
Não é plausível que a Petrobras, enquanto empresa que atua em um mercado aberto, deva fazer este tipo de subsídio, mas o Governo Federal poderia fazê-lo, através do lucro recebido (dividendos) da participação acionária que detém na empresa, bem como através dos royalties e participações especiais (recebidos da Petrobras e das outras empresas que atuam no E&P) se este fosse o desejo, de baratear os combustíveis. O que majora o preço final dos combustíveis são os impostos, então a redução da carga tributária seria outra opção bastante efetiva, sem que isso prejudique os agentes de mercado, inclusive a Petrobrás.
A ideia original de que o lucro da produção de petróleo seja, em parte, repassado ao consumidor final é válida, mas deve ser feita pelo Governo Federal e pelos Governos Estaduais, não pela Petrobrás que hoje é só mais um agente na cadeia de óleo e gás. Assim, chegaríamos ao mesmo objetivo, mas com um resultado final muito melhor. E você o que acha? Concorda?
REFERÊNCIAS
Ecoinfo. Posição acionária Petrobras. Disponível em: <http://econoinfo.com.br/governanca-corporativa/posicao-acionaria?codigoCVM=9512>. Acessado em Março de 2019.
Petrobras. Form 20 F. Disponível em: <http://www.investidorpetrobras.com.br/pt/relatorios-anuais/form-20f-0>. Acessado em Março de 2019.
Petrobras. Relato Integrado. Disponível em: <http://www.investidorpetrobras.com.br/pt/relatorios-anuais/relato-integrado>. Acessado em Março de 2019.
Petrobras. Fatos e dados. Disponível em: <http://www.petrobras.com.br/fatos-e-dados/registramos-lucro-liquido-de-r-25-8-bilhoes-em-2018.htm>. Acessado em Março de 2019.
Balanços anuais Petrobras publicados no site de Relacionamento com o investidor.