Conheça o projeto de privatização da Eletrobras que o governo Bolsonaro vai retomar

O Projeto de Lei 9463/2018 foi enviado em janeiro do ano passado para a Câmara dos Deputados

Michel Temer recebe o presidente Jair Bolsonaro no Palácio do Planalto, para cerimônia de transmissão da Faixa Presidencial. Foto: Valter Campanato/Agência Brasil
Michel Temer recebe o presidente Jair Bolsonaro no Palácio do Planalto, para cerimônia de transmissão da Faixa Presidencial. Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

O ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, afirmou nesta quarta-feira (2) que o governo Jair Bolsonaro vai retomar o projeto de capitalização da Eletrobras. A proposta foi modelada no governo Michel Temer para a privatização da estatal. Wilson Ferreira Jr., que será mantido no comando da empresa, entende que a medida é fundamental.

O Projeto de Lei 9463/2018 foi enviado em janeiro do ano passado para a Câmara dos Deputados. Veja quais são seus principais pontos:

Democratização do capital
A proposta prevê a limitação a 10% do poder de voto para qualquer acionista que detenha participação no capital superior a este limite, além de assegurar a vedação a acordo de acionistas que ultrapasse este limite. O governo Michel Temer entendia que essa medida evitava a concentração de mercado e a tomada hostil de controle por outra companhia.

Golden Share
A União teria uma ação de classe especial “golden share” que, entre outros poderes, protege o modelo de corporação e garante a indicação de um membro do Conselho de Administração, além daqueles associados à participação societária da União previstos na Lei das S.A. Com isso, estimava o então governo, a Eletrobras se tornará uma corporação nacional permanente e promotora de eficiência e competição.

Jair Bolsonaro chegou a declarar durante as eleições que poderia estudar a utilização de golden share para a privatização da Petrobras. Depois voltou atrás e afirmou que não pretendia privatizar a empresa. “De acordo com o modelo você pode ser favorável a isso. A questão é ter golden share. E você tem que ver sim para que capital você vai passar aquela empresa. Tem certos países que não admitem a livre iniciativa e estão comprando grande parte do Brasil”, disse o então candidato há uma ano, no programa RedeTV! News, da Rede TV.

Benefícios aos consumidores
A proposta do governo Michel Temer prevê que um terço dos recursos gerados pela descotização das usinas hidrelétricas será destinado para abater encargos tarifários pagos por todos. Os consumidores se beneficiariam, aponta o governo anterior, da queda no custo de transmissão de energia e da maior competição nos leilões de expansão da geração e transmissão.

Desenvolvimento do mercado de energia
O PL também tentava resolver o imbróglio dos riscos do negócio de geração de energia elétrica, especialmente do chamado risco hidrológico. A ideia, de acordo com o governo Temer, era permitir  maior abertura do mercado e promovendo a ampliação da competição no mercado livre, com redução de custos para a produção nacional.

Valorização do patrimônio da União
A União passaria a receber dividendos do resultado econômico da empresa na proporção da sua participação, bem como o incremento da arrecadação tributária decorrente da lucratividade esperada. A operação contribuiria diretamente ao equilíbrio fiscal, pois a empresa deixará de competir com recursos públicos necessários à educação, saúde e segurança, estimava o governo na época.

Fortalecimento do mercado de capitais brasileiro
A criação de uma corporação nacional de capital pulverizado atrairia investimentos de longo prazo, fundamentais para a expansão da infraestrutura de energia nacional, trazendo benefícios à segurança do abastecimento e reduzindo custos para a sociedade, apontavam os cinco ministros na época. Além disso, diziam, a medida fortaleceria a imagem do Brasil no cenário econômico global, melhorando sua competitividade, reduzindo o custo de captação de recursos e criando mais oportunidades de geração de emprego e renda.

Revitalização da Bacia do Rio São Francisco
A proposta estabelecia a obrigatoriedade de ações efetivas para recuperação da mais importante Bacia Hidrográfica do Nordeste brasileiro, que se encontra em situação de grave deterioração, comprometendo a geração de energia e a captação de água para uso humano. A proposta prevê a destinação de R$ 9 bilhões para esse fim durante o período da concessão, uma média de R$ 300 milhões por ano.

O deputado José Carlos Aleluia (DEM/BA) propôs aumentar para R$ 500 milhões anuais os recursos para o projeto de revitalização da Bacia do Rio São Francisco, ao longo de 30 anos. Afirmou que os valores previstos no projeto eram insuficientes frente às necessidades para a revitalização do Rio São Francisco.

O deputado propõe  a criação de uma fundação privada, denominada Fundação de Revitalização do Rio São Francisco (Revita). O relatório inclui ainda, dentre as condições para desestatização da Eletrobras, a destinação, pela Companhia Hidrelétrica do São Francisco (Chesf), da energia elétrica necessária para a operação da transposição do Rio São Francisco.

Itaipu e Eletronuclear
O modelo prevê a manutenção do controle da União sobre Itaipu e Eletronuclear.

HISTÓRICO DO PROJETO

Comissão Especial de Desestatização da Eletrobras (PL 9463/18) – em 16 de maio de 2018. Foto: Cleia Viana/Câmara dos Deputados

O governo enfrentou muita dificuldade para dar andamento ao projeto, sobretudo em uma ano de eleições, em que deputados e senadores são menos afeitos a temas polêmicos. Foram 304 emendas ao texto do PL. Outras 181 emendas ao texto do substitutivo do deputado José Carlos Aleluia (DEM/BA), que relatou a matéria e acabou não sendo reeleito.

E como anda hoje o projeto?
Em julho, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, confirmou em Plenário que a privatização da Eletrobras não seria mais votada no ano passado em um acordo com o governo para conseguir aprovar o projeto que ajustava os contratos de distribuidoras de energia das regiões Norte e Nordeste suscetíveis à privatização (PL 10332/18). O acordo final previa que o texto só seria votado na próxima legislatura, quando tomarão posse os deputados eleitos em outubro deste ano.

“Em homenagem ao acordo que fizemos na semana passada, informo que nosso acordo em relação a não votação do PL da Eletrobras está garantido e será conduzido dessa forma e não votaremos o PL da Eletrobras este ano.”

Energia mais cara
Em abril, a audiência pública da Comissão Especial que trata do projeto de privatização da Eletrobras na Câmara dos Deputados foi marcada por críticas de deputados à iniciativa do governo de vender a estatal responsável por um terço da geração de energia do país. Com a participação majoritária de parlamentares contrários ao projeto, os deputados criticaram o que chamaram de “entrega” do setor energético e a possibilidade de aumento nas contas de energia com a privatização.

“Uma empresa que tem R$ 172 bilhões em ativos, e se se levar em conta o que foi investido ao longo dos anos, a gente está falando em cerca de R$ 400 bilhões investidos, e o governo quer tirar a capacidade do Brasil de acompanhar algo que é de fundamental importância para o povo brasileiro, que é o direito a ter energia barata”, disse o deputado Glauber Braga (Psol-RJ).

O deputado Danilo Cabral (PSB-PE) disse que a privatização vai resultar em aumento na conta de energia elétrica para os consumidores. Cabral mostrou ofício encaminhado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) ao Ministério de Minas e Enegia (MME) em que aponta previsão de um reajuste de mais de 16% nas contas de luz em 2021.

A defesa da proposta foi feita pelo vice-líder do governo na Casa na época, deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS). Segundo ele, a situação da Eletrobras se deveu a erros de gestão dos governos dos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. “Isso é indiscutível, qualquer economista da esquerda e direita afirma isso. Foi um desastre.”