Apesar dos avanços trazidos pela reforma tributária, o mercado de gás natural ainda conviverá com um ambiente de insegurança jurídica até que a regulamentação da reforma seja concluída, avalia o gerente Tributário da Eneva, Bernardo Valois.
“A gente ainda tem muita insegurança jurídica com relação ao que vai vir”, disse Valois, no último dia 18 de abril, ao participar da gas week 2024, durante seminário que aconteceu em Brasília.
Nesta quarta-feira (24/4), o governo enviou ao Congresso o principal projeto de lei complementar de regulamentação da reforma. Ficou definido que o Imposto Seletivo sobre a extração será aplicado sobre o petróleo e o gás, mas o texto zera a alíquota para o gás usado como insumo industrial. Além disso, o PLP insere o gás e o biometano no regime específico de tributação dos combustíveis.
O projeto, contudo, ainda tem um caminho de tramitação no Congresso.
“Mas lógico que, quando a gente olha para o que era o tributário no Brasil antes, acho que a gente evoluiu muito”, ressalvou Valois.
Assista na íntegra ao painel ‘Reforma tributária e desenvolvimento industrial’ | gas week 2024
IBP: Imposto Seletivo fere simplificação tributária
Na visão do gerente-executivo Jurídico e Tributário do Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP), Matias Lopes, a inclusão da extração de óleo e gás no Imposto Seletivo “foge da simplificação e racionalização” que o país busca com a reforma tributária.
Ele alega que a indústria petrolífera já convive, hoje, no Brasil, com uma alta carga de tributos e participações governamentais (royalties e participações especiais), e, mesmo assim, vem sendo alvo de políticas que reforçam o viés arrecadatório.
Lopes cita, como exemplos, a recriação da Taxa de Controle, Monitoramento e Fiscalização das Atividades de Exploração e Produção de Petróleo e Gás (TFPG), no Rio de Janeiro; a instituição temporária do imposto sobre exportações de petróleo cru, pelo governo federal em 2023; e as discussões, na ANP sobre a revisão do preço de referência do petróleo – que pode levar ao aumento do pagamento de royalties pelas petroleiras.
“Todo esse emaranhado de tributações, de imposições estatais, da União, Estados e Municípios, isso tudo faz com que haja uma sensação de insegurança”, comentou.
O desenvolvimento industrial no debate sobre a reforma
A sinalização do governo, de que o gás usado como insumo industrial ficará de fora do IS vem em linha com um dos objetivos do programa Gás para Empregar, de incentivar o consumo do gás natural como matéria-prima nas indústrias de fertilizantes e petroquímica.
Em paralelo à regulamentação da reforma tributária, tramita no Congresso o Profert – que prevê, entre outros incentivos tributários ao setor de fertilizantes, desonerar o gás natural voltado à produção de nitrogenados.
Para a diretora de Estudos para Petróleo e Gás da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Heloísa Borges, a chegada de uma molécula competitiva para a produção de fertilizantes passa, necessariamente, pela redução de custos na cadeia do gás e a sua desoneração.
Em 2023, a EPE publicou um estudo que indica que o preço do gás natural necessário para viabilizar novas fábricas de fertilizantes nitrogenados, no Brasil, pode variar de US$ 3 a US$ 9 o milhão de BTU, a depender das condições do mercado e tamanho do investimento, dentre outros fatores.
“A gente firmemente acredita que, adotando medidas de competitividade, transparência, acelerando alguns processos, a gente consegue chegar com gás nessa faixa, talvez não a US$ 3 o milhão de BTU, mas US$ 9, US$ 7…”, disse Heloísa.
O sócio do Faveret Tepedino Londres & Fraga Advogados, José Roberto Faveret, por sua vez, acredita que viabilizar o uso do gás como matéria-prima passa por “remover todos os custos que são possíveis” ao longo da cadeia – como a isenção de tarifas de distribuição para fafens – e por “soluções mais criativas” no mercado.
“O que eu estou querendo dizer? Um contrato simplesmente de compra e venda de gás talvez não funcione para determinados empreendimentos. Talvez nós tenhamos que trabalhar com contratos em que o preço do gás seja atrelado ao preço do produto final [como os fertilizantes nitrogenados]”, comentou.
Gerente de Cenários Petróleo, Gás, Energias e Naval da Firjan, Fernando Montera, argumenta que, no fim das contas, tudo se resume a uma questão de preço.
“Precisamos de toda a discussão de arcabouço regulatório, de mercado livre, de poder encontrar a molécula, de ter preço, preço, preço, preço, no final das contas”, concluiu.
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