BRASÍLIA — Relatório da Organização Meteorológica Mundial da ONU (OMM) divulgado no domingo (6/10) mostra que os últimos oito anos foram os mais quentes já registrados, alimentados por concentrações cada vez maiores de gases de efeito estufa.
De acordo com o estudo provisório do Estado do Clima Global de 2022, os sinais de emergência climática são “cada vez mais dramáticos”: a taxa de aumento do nível do mar dobrou desde 1993 para um novo recorde este ano; enquanto as geleiras dos Alpes europeus derretem a uma velocidade sem precedentes.
O relatório completo de 2022 deve ser divulgado apenas em 2023, mas o levantamento provisório foi apresentado antes da COP27, a conferência climática da ONU, para dar dimensão da escala dos problemas que os líderes mundiais devem enfrentar.
“Quanto maior o aquecimento, piores os impactos”, disse o chefe da OMM, Petter Taalas, durante o lançamento do documento em Sharm El-Sheikh, no Egito, sede da conferência deste ano.
“Temos níveis tão altos de dióxido de carbono na atmosfera agora que os 1,5ºC do Acordo de Paris mal estão ao alcance. Já é tarde demais para muitas geleiras e o derretimento continuará por centenas, senão milhares de anos, com grandes implicações para a segurança da água”.
Eventos extremos
Em um cenário de níveis recordes de dióxido de carbono, metano e óxido nitroso — os três principais gases de efeito estufa (GEE) que contribuem para o aquecimento global — o documento estima um aumento de cerca de 1,15°C acima dos níveis pré-industriais este ano, com impactos já evidentes.
Ao longo dos Alpes, foi registrada uma perda média de espessura no gelo entre três e quatro metros, enquanto na Suíça, toda a neve derreteu durante a temporada de verão.
Essa foi a primeira vez na história registrada, desde o início do século, que o volume de gelo das geleiras no país caiu mais de um terço.
O crescente derretimento do gelo em todo o mundo levou ao aumento do nível do mar nos últimos 30 anos. Segundo a OMM, a taxa de aquecimento dos oceanos foi excepcionalmente alta nas últimas duas décadas e as ondas de calor marinhas estão se tornando mais frequentes.
Enquanto isso, Quênia, Somália e Etiópia enfrentam quebra de safra e insegurança alimentar, por causa de outra temporada de chuvas abaixo da média. Outro evento extremo de destaque foi a inundação de mais de um terço do Paquistão em julho e agosto, como resultado de chuvas recordes. Quase oito milhões de pessoas precisaram ser deslocadas.
Entre as regiões que menos contribuem para as emissões de GEE e são as mais afetadas, a África Austral — formada por África do Sul, Angola, Botswana, Lesoto, Madagáscar, Malawi, Maurícia e Moçambique — foi atingida por uma série de ciclones ao longo de dois meses no início do ano.
Madagascar foi o país mais fortemente atingido pelas chuvas torrenciais e inundações.
No continente americano, o furacão Ian causou grandes danos e perda de vidas em Cuba e no sudoeste da Flórida, nos EUA, no mês de setembro.
Já na Europa, foram os episódios de calor extremo que deram o tom do que está por vir. O Reino Unido, por exemplo, registrou um novo recorde em 19 de julho, quando a temperatura ultrapassou os 40°C. Isso foi acompanhado por uma seca e incêndios florestais persistentes.
‘Nova era para fazer as coisas diferente’
Foi neste cenário que a COP27 começou neste domingo, no Egito. A missão do encontro é chegar a acordos multilaterais capazes de colocar o mundo no caminho de emissões líquidas zero até meados do século e conseguir limitar o aquecimento do planeta a 1,5ºC até 2100.
“Hoje começa uma nova era – e começamos a fazer as coisas de forma diferente. Paris deu-nos o acordo. Katowice e Glasgow nos deram o plano. Sharm el-Sheik nos desloca para a implementação”, disse Simon Stiell, o novo secretário executivo da Convenção do Clima da ONU (UNFCCC), na abertura da conferência.
O chefe do clima da ONU disse que os líderes — sejam eles presidentes, primeiros-ministros ou CEOs — serão responsabilizados por promessas feitas no ano passado em Glasgow.
“Porque nossas políticas, nossos negócios, nossa infraestrutura, nossas ações, sejam elas pessoais ou públicas, devem estar alinhadas com o Acordo de Paris e com a Convenção [Clima da ONU]”, ressaltou.
A convenção da UNFCCC entrou em vigor em 21 de março de 1994 para evitar interferência humana “perigosa” no sistema climático. Hoje, ratificado por 198 países, tem adesão quase universal. O Acordo de Paris, acordado em 2016, funciona como uma extensão dessa convenção.
Falta consenso sobre perdas e danos
Domingo foi dia de definir os itens da agenda que serão discutidos nas próximas duas semanas na COP27.
‘Perdas e danos’, um item ainda incerto antes da conferência, entrou na agenda depois de ser apresentado por negociadores do Grupo dos 77 e China (que inclui essencialmente todas as nações em desenvolvimento).
O acordo define 2024 como prazo para entregar um plano — um limite muito lento para alguns negociadores.
Como a intensificação desses “desastres naturais” está sendo causada pelo aumento das emissões de gases de efeito estufa, principalmente de países ricos industrializados, os países pobres e emergentes — muitas vezes os mais afetados — argumentam que deveriam receber compensação.
A questão desses pagamentos, conhecidos como “perdas e danos”, agora será um dos principais tópicos de discussão na COP27.
A agência epbr irá cobrir a COP27 entre os dias 7 e 18 de novembro, com transmissões ao vivo, de segunda a sexta, sempre às 14h