Energia

Três passos para a transição energética

André Leite, diretor de Eólicas Offshore da Equinor, e Daniel Elias, CEO da Galp Brasil, contam como as empresas de energia estão enxergando a transição

Três passos para a transição energética. Na imagem: Complexo de Apodi, no Ceará, primeira usina solar da Equinor (Foto: Einar Aslaksen/Equinor)
Complexo de Apodi, no Ceará, primeira usina solar da Equinor (Foto: Einar Aslaksen/Equinor)

“Temos que parar de emitir [carbono], simplesmente. Não é só reduzir. Temos que parar de emitir para conseguir estabilizar e não deixar o planeta ultrapassar os 2 ºC”, alerta André Leite, diretor de Eólicas Offshore da Equinor.

Em junho, a Equinor lançou sua nova estratégia corporativa, com meta de chegar a 2050 com emissões líquidas zero tanto nas operações quanto no óleo e gás produzido.

Para isso, em 2030, metade dos investimentos da companhia serão direcionados para renováveis e soluções de redução de carbono.

A transição para fontes mais limpas carrega também o desafio de universalizar o acesso a energia a uma parte significativa da população mundial.

Daniel Elias, CEO da Galp Brasil, explica que 15% da população consome atualmente dois terços da produção total de energia. 

“Temos que pensar em transição energética que permita melhoria da qualidade de vida aos outros 85% que só consome um terço da energia total”.

Os executivos participaram no dia 8 de dezembro dos Diálogos da Transição promovidos pela agência epbr.

A seguir eles indicam três passos para a transição energética:

1. Entender o problema

Especialistas em clima e meio ambiente alertam para o risco de um aumento da temperatura média na Terra acima dos 2 ºC até 2100, o que levará muitas regiões do planeta à calamidade, podendo varrer do mapa ilhas ou até países inteiros.

O risco ficou claro na última Conferência do Clima da ONU, a COP26. “Será muito tarde para as Maldivas. [Isso] não traz esperança aos nossos corações”, declarou a ministra do meio ambiente das Maldivas, Aminath Shauna.

Em outro discurso emblemático, Simon Kofe, ministro das Relações Exteriores da ilha de Tuvalu, no Pacífico Sul, chamou a atenção ao fazer uma declaração em vídeo, de terno e gravata, com água do mar até os joelhos, para destacar o impacto da mudança climática na nação insular.

Dióxido de carbono e gás metano são os dois principais gases causadores do efeito estufa — por isso a mobilização de esforços para reduzir suas emissões.

Atualmente, as emissões de carbono equivalente na atmosfera do planeta somam 51 bilhões de toneladas, por ano.

Para André Leite, a única medida de fato eficaz seria a interrupção integral dessas emissões, já que o CO2 pode permanecer na atmosfera até 10 mil anos após sua emissão.

Para dar uma dimensão do desafio, ele explica que 31% das emissões de carbono advêm da produção de materiais como cimento, plástico, aço, vidro e papel — presentes em quase tudo que usamos e consumimos.

Os outros 27% vêm do consumo de eletricidade; 19% da agropecuária; 16% dos transportes e 7% de aquecedores e ar-condicionados.

“Tendo essa ideia de proporção de quem são os vilões, e sabendo desse total de 51 bilhões [de toneladas de CO2] podemos medir o que estamos fazendo e a contribuição para o quadro global”, comenta André.

2. Partir para a luta

Para os executivos, o Brasil tem grande potencial para liderar o processo de contenção do aquecimento global. 

“A gente tem tudo para oferecer: florestas a preservar, áreas a reflorestar, sol, vento, área [para produção de energia]”, diz André.

Como exemplo de investimentos em renováveis da Equinor no país, ele destaca o projeto Apodi (CE), que produz energia solar para cerca de 200 mil casas na cidade.

O grupo norueguês tem mais quatro projetos de energia solar em diferentes estágios de maturação para o Nordeste. A meta é ter 4 GW de capacidade a partir de renováveis onshore (solar e eólica) em 2023. 

Além disso, a companhia está licenciando parques eólicos offshore.

As renováveis também estão no portfólio da Galp. A empresa anunciou um investimento em energia solar no país para produção de 600 MW, distribuídos pelo Rio Grande do Norte e Bahia. A projeção é ter cerca de 4 GW na América Latina até 2030.

Internacionalmente, a Galp é pioneira na mobilidade elétrica em Portugal e quer chegar a 2025 com 10 mil pontos de carregamento.

Hidrogênio e amônia verde também estão no radar, associadas a parques de eólicas offshore — mas falta regulação para dar segurança jurídica aos projetos

3. Mudar o paradigma 

“Como sociedade temos que compreender o que significa a transição energética. Como Players, temos que nos adaptar e criar formas de trabalhar para incorporar as necessidades que ela impõe”, comenta Daniel Elias.

Ele lembra que a transição energética já ocorre há muitos anos, mas não necessariamente em direção a fontes mais limpas. 

No início do século passado, o carvão superou a biomassa como fonte primária de energia e, na década de 1960, foi a vez do óleo superar o carvão. 

Ainda assim, não é só a produção de óleo e gás que tem crescido nas últimas décadas — de lá para cá, o volume de produção de carvão triplicou no mundo, diz o CEO da Galp.

Para Daniel, um olhar para essas transições do passado pode ajudar na formulação de respostas para as questões atuais.

As cobranças sociais por novos modelos de produção e consumo também vêm mudando o perfil dos investidores, com impactos diretos nas empresas, conta André.

“As empresas são um reflexo dos seus investidores. Na medida em que a sociedade muda, os investidores mudam e as empresas vão mudar junto com isso.” 

O executivo da Equinor explica que a mudança de paradigma atual significa sair de um modelo de ganhos volumosos em curtos espaços de tempo, para uma lógica mais consistente de lucros, mais lenta e gradual, porém mais sustentável.

Como exemplo, estão os negócios do óleo e gás, cuja remuneração é maior e mais imediata, versus as iniciativas renováveis, cujo lucro é menor, no entanto mais limpo energeticamente.

“As empresas estão saindo de um paradigma imediatista e indo para um modelo de longo prazo”, afirma.