A Comissão Europeia apresentou nesta quarta (2/2) o documento final para incluir projetos de gás natural e energia nuclear na taxonomia de financiamento sustentável da União Europeia (UE).
A proposta, que ainda precisa ser aprovada pelos 27 estados membros e pelo Parlamento Europeu, encontra resistência. Com o voto de vinte deles, a proposta pode ser barrada.
A taxonomia da UE é uma ferramenta que possibilita aos investidores aportar recursos em projetos de transição para uma economia de baixo carbono.
A Comissão Europeia argumenta que a inclusão dessas fontes de energia em critérios “verdes” pode viabilizar o alcance da meta de neutralidade em carbono até 2050, assumida pela UE, já que para isso será imprescindível um enorme investimento privado — cerca de 350 bilhões de euros anualmente na transição energética.
Segundo Mairead McGuinness, Comissária responsável pelos Serviços Financeiros, Estabilidade Financeira e União dos Mercados de Capitais, as atividades de gás e nuclear selecionadas na proposta estão em consonância com os objetivos climáticos da UE de extinção do uso do carvão.
“Estamos estabelecendo condições estritas para ajudar a mobilizar financiamento para apoiar essa transição, longe de fontes de energia mais nocivas como o carvão. E estamos aumentando a transparência do mercado para que os investidores possam identificar facilmente as atividades de gás e nuclear em qualquer decisão de investimento”, completou.
A nova taxonomia prevê que as plantas de gás poderiam ser consideradas verdes se, até 2035, migrassem suas atividades para gases de baixo carbono ou renováveis, como biomassa ou hidrogênio verde.
Já no caso das usinas nucleares, seriam consideradas verdes, se conseguissem descartar com segurança os resíduos radioativos — o que hoje ainda não é uma realidade.
Críticos chamam proposta de greenwashing
Para ser rejeitada, a proposta precisa ser barrada por pelo menos 20 países, ou ser derrubada pela maioria no Parlamento. Entretanto, até agora, apenas Luxemburgo, Áustria, Espanha e Dinamarca se opuseram completamente ao projeto.
A proposta de taxonomia da Comissão Europeia ainda precisará ser analisada pelos 27 estados membros da UE e pelo Parlamento Europeu, em até quatro meses. Caso aprovada — e tudo indica que será — a medida vai entrar em vigor a partir de 1 de janeiro de 2023.
“Luxemburgo reafirma veementemente a sua oposição à inclusão do gás e nuclear na decisão da Comissão Europeia sobre a Taxonomia da UE para o financiamento ‘sustentável’. Consideraremos outras medidas legais juntamente com a Áustria”, ameaçou o ministro de Energia de Luxemburgo, Claude Turmes.
Para Leonore Gewessler, Ministra de Energia e Ação Climática da Áustria, a “decisão está errada”.
“A Comissão da UE concordou hoje com seu programa de greenwashing para energia nuclear e gás natural”, criticou.
No caso da Alemanha, há um dilema, uma vez que o país é extremamente dependente do gás natural para a transição energética, depois de implementar o fechamento de todas as suas usinas nucleares.
Em dezembro, a ministra alemã do Meio Ambiente, Steffi Lemke, chamou a proposta de “errada”, mas dirigiu críticas especificamente à energia nuclear, que, segundo ela, poderia levar a desastres ambientais e grandes quantidades de resíduos nucleares.
O vice-chanceler da Alemanha, Robert Habeck, também fez duras críticas ao plano, classificando-o como greenwashing.
Segundo ele, medidas como essa apresentada pela Comissão “enfraquecem o bom rótulo de sustentabilidade”. Além disso, Habeck questionou “se este greenwashing terá aceitação no mercado financeiro”.
Holanda e Dinamarca também fizeram críticas voltadas apenas à inclusão do gás natural no rótulo verde.
Defensores destacam papel da nuclear na transição
Entre os maiores apoiadores da proposta está a França, que vem apostando na expansão da capacidade nuclear do país para alcançar a neutralidade de carbono. Hoje, 70% da energia do país é proveniente de usinas nucleares.
Em dezembro, o ministro francês de assuntos europeus, Clément Beaune, disse ao The Guardian que a proposta era boa em um nível técnico e que a UE não poderia alcançar sua meta de neutralidade de carbono até 2050 sem a energia nuclear.
Um mês antes, o presidente francês Emmanuel Macron havia anunciado a construção de novos reatores nucleares para diminuir a dependência de países estrangeiros no abastecimento de energia e cumprir as metas contra o aquecimento global.
Fazem coro ao governo francês, Polônia, Hungria, República Tcheca, Bulgária, Eslováquia e Finlândia, que também defendem a inclusão das nucleares na Taxonomia.