RIO — Estudo inédito feito pela consultoria Catavento, em parceria com o Instituto Clima e Sociedade (iCS) e o Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP), propõe uma abordagem multicritério para avaliar a continuidade da exploração de petróleo e gás no cenário de transição energética.
A análise sugere que o abandono das atividades de extração não deve ser guiado apenas pela renda dos países, mas sim por fatores como competitividade de custo, pegada de carbono e segurança energética.
Clarissa Lins, CEO da Catavento e ex-presidente do IBP, destaca que, mesmo com a meta global de reduzir as emissões de carbono, ainda haverá uma demanda significativa por petróleo e gás até 2050.
Nos cenários analisados, essa demanda pode variar de 25 a 70 milhões de barris por dia, dependendo da intensidade dos esforços de descarbonização.
Considerando um abandono gradual do petróleo, “o mundo deveria consumir o óleo que seja mais custo-competitivo, com menor break-even e menor intensidade de emissões”, aponta Lins.
Nesse contexto, países ricos como Noruega e Estados Unidos, e grandes produtores como Arábia Saudita, Emirados Árabes, além do Brasil, teriam vantagens competitivas e poderiam ter um prazo maior para exploração de novas reservas.
É um contraponto ao debate global que defende que essa permissão para seguir explorando óleo e gás deveria privilegiar países de renda baixa, sob a justificativa que isso poderia desenvolver suas economias.
No entanto, Lins alerta que a renda per capita não deve ser o único critério para decidir quais países podem continuar explorando petróleo, sob o risco de incentivar a produção de fósseis mais poluentes.
“O critério passa a ser da eficiência, daquele petróleo que é mais eficiente para uma sociedade que ainda o consome (…) Esse olhar binário de que os ricos saem e os menos ricos ficam, pode ser uma solução subótima do ponto de vista de clima”, avalia.
Transição sem choques
A CEO da Catavento participou, na terça (12/11) dos Diálogos da Transição 2024, promovido pela agência eixos, e reiterou que o mundo ainda depende de combustíveis fósseis para atender à crescente demanda por energia, que atualmente é suprida em cerca de 80% por petróleo, gás e carvão. (Assista no Youtube)
Ela avalia que para que a transição seja feita de forma segura, ordenada e justa, deve haver um casamento entre oferta e demanda.
“Oferta e demanda têm que andar juntas nessa transição, sob pena de se criar disrupções, de levar ao aumento de preço e volatilidade nesses mercados e, eventualmente, até perder o apoio da sociedade para a transição”.
Neste sentido, o custo da transição é um grande desafio. Para acelerar a adoção de tecnologias de baixo carbono, como o hidrogênio verde, na escala necessária para substituição dos fósseis, será necessário um papel mais ativo dos governos, destaca.
Isso inclui o uso de políticas públicas que estimulem a demanda, como mandatos para combustíveis sustentáveis, e mecanismos de preço para emissões de carbono.
“Hoje, o grande elefante na sala é o custo da transição, quem paga por isso?”, questiona.
“É uma calibragem fina, muito sutil. Mas que passa por sinais de preço e políticas públicas que estimulam, nesse estágio inicial, a tecnologia de mais baixo carbono”.
Segundo Clarissa, não é possível uma transição rápida demais e que seja custosa a ponto de a sociedade não conseguir acompanhar.
Agenda brasileira no G20
Um dos caminhos mais graduais para essa transição são os biocombustíveis, que estão na agenda encabeçada pelo Brasil na presidência rotativa do G20, e deverá constar na cúpula de líderes na próxima semana, no Rio de Janeiro.
O país tem defendido a inclusão de biocombustíveis como uma solução competitiva e imediata para a descarbonização.
Para Lins, essa foi uma vitória diplomática importante, mas o desafio agora é consolidar essa posição, que precisa ser referendada pelos líderes dos países membros do grupo.
“Há uma barreira a vencer, especialmente na Europa, que ainda vê biocombustíveis como competidores pelo uso da terra”.
No entanto, a executiva acredita que o Brasil pode influenciar padrões globais de sustentabilidade e assegurar financiamentos para soluções de baixo carbono de aplicação imediata.
“Combustíveis sustentáveis são parte das rotas tecnológicas de descarbonização, com a grande vantagem de serem drop-in, o que significa que eles podem substituir o combustível fóssil hoje utilizado e, em muitos casos, utilizando a mesma infraestrutura. E, portanto, com um custo de necessidade de adaptação muito menor”.