Internacional

Projetos de CCUS são adiados por falta de financiamento 

Dinheiro é o principal entrave para cerca de metade das iniciativas de captura, armazenamento e uso de carbono no mundo, segundo levantamento da Rystad Energy

Falhas na captura de carbono colocam em xeque solução para o clima. Na imagem: Corredor entre estruturas de tubulações, transparentes, à esquerda, e verdes, à direita, em projeto de captura de carbono (Foto: Divulgação Zurich)
O IEEFA destaca que quase 90% da capacidade de CCS em larga escala proposta no setor de energia falhou na implementação ou foi suspensa antecipadamente (Foto: Divulgação Zurich)

As restrições econômicas e financeiras são a principal razão para os atrasos e cancelamentos dos projetos de captura, armazenamento e uso de carbono (CCUS) pelo mundo. Essa é a causa para os adiamentos de 49% dos empreendimentos. Atualmente, são 385 projetos em desenvolvimento, que devem entrar em operação até 2030. 

Os dados foram apresentados pela vice-presidente de Supply Chain da Rystad Energy, Thais Vachala, durante evento promovido pela Innovation Norway e pela Norwep (Norwegian Energy Partners), na segunda (23/10). 

“Quando vemos no passado o que aconteceu com os projetos de CCS, vemos que a maior parte deles atrasou ou foi adiada ou foi cancelada. Vemos que a razão para isso foi principalmente por razões financeiras e econômicas. Então, mesmo nesse cenário, ainda temos problemas de financiamento com muitos desses projetos”, disse a executiva.

Segundo a Rystad, cerca de um terço de todos os projetos em fase de planejamento ou de pré-desenvolvimento na América do Norte e Europa devem enfrentar atrasos. Hoje as regiões concentram 42% e 32%, respectivamente, dos novos projetos de CCUS anunciados no mundo.

Até 2030, Europa e América do Norte devem responder por 450 milhões de toneladas de C02 capturado por ano, 80% do total global projetado de 550 milhões de toneladas por ano. 

Investimento em CCS ainda é pequeno

Para Clarissa Lins, sócia da consultoria Catavento, o mundo está atrasado em termos de alocação financeira para projetos de CCUS.

“Até agora, o CCUS representa apenas menos de 0,5 % do investimento global em energia limpa e tecnologia eficiente. É uma parte muito pequena do que precisamos de investir”, pontua.

Ela lembra que no cenário de zero emissões da Agência Internacional de Energia, a capacidade de CCUS até 2030 deveria ser de 1,2 gigatoneladas — mais que o dobro atualmente em desenvolvimento. 

Um dos caminhos para financiar e escalar os projetos, na avaliação de Clarissa, é a formulação de políticas de incentivos, a exemplo do IRA nos Estados Unidos e do sistema de licenças de emissões de carbono da União Europeia. 

“Como ainda não estamos na fase de viabilidade comercial, contamos sim com políticas públicas. Por isso que tem uma concentração enorme de projetos na Europa, onde temos sim um comércio de carbono equipe, e nos Estados Unidos, onde a Lei de Redução da Inflação acaba de completar um ano”. 

Nos EUA, ela lembra que os créditos fiscais podem chegar a 92% se o CCS for aplicado a aplicações industriais, e para 80% quando o CCS é aplicado em centrais elétricas. 

“Então, basicamente, você está recebendo toda a diferença de custo necessária para financiar o projeto”, diz. 

Projeto de CCS norueguês 

Para a vice-presidente da Equinor do Brasil, Claudia Brun, “o financiamento destes projetos é um problema”. 

Ela cita a importância da participação do governo da Noruega na viabilização do projeto de CCS da Northern Lights, um dos componentes do Longship, o projeto de captura e armazenamento de carbono em grande escala do governo norueguês

O projeto, encabeçado pela Equinor, em conjunto com a Shell e TotalEnergies, prevê a construção de uma infraestrutura de transporte de CO₂ dos locais de captura — em polos industriais — até seu armazenamento permanente, feito em um reservatório a 2.600 metros abaixo do leito marinho.

“A Northern Lights não seria uma realidade se o governo norueguês não financiasse 80% do investimento (…) É um custo muito alto. Dito isso, os impostos sobre carbono também têm um fator importante”, explica Cláudia, também defendendo o mercado de carbono como instrumento de financiamento. 

Regulação da captura no Brasil 

Para Alex Imperial, vice-presidente da DNV Brasil, parcerias público-privadas, como o Northern Lights, em um modelo de partilha de risco em hubs de CCS, poderiam viabilizar a parte financeira do projeto.

“Os Hubs de CCS são um modelo de negócio muito promissor porque permite que os participantes posteriores entrem no projeto partilhando infraestruturas, trazendo mais capital, e partilhando riscos, e aumentando efetivamente a capacidade e as economias de escala, o que trará o preço para baixo”, afirma. 

Imperial destaca que, ao contrário da Noruega, a situação fiscal do Brasil não permite ao país necessariamente apoiar financeiramente projetos de CSS, mas uma regulação clara já poderia destravar investimentos. 

“Precisamos de regulamentos em vigor. Precisamos de uma política em vigor. Precisamos de uma definição clara de funções e responsabilidades.  (…) Um quadro regulatório criará o ambiente de negócios, as condições mínimas para realmente reduzir as incertezas e atrair mais investimento estrangeiro”. 

Um dos projetos de regulação de CCS no Brasil é o Projeto de Lei (PL) 1425/2022, apresentado pelo ex-senador pelo PT e atual presidente da Petrobras Jean Paul Prates, e que trata a atividade econômica de armazenamento de dióxido de carbono (CO2) como de interesse público. 

Entre outros pontos, o texto prevê que:

  • As atividades de armazenamento permanente serão exercidas mediante simples termo de outorga do governo federal para exploração dos reservatórios geológicos.
  • As outorgas terão prazo de 30 anos, prorrogável por igual período.
  • Agentes com projetos já desenvolvidos e com capacidade de descarbonizar suas atividades têm preferência de acesso à infraestrutura de armazenamento.

O tema também está previsto no Combustível do Futuro, programa do Ministério de Minas e Energia (MME) que será enviado à Câmara dos Deputados nesse segundo semestre. A minuta está em discussão no governo.

“Estamos acompanhando todas as discussões sobre esses projetos de lei e já estamos planejando nossa regulamentação para mudar para a opção que a política pública seguirá”, diz Alexandre Maciel Kosmalski, assessor na Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). 

“No meu ponto de vista, hoje em dia o ministério (Minas e Energia) têm mais tendência a esse projeto de lei, que usa o modelo de autorização”, avalia Kosmalski.