Nordeste depois

Hubs industriais verdes devem começar pelo Sudeste, indica mapeamento

Indústrias e infraestrutura já existentes, além de futuros projetos de hidrogênio, fazem da região a mais bem posicionada

Refinaria Presidente Bernardes (RPBC), em Cubatão, em São Paulo (Foto Agência Petrobras)
Refinaria Presidente Bernardes (RPBC), em Cubatão, em São Paulo (Foto Agência Petrobras)

RIO — A neoindustrialização verde, vista como uma oportunidade para alavancar a economia de estados do Nordeste brasileiro, tende a manter o modelo atual de concentração industrial no Sudeste, pelo menos em uma primeira fase, mostra a Plataforma Interativa de Descarbonização (PID), desenvolvida pelo Instituto E+ Transição Energética.

O resultado da primeira versão da plataforma indica que os estados do Sudeste — Espírito Santo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo — despontam como os principais candidatos a se tornarem polos industriais de baixo carbono no Brasil. No Nordeste, aparece apenas o Ceará.

Desenvolvida em parceria com o Net Zero Industrial Policy Lab, da Universidade Johns Hopkins (EUA), a PID mapeou as regiões e setores com potencial para cadeias produtivas limpas, integrando dados sobre infraestrutura, recursos energéticos, emissões e atividades industriais.

Leva em conta o adensamento industrial já existente, além de infraestrutura pronta para escoamento de produtos, conexão energética e futuros projetos de hidrogênio.

Em entrevista à agência eixos, Marina Almeida, especialista em transição energética do Instituto E+, explica que conceito dos hubs foi construído a partir de uma análise inédita e detalhada da localização das indústrias brasileiras.

“Esses hubs são fruto de uma análise que considera a distribuição de plantas industriais no país, bem como a identificação das indústrias mais energointensivas, as mais estratégicas para descarbonizar, porque são as mais emissoras”, conta Almeida. 

A partir desses dados, o instituto cruzou informações sobre a infraestrutura de produção e uso de hidrogênio de baixo carbono com a concentração de indústrias que poderiam adotar o insumo para descarbonizar suas operações.

“Superposicionamos essas informações e vimos que, em algumas regiões, há tanto essa produção de hidrogênio quanto um grupo de indústrias que poderia utilizá-lo para descarbonizar. E então criamos esse conceito de hub”, diz.

Segundo a especialista, a concentração industrial permite que a infraestrutura possa ser compartilhada, o que reduziria custos de produção e transporte do hidrogênio.

Sudeste tem indústria consolidada e infraestrutura pronta

O Espírito Santo, por exemplo, abriga importantes plantas de mineração e siderurgia, além de portos estratégicos como Vitória e Tubarão, que podem favorecer exportações de insumos verdes.

Em Minas Gerais, a forte presença de siderúrgicas e metalúrgicas, somada à oferta de biomassa proveniente da agroindústria e de resíduos florestais, cria um ecossistema fértil para a descarbonização.

O Rio de Janeiro destaca-se pela infraestrutura portuária e pelos centros de pesquisa — como a UFRJ e a Petrobras.

São Paulo, o estado mais industrializado do país, reúne vários fatores para se tornar um hub verde, com ampla base tecnológica, universidades, diversidade de setores produtivos e grande potencial de geração de energéticos limpos, como biogás, biometano, biomassa e hidrogênio.

Fora do Sudeste, o Ceará é o único estado nordestino incluído entre os potenciais hubs graças ao Complexo do Pecém, que combina indústrias, projetos de hidrogênio verde e infraestrutura portuária.

A abundância de energia solar e eólica, somada à articulação público-privada e aos incentivos estaduais, são outros fatores que demonstram a vocação do estado para a transição energética.

Outros polos do Nordeste, como o Porto de Suape, em Pernambuco, e estados como Piauí e Rio Grande do Norte, devem aparecer nas próximas versões da plataforma, à medida que novos projetos industriais e energéticos forem incluídos.

“Queremos que a PID seja uma ferramenta bem atualizada. Então nessa primeira versão, o foco foi mostrar o que a gente já tem e o que é mais possível. Porque se eu tenho uma indústria já instalada, o custo é só da infraestrutura”, explica Almeida.

Atração de indústrias globais

Mais do que descarbonizar a indústria existente, os hubs identificados pela PID consideram que o Brasil pode ser um destino competitivo para realocação de indústrias globais que buscam operar com energia limpa, movimento conhecido como powershoring.

“Isso traz um grande potencial de desenvolvimento para o Brasil. Quando você instala uma planta de produção de hidrogênio e cria infraestrutura, você precisa de diversos outros processos que acabam contribuindo para o desenvolvimento”, observa Almeida.

“A partir da disponibilidade de energia renovável, a gente consegue produzir o insumo industrial descarbonizado e com preço mais baixo. Então, a gente consegue atender a demanda global”, afirma.

Política industrial e COP30

Além de orientar investidores e desenvolvedores de projetos, a PID também foi pensada como uma ferramenta para governos, ajudando a identificar gargalos de infraestrutura e áreas prioritárias para investimento público.

“A PID é uma ferramenta que foi criada para ajudar diversos stakeholders e mostrar para o governo onde é preciso trabalhar a infraestrutura, por exemplo”, diz a especialista..

A nova versão da plataforma, com integração de novas fontes energéticas — como biogás, biometano, carvão vegetal e outros bioinsumos — será apresentada durante a COP30, em Belém.

“É importante, num evento que vai ser no Brasil, a gente mostrar todas as nossas opções, principalmente para os investidores”, conclui Almeida.

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