Política energética

Entenda o que é a Emenda de Kigali promulgada pelo Brasil e qual o seu impacto

País terá até 2024 para se adequar ao novo teto de consumo de gases HFCs, presentes em aparelhos como condicionadores de ar

Governo federal promulga Emenda de Kigali; entenda o que isso significa. Na imagem: Foto de edifício com seis janelas e ar-condicionado embaixo de cada uma delas (Foto: Pixabay)
(Foto: Pixabay)

A Emenda de Kigali ao Protocolo de Montreal foi promulgada pelo governo brasileiro nesta quinta (24/8), com a publicação do Decreto 11.666, assinado pelo vice-presidente da República, Geraldo Alckmin.

Firmado em 2016, o acordo internacional altera o Protocolo de Montreal para incluir metas de redução de uso dos gases hidrofluorcarbonos (HFCs), que são utilizados há décadas como alternativa a outras substâncias que destroem a camada de ozônio.

A ratificação brasileira ao tratado foi aprovada em julho de 2022 pelo Senado Federal, depois de ficar parada no Congresso por cerca de quatro anos.

Entenda a seguir:

  • O que diz a Emenda de Kigali
  • O que o Brasil terá que fazer?
  • Por que reduzir os HFCs?
  • O que o Brasil ganha com isso?
  • Quem apoia

O que diz a Emenda de Kigali

A Emenda de Kigali inclui os HFCs na lista de substâncias controladas pelo Protocolo de Montreal, causadoras do efeito estufa e presentes em aparelhos como os condicionadores de ar.

Foi aprovada pelo Brasil e por mais de 170 países em outubro de 2016, durante a 28ª Reunião das Partes ocorrida em Kigali, capital de Ruanda, país da África Oriental.

O principal objetivo é reduzir entre 80 e 85% a produção e o consumo dos HFCs até 2045.

O que o Brasil terá que fazer?

De acordo com o texto ratificado, o país tem até 2024 para se adequar ao novo teto de consumo dos HFCs. A meta é atender ao mercado brasileiro de fluidos refrigerantes sem aumento da média das importações entre 2020 e 2022. Esse congelamento permanecerá até 2028.

As demais metas são reduzir em 10%, 30%, 50% e 80% a importação e o consumo desses gases em 2029, 2035, 2040 e 2045, respectivamente, em relação a esse teto. Se o país não cumprir suas metas, o uso dos recursos pode ser suspenso ou até cancelado.

Por que reduzir os HFCs?

Tais gases, para os quais já há alternativas para a indústria, podem provocar o aquecimento global com potência até 12 mil vezes maior do que o CO2. Além de utilizados em condicionadores de ar, esses gases também podem estar presentes em refrigeradores, freezers, isolantes térmicos, aerossóis, solventes e retardantes de chama, explica a Rede Kigali, formada por organizações da sociedade civil brasileira.

De acordo com o grupo, a medida, já colocada em prática por mais de 150 países, ajudará o Brasil a contribuir de forma significativa para a redução do aquecimento global no planeta.

E o cumprimento por todos os países signatários evitaria um aumento de 0,4 a 0,5 °C na temperatura média do planeta em 2100, um grande potencial comparado aos 1,5 °C do Acordo de Paris.

  • Dados da ONU mostram que as emissões dos HFCs vêm aumentando globalmente em torno de 8% ao ano, podendo responder por até 19% das emissões de gases de efeito estufa em 2053.
  • Sem a Emenda de Kigali, a contribuição do HFC para o aquecimento global poderia por si só provocar um aumento médio da temperatura de aproximadamente 0,5°C.
  • O gás é usado como fluido refrigerante no setor de refrigeração e climatização e também em alguns produtos aerossóis.

O que o Brasil ganha com isso?

Ainda segundo estimativas da Rede Kigali, ao ratificar o acordo, o Brasil passará a ter acesso a um valor estimado de US$ 100 milhões, a fundo perdido, do Fundo Multilateral do Protocolo de Montreal, destinado para a adequação de fábricas, geração de empregos e capacitação da mão de obra.

Para isso, o país precisará elaborar um Plano de Ação para Redução de HFCs, estabelecendo os setores prioritários, metas e alocação dos recursos.

Outro ponto diz respeito aos consumidores.

O grupo formado pelo Instituto Clima e Sociedade (iCS), IEI Brasil, Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Projeto Hospitais Saudáveis (PHS) e Clasp afirma que o avanço tecnológico e a normatização vão evitar que o mercado consumidor brasileiro se torne destino de aparelhos obsoletos, de baixa eficiência energética e poluentes.

Além disso, a adoção de equipamentos com fluidos refrigerantes que atendem à Emenda resultaria em economia de R$ 57 bilhões no país até 2035, por meio da eficiência energética.

“A mudança pode evitar ainda a necessidade de se investir 4,5 GW de novas usinas para operação no horário de pico no período considerado, o que significa mais do que toda a capacidade instalada de termelétricas a óleo combustível existentes no país”, diz o estudo.

Indústria apoia a iniciativa

Entidades empresariais, como a Associação Brasileira de Refrigeração, Ar-condicionado, Ventilação e Aquecimento (Abrava), a Câmara Americana de Comércio para o Brasil (Amcham Brasil), a Confederação Nacional da Indústria (CNI), a Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos (Eletros) e o Sindicato das Indústrias de Refrigeração, Aquecimento e Tratamento de Ar no Estado de São Paulo (Sindratar-SP) se uniram para destravar a tramitação da Emenda na Câmara dos Deputados e no Senado Federal e para sensibilizar o Poder Executivo.

“O apoio das entidades empresariais foi fundamental para mostrar a face industrial e econômica de um tratado que é equivocadamente visto apenas como ambiental”, diz Rodolfo Gomes, coordenador da Rede Kigali e diretor-executivo do IEI Brasil.