O cônsul-geral britânico no Rio de Janeiro, Anjoum Noorani, fez um alerta ao governo brasileiro em relação à demora na regulamentação da lei das eólicas offshore.
Segundo ele, empresas do Reino Unido interessadas em investir em energia eólica offshore no país podem redirecionar seus aportes para outras regiões do mundo caso o Brasil não avance rapidamente com a regulamentação do setor.
Em entrevista ao estúdio eixos, durante o Energy Summit 2025, Noorani afirmou que, apesar de o marco legal das eólicas offshore ter sido aprovado — com a derrubada de vetos presidenciais pelo Congresso —, ainda falta definição de regras claras para a realização dos leilões de áreas.
“O Brasil é super atraente, só que o Brasil deve aproveitar esse momento para passar toda a legislação”, comentou.
Para o cônsul, o Brasil deve ter cuidado para não tornar “o perfeito inimigo do bom” em sua legislação.
O Reino Unido é um dos pioneiros globais em geração eólica no mar, com décadas de experiência no Mar do Norte. Noorani destacou que empresas que atuam por lá estão prontas para aportar no Brasil, mas esperam agilidade nas próximas etapas da regulamentação.
“Tem um monte de empresas britânicas com experiência no Reino Unido e que querem investir na produção dessa energia, gerando emprego e renda”, pontuou.
“É importante começar com os leilões, e daí aprender a partir da experiência e melhorar. Você nunca vai ter essa legislação perfeita pela primeira vez. Mas é melhor começar, aprender, melhorar, do que nunca começar”, completou.
Hidrogênio, SAF e “agnosticismo” tecnológico
O cônsul também chamou a atenção para a competição entre países quando o assunto é atração de investimentos para a indústria nascente de hidrogênio de baixo carbono, defendendo celeridade também no caso de regulamentação do marco legal do hidrogênio.
“Eu não quero que o Brasil perca essa vantagem natural”, disse Noorami, listando a grande disponibilidade de sol, vento e água no país como fatores capazes de garantir a competitividade da produção do hidrogênio verde.
“O Brasil é o potencial super líder no hidrogênio limpo do futuro. Só que tem outros países que também estão buscando ser isso. A própria Arábia Saudita, por exemplo, fala bastante em produzir hidrogênio”, ressaltou.
O diplomata enxerga que a indústria de hidrogênio deve se desenvolver a partir de diferentes rotas de produção, uma visão que é compartilhada entre as estratégias para o hidrogênio adotadas pelo Brasil e Reino Unido.
“Temos que respeitar o agnosticismo da tecnologia. […] O papel do governo é definir os padrões e deixar essa criatividade imensa do mercado, dos inovadores e dos pesquisadores a pensar qual é a melhor rota”.
O Reino Unido, segundo ele, aposta em diversas tecnologias, incluindo o uso de gás natural com captura e armazenamento de carbono (CCS), enquanto o Brasil tem rotas próprias, como o hidrogênio derivado do etanol.
Noorani vê espaço para complementariedade entre as rotas de produção.
“Vamos deixar o mercado decidir”, resumiu.
Em setores de difícil descarbonização, como a aviação e o transporte marítimo, Noorani também defendeu o uso de diversas alternativas, de acordo com os potenciais de cada país, o que poderia incluir os biocombustíveis no caso brasileiro, para a produção de combustíveis sustentáveis de aviação (SAF).
Hoje, as regras do Corsia, um acordo global para reduzir e compensar as emissões de CO2 provenientes de voos internacionais, impede a utilização de biocombustíveis de primeira geração, como etanol e biodiesel.
Segundo Noorami, o foco das políticas públicas deve estar na redução das emissões de carbono.
“Para mim, também, a coisa mais importante é tentar evitar ditar demais qual é a rota de produção. Devemos focar mais na redução das emissões”.
COP30 e financiamento climático
A cooperação entre Brasil e Reino Unido deve se aprofundar até a COP30, marcada para novembro, em Belém.
Noorani afirmou que os dois países compartilham uma “agenda muito em comum” na transição energética, além de parcerias na proteção de florestas. Mas segundo ele, o ponto-chave da conferência será o financiamento climático.
O cônsul reconhece o foco nas promessas da COP29 — como os US$ 1,3 trilhão anuais que países ricos se comprometeram para os mais vulneráveis —, mas defende que o setor privado também deve fazer parte da equação.
“Para conseguir o mundo que a gente quer, a gente precisa de mais fundos privados”, disse, apontando a City de Londres — um dos principais centros financeiros do mundo — como um dos importantes atores nesse processo.
“A City de Londres tem um grande capital que pode ser investido nos projetos mundialmente, inclusive nesses países [em desenvolvimento]”.
O diplomata britânico acredita que a criação de modelos de negócios atraentes em países em desenvolvimento podem viabilizar a chegada de investimento privado internacional.
No Brasil, e especialmente no Nordeste, ele acredita que a criação de hubs de produção de hidrogênio verde e derivados, como aço verde e fertilizantes sustentáveis, é um bom exemplo disso.
“Temos um monte de possibilidades de atrair investimento, inclusive capital público e privado, para lugares como o Pecém e Suape. Como a gente faz isso? A gente cria hubs, clusters de trabalho, que vão atrair tanto esse investimento público e privado”, concluiu.