newsletter
Diálogos da Transição
APRESENTADA POR
Editada por Nayara Machado
[email protected]
O ministro brasileiro da Fazenda, Fernando Haddad, levou a Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, seu plano de transformação ecológica, como uma sinalização de que o Brasil está alinhado com a agenda de descarbonização de grandes economias como Estados Unidos, União Europeia e China – mas também uma estratégia de atrair os recursos que vão financiar essa transição.
Um dos pilares do plano é a mobilização de investimento estrangeiro direto, principalmente de longo prazo – justamente a grande dificuldade de países de renda média e baixa, o Brasil incluído.
São cerca de 100 ações, entre elas, mercado regulado de carbono (em discussão na Câmara), emissão de títulos soberanos sustentáveis, taxonomia sustentável e revisão do Fundo Clima.
“Essas iniciativas visam criar condições para uma nova onda de investimentos que terão como objetivo principal o adensamento tecnológico da nossa indústria”, resume Haddad.
Citando estudos da iniciativa privada, o ministro disse que serão necessários investimentos adicionais da ordem de US$ 130-160 bilhões por ano, nos próximos dez anos, principalmente em infraestrutura para adaptação, energia, indústria e mobilidade.
Também nesta sexta, Fazenda e Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) disseram que estão criando uma plataforma para reduzir o risco cambial de investimentos alinhados ao plano ecológico, com expectativa de mobilizar coberturas de até US$ 3,4 bilhões.
E em um comunicado conjunto (leia em inglês), EUA e Brasil anunciaram a intenção de cooperar bilateralmente para melhorar os fluxos de financiamento para “a implementação do Plano de Transformação Ecológica e outras prioridades climáticas”.
Segundo Haddad, o plano é um primeiro passo.
Próximos passos
Agora é preciso dar os próximos, inclusive, lidando com algumas contradições.
Rosana Santos, diretora-executiva do Instituto E+ Transição Energética, avalia que o plano é conceitualmente importante porque reconhece que o enfrentamento das mudanças climáticas precisa ser transversal, não dá para se apoiar em ações isoladas.
Mas “o diabo mora nos detalhes”, diz Rosana. “Quando a gente vai fazer o desenvolvimento desse plano nas cadeias, tem vários cuidados a serem tomados”.
Ela menciona como exemplo o projeto de lei das eólicas offshore, celebrado por Haddad no discurso da COP, mas que, se for aprovado pelo Senado como saiu da Câmara, estenderá os subsídios ao carvão até 2050.
Outro cuidado é com os “ganhos fáceis”. Para Rosana, o próximo passo do plano deve ser o detalhamento do que será prioridade para receber os recursos e como isso vai gerar valor para a indústria nacional.
“Por exemplo, se o país se posicionar só como um exportador de hidrogênio de baixas emissões, não vai capturar todo o valor que isso tem para a sociedade brasileira, porque a gente vai estar exportando subsídios. Melhor seria exportar produtos que foram feitos e descarbonizados por conta da utilização doméstica desse hidrogênio, como fertilizantes, aço verde, vidro, até margarina”, explica.
“Agora, qual é o problema disso? É o custo. O hidrogênio fóssil hoje é mais barato do que o hidrogênio de baixas emissões. E aí é que entra realmente a política industrial para fechar esse gap de uma forma transitória”, completa.
Fundo para floresta em pé
Também nesta sexta, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, lançou um projeto conceitual para pagamento de floresta em pé, com a proposta de formação de um fundo chamado FFTS (Fundo Floresta Tropical para Sempre) a partir da captação de recursos de outros fundos soberanos.
A inovação é que, ao invés de recompensar pela massa de carbono da floresta, o pagamento seria por hectare preservado.
“É uma forma de considerar mais do que o carbono, e remunerar biodiversidade, pelas pessoas que vivem da floresta, pela função de redução de temperatura climática”, explica Rosana.
A proposta inicial do Brasil de US$ 25/hectare, além de mecanismos de controle para verificar se as condições estão sendo cumpridas.
“É um conceito arrojado, diferente, porque até hoje a gente só tinha em termos de carbono, principalmente, que é uma variável muito difícil de se medir. O que se está propondo agora é algo um pouco mais fácil, mais transversal. E vários países poderiam se beneficiar disso”, comenta a diretora do E+.
Cobrimos por aqui:
- COP28 começa com acordo para remediar perdas e danos em países pobres
- Brasil vai à COP28 apegado ao controle do desmatamento, mas distante do Acordo de Paris
- Ambientalistas brasileiros propõem cronograma para eliminar combustíveis fósseis
- G20, combustíveis fósseis e o distante Acordo de Paris
Mais COP28
Lula propõe ‘missão 1,5°C’
Em discurso aos chefes de Estado nesta sexta (1/12), o presidente brasileiro propôs uma missão coletiva para alinhar as economias globais ao limite de aumento de temperatura que os cientistas dizem ser seguro.
“Nos dois anos até a COP30, será necessário redobrar os esforços para implementar as NDCs que assumimos. E, em Belém, precisamos anunciar NDCs mais ousadas e garantir os meios de implementação necessários para concretizá-las”, defendeu Lula (PT).
E voltou a cobrar o financiamento prometido pelos países ricos para incentivar a ação climática em mercados de renda média e baixa.
“Os países em desenvolvimento requerem incentivos positivos para promover medidas de ação climática alinhadas às suas prioridades de desenvolvimento”, completou.
R$ 21 bi para transição energética
A ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, anunciou que o programa Mais Inovação Brasil terá R$ 20,85 bilhões distribuídos em cinco editais para financiar projetos nas áreas da transição energética, bioeconomia, infraestrutura e mobilidade. Com foco na indústria, a iniciativa será desenvolvida com MDIC, Finep e BNDES.
Financiamento climático para ALC e Amazônia
O BID anunciou na quinta (30/11), primeiro dia da conferência climática, que planeja triplicar o financiamento climático direto destinado à América Latina e Caribe para US$ 150 bilhões ao longo da próxima década.
Principal fonte de financiamento de longo prazo para o desenvolvimento da ALC, o banco de fomento assumirá, em 2024, a presidência dos Grupos de Chefes dos Bancos Multilaterais de Desenvolvimento (BMDs) e de Bancos de Desenvolvimento Regionais (BDRs).
A Amazônia também está entre as prioridades de apoio. Nesta sexta, os bancos públicos membros da Coalizão Verde disseram que pretendem mobilizar entre US$ 10 bilhões e US$ 20 bilhões em uma plataforma de desenvolvimento sustentável para a região. Esses recursos deverão ser desembolsados entre 2024-2030.
Petroestados precisam diversificar receitas
Os 40 países que têm receitas públicas dependentes do setor de petróleo e gás podem ver uma queda dos US$ 17 trilhões esperados até 2040 para US$ 9 trilhões, caso a transição energética seja acelerada de modo a limitar o aquecimento global a 1.8°C até 2100, conclui um estudo da Carbon Tracker.
Artigos da semana
– O hidrogênio verde no Brasil e o impacto de trilhões de Reais em investimentos Potencial verde e oportunidades reais da indústria da transição energética podem tornar o Brasil referência global em descarbonização, avalia Fernanda Delgado
– Incentivos para o biometano: um detalhe que não pode ser esquecido Regra proposta pelo GHG Protocol inviabiliza o aproveitamento dos atributos ambientais do biometano, desestimulando assim o uso do energético, avaliam Paulo Fernandes e Patrícia de Azevedo
– Oportunidades para investimento em inovação: a cláusula de PD&I Recursos de PD&I são cruciais para o Brasil alcançar suas metas de redução de emissões e promover uma economia de baixo carbono, escreve Júlia Borges da Mota