BRASÍLIA — Relatório da Organização Meteorológica Mundial (OMM) da ONU publicado nesta quarta (26/10) mostra que a concentração na atmosfera dos três principais gases de efeito estufa — dióxido de carbono, metano e óxido nitroso — atingiu novos recordes em 2021.
A concentração de metano, por exemplo, apresentou o maior salto na comparação anual desde que as medições começaram há quase 40 anos.
Segundo os cientistas da ONU, embora a razão para o aumento sem precedentes ainda não esteja clara, há um forte indicativo de que é resultado de processos biológicos e induzidos pelo homem.
O aumento nos níveis de CO2 de 2020 a 2021 também foi maior do que a taxa média de crescimento anual na última década. Esses níveis continuam subindo em 2022.
No ano passado, as concentrações de CO2 atingiram 415,7 partes por milhão (ppm), metano 1.908 ppm e óxido nitroso 334,5 ppm.
Esses valores representam, respectivamente, 149%, 262% e 124% dos níveis pré-industriais.
“O aumento contínuo nas concentrações dos principais gases que retêm o calor, incluindo a aceleração recorde nos níveis de metano, mostra que estamos indo na direção errada”, alerta Petteri Taalas, secretário-geral da OMM.
Planos climáticos insuficientes
Há dez dias da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP27), que este ano ocorre em Sharm El Sheikh, no Egito, os 193 países que assinaram o Acordo de Paris, em 2015, ainda não conseguiram apresentar planos climáticos ambiciosos o suficiente para cortar as emissões necessárias para limitar o aquecimento do planeta a 1,5°C até o fim do século.
Também nesta quarta, um outro relatório da ONU indica que os compromissos atuais aumentarão as emissões em 10,6% até 2030, em comparação com os níveis de 2010 — uma melhoria em relação à avaliação do ano passado (13,7%), mas ainda longe do ideal.
Para evitar um ponto de não retorno em que as altas temperaturas do planeta nos levariam a climas extremos, incluindo secas mais frequentes e severas, ondas de calor e chuvas intensas, as emissões precisam cair 45% até 2030.
De acordo com a análise deste ano, embora as emissões estejam caminhando para parar de aumentar após 2030, elas ainda não estão demonstrando a rápida tendência de queda que a ciência diz ser necessária nesta década.
“A tendência de queda nas emissões esperada para 2030 mostra que as nações fizeram algum progresso este ano”, disse Simon Stiell, secretário executivo da ONU Mudanças Climáticas.
“Mas a ciência é clara, assim como nossas metas climáticas sob o Acordo de Paris. Ainda não estamos nem perto da escala e do ritmo das reduções de emissões necessárias para nos colocar no caminho de um mundo de 1,5°C”.
Para manter esse objetivo vivo, Stiell pede aos governos nacionais que fortaleçam seus planos de ação climática agora, a tempo de implementá-los nos próximos oito anos.
Os cientistas analisaram as Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) dos 193 países, incluindo as 24 atualizações desde a COP26, de novembro passado na Escócia. Juntos, os planos cobrem 94,9% do total global de gases de efeito estufa emissões em 2019.
Na conferência do ano passado, todos os países concordaram em revisitar e fortalecer seus planos climáticos, mas quase ninguém fez.
“O fato de apenas 24 planos climáticos novos ou atualizados terem sido apresentados desde a COP26 é decepcionante. As decisões e ações do governo devem refletir o nível de urgência, a gravidade das ameaças que enfrentamos e a brevidade do tempo que resta para evitar as consequências devastadoras das mudanças climáticas descontroladas”, completa Stiell.
Pedalada brasileira
A maioria das partes que apresentaram NDCs novas ou atualizadas reforçou seu compromisso de reduzir ou limitar as emissões de gases de efeito estufa até 2025 e/ou 2030, demonstrando uma maior ambição na abordagem das mudanças climáticas.
O Brasil, no entanto, deu uma “pedalada”.
Em abril, o governo de Jair Bolsonaro enviou à ONU a segunda atualização das NDCs, prometendo reduzir as emissões de gases de efeito estufa em 37% até 2025, e em 50% até 2030, com ações de mitigação e adaptação em todos os setores econômicos. As ações que o governo pretende criar, no entanto, não são apontadas no documento.
Outro problema apontado por organizações ambientais, é que o governo mudou a base de cálculo, fazendo com que, mesmo com uma meta maior, o país tenha uma margem para emitir mais do que emitiria com a meta antiga.
Na NDC original, de 2016, o Brasil se comprometia a reduzir emissões de gases de efeito estufa em 37% até 2025 em relação a 2005, e indicava que poderia reduzi-las em 43% até 2030.
“Só que usando uma base de cálculo diferente, o que mudava tudo”, aponta o Observatório do Clima, em nota.
O OC estima que mudanças na base de cálculo vão permitir ao Brasil emitir 73 milhões de toneladas de CO2 equivalente (MtCO2e) a mais em 2030 do que o prometido em 2015.
Já o Instituto Talanoa e o projeto Política por Inteiro calculam que a NDC de 2022 aumenta em 314 milhões de toneladas de CO2eq o nível de emissões permitido em 2025 em relação à meta assumida em 2016.
Também aumenta em 81 milhões de toneladas de CO2eq o nível de emissões permitido em 2030 em relação à meta indicativa apresentada em 2016 e diminui a ambição climática do país nesta década.
Com a NDC atual, o Brasil deve chegar à COP27 com uma “ambição” climática que levaria o planeta ao aquecimento de mais de 3°C até o fim do século, calcula a iniciativa Climate Action Tracker (CAT).
A agência epbr irá cobrir a COP27 entre os dias 7 e 18 de novembro, com transmissões ao vivo, de segunda a sexta, sempre às 14h