BRASÍLIA — Após quase uma década em discussão, o mercado de carbono internacional criado pelo artigo 6 do Acordo de Paris, assinado em 2015, finalmente teve suas regras aprovadas no último final de semana, marcando o encerramento da 29ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP29).
A decisão adotada em Baku, no Azerbaijão, pretende abrir caminho para aumentar as negociações de ativos em um novo mercado supervisionado pela ONU.
O acordo sobre regras para o artigo 6 era uma das prioridades do anfitrião da COP das finanças, que já começou com a aprovação do artigo 6.4, estabelecendo como o novo mecanismo global de crédito funcionará e encerrou com a adoção de regras adicionais sobre o artigo 6.2 (troca de resultados de mitigação entre países).
O novo mecanismo permite que os países negociem créditos de carbono entre si, assim como com empresas. Os textos aprovados na COP29 detalham um sistema de contabilidade para evitar dupla contagem.
Isto é, define como um país que vende um crédito pode deduzi-lo da sua contabilidade de carbono para evitar que o mesmo título seja usado duas vezes.
Risco de indisciplina
Para o Carbon Market Watch (CMW), organização de pesquisa focada em mercados de carbono, apesar do esforço para aprovar as regras, da forma como está, há um risco de que o mercado siga indisciplinado, facilitando negociação de créditos de baixo valor ambiental.
“As falhas do Artigo 6, infelizmente, não foram corrigidas”, analisa Isa Mulder, especialista em políticas sobre mercados globais de carbono.
“Parece que os países estavam mais dispostos a adotar regras insuficientes e lidar com as consequências mais tarde, em vez de prevenir essas consequências em primeiro lugar”.
Uma das preocupações é com a ausência de responsabilização. O CMW avalia que os prazos e penalidades para abordar a não conformidade de acordos de créditos de carbono não ficaram claros.
Além disso, embora aparentemente transparente, os arranjos de registro culminaram em um sistema alternativo complexo.
“Os países em desenvolvimento não terão que desenvolver seus próprios registros, mas ainda há dúvidas sobre quão rápido e quão efetivamente o novo sistema será estabelecido”, observa.
O texto final do Artigo 6.2 requer que os países publiquem informações quando aprovam formalmente os resultados de mitigação comercializados internacionalmente (ITMOs) — as unidades usadas para o comércio de emissões entre países — para uso por outros atores, como empresas. Quaisquer inconsistências identificadas passarão a ser públicas.
No entanto, sem a definição de prazos, essas informações podem chegar tarde para créditos comprados por companhias aéreas sob o Corsia, por exemplo, ou outras empresas no mercado voluntário.
Operacionalização
Já o artigo 6.4, sobre remoções e requisitos metodológicos, rejeitou uma proposta para exigir que projetos do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), do Protocolo de Kyoto, passassem por uma reavaliação de adicionalidade.
A intenção era reduzir o volume de créditos emitidos, o que tem impacto no preço e na qualidade dos projetos.
Como a proposta foi rejeitada, antigos projetos de MDL continuam valendo sob o mecanismo do artigo 6.4, para reduções de emissões alcançadas entre 2021 e 2025, sem verificação adicional.
Além disso, a partir do início do ano que vem, quando o órgão supervisor do mecanismo 6.4 retomar seu trabalho, precisará esclarecer regras em torno dos projetos de captura e armazenamento de carbono relacionados a combustíveis fósseis.