O financiamento climático global está crescendo em volume, porém segue concentrado em projetos de mitigação de emissões com baixo valor agregado e em instrumentos pouco concessionais.
Com isso, o desenvolvimento de projetos de descarbonização nos setores hard-to-abate da indústria avança devagar, mesmo que casos demonstrem que, quando há política climática estável, energia limpa barata, contratos de longo prazo e blended finance bem desenhado, as operações funcionam.
Para o Brasil, esses desafios são significativos, mas a janela de oportunidade é concreta.
O país reúne vantagem natural em renováveis, minérios e base industrial, além de instrumentos financeiros como Fundo Clima, EcoInvest, Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF) e Plataforma Brasil de Investimentos Climáticos e para a Transformação Ecológica (BIP).
Falta, no entanto, transformar prontidão em execução escalável e territorializada: padronizar projetos com conjuntos robustos para mensurar, reportar e verificar emissões de Gases do Efeito Estufa (MRV), criar balcões de negócios que liguem projetos a financiamento e mercado, e acoplar powershoring para ancorar polos industriais limpos.
Outras barreiras para que o financiamento climático se torne política de desenvolvimento com emprego e exportações de baixo carbono no país são as instâncias dispersas e fluxos decisórios longos, que elevam o risco percebido e atrasam desembolsos.
Além disso, a ausência de padrões contratuais, critérios harmonizados de taxonomia e integração fraca entre plataformas públicas e de bancos limitam a previsibilidade e offtake. Com isso, embora a aprovação de propostas cresça, a conversão em contratações e desembolsos efetivos segue lenta.
Diante desses desafios, o estudo Financiando a transição: análise e recomendações sobre mecanismos de financiamento climático no Brasil, que desenvolvemos com o Instituto Itaúsa, faz quatro proposições nessa direção:
1. Integração institucional e padronização, incluindo a criação de um balcão integrado com instrumentos como Plataforma Interativa de Descarbonização (PID) do Instituto E+, BIP, EcoInvest, Fundo Clima e Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex) para originação, due diligence técnica, documentação padrão, MRV digital e trilhas setoriais; e a publicação de cadernos setoriais com critérios da Taxonomia Sustentável Brasileira (TSB), modelos contratuais, cronogramas de licenciamento e indicadores de performance por projeto.
2. Desenvolvimento de instrumentos de de-risking e fechamento financeiro, com o acoplamento de garantias, first-loss, seguros de construção e hedge cambial do EcoInvest a linhas do Fundo Clima e a dívida multilateral, com exigência de alavancagem mínima e metas de conteúdo e aprendizado. Esses instrumentos devem contemplar ainda uma escalada dos contratos de longo prazo, como PPAs para energia, offtakes para produtos descarbonizados (como hidrogênio produzido com baixas emissões ou combustível sustentável de aviação), além de contratos por diferença (CfDs) setoriais que estabilizem preços e encurtem o caminho desembolso.
3. Estímulos à demanda e ao mercado: compras públicas, padrões de baixo carbono e métricas de intensidade por tonelada podem ser usados para a criação de um mercado doméstico alinhado ao Mecanismo de Ajuste de Carbono nas Fronteiras (CBAM) e a cadeias exportadoras. Chamadas de offtake coordenadas com âncoras privadas e bancos, priorizando hard-to-abate e encadeamentos regionais também são alternativas relevantes.
4. Alinhamento estratégico e orçamento verde, por meio da associação de um percentual fixo de rendas fósseis e instrumentos soberanos a linhas climáticas de financiamento, com metas anuais de aplicação, transparência e avaliação de impacto. Também se recomenda uma articulação de janelas programáticas com bancos multilaterais de desenvolvimento para elevar concessionalidade, priorizar adaptação onde houver danos recorrentes e reduzir custo de capital em projetos industriais verdes.
O fato é que o financiamento climático enfrenta um descompasso entre esforço institucional e mensuração do seu impacto efetivo no país.
A combinação de iniciativas existentes, identificação e superação de falhas e aproveitamento de oportunidades de melhoria pode reorientá-lo rumo aos resultados verificáveis tão necessários para o avanço da transição energética no nosso país.

João Abbud é especialista em Financiamento Climático do Instituto E+ Transição Energética e mestrando em Desenvolvimento Sustentável na Universidade de Brasília.
