Armazenamento de CO2

CCS: critérios para disputas de áreas de armazenamento dependerão de regulamentação 

A exclusão de critérios e diretrizes detalhadas gera lacunas que deverão ser preenchidas por regulamentações futuras

CCS: critérios para disputas de áreas de armazenamento dependerão de regulamentação (Foto: Mário Agra/Câmara dos Deputados)
Votação do PL 528/2020 na Câmara dos Deputados (Foto: Mário Agra/Câmara dos Deputados)

RIO — O projeto de lei do Combustível do Futuro (PL 528/2020), aprovado esta semana (11/9) pela Câmara dos Deputados e encaminhado para sanção presidencial, trouxe definições importantes para a atividade de captura e armazenamento de carbono (CCS), mas deixou incertezas que agora caem no colo da regulamentação. 

Uma das principais alterações aprovadas pela Câmara e que foi recebida de maneira positiva pelo setor foi a retirada da exigência do contrato de permissão para o exercício das atividades de CCS, que constava no texto vindo do Senado. 

Agora, essas atividades deverão ser realizadas mediante autorização da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).

“Entendemos que a manutenção do instrumento de autorização da ANP para a realização de injeção de CO2 é muito positivo, pois é um instrumento conhecido da administração pública que está alinhando com a dinamicidade e segurança jurídica necessária aos futuros projetos armazenamento geológico de carbono”, afirmou Isabela Morbach, diretora da CCS Brasil à agência eixos.

Disputa por áreas

Já a regulamentação referente à solução de possíveis disputas por áreas destinadas ao armazenamento de carbono foi deixada em aberto. 

O texto do Senado trazia critérios claros para priorizar propostas, como a capacidade de descarbonização e remoção de CO2, mas esses critérios foram retirados.

Sem essas diretrizes, a regulamentação precisará estabelecer novos requisitos para a priorização de propostas.

As diretrizes são outro ponto que ficará para a regulamentação. O texto que saiu do Senado detalhava exigências para o requerimento de autorização, incluindo um formulário com informações específicas.

Entre elas, a comprovação de capacidade técnica e financeira, o plano de contingência, e garantias financeiras.  

No entanto, essas exigências detalhadas foram retiradas na versão aprovada pela Câmara.

“A retirada de alguns dispositivos representa um desafio maior para a agência reguladora, que demandará esforço redobrado”, destacou Morbach.

A transferência de titularidade, considerada essencial pelo setor para diminuir os riscos dos operadores na atividade de CCS, também foi retirada, ficando a cargo da ANP definir as condições.

A CCS Brasil defendia a inclusão da medida, que já é uma prática comum em países como Noruega, Canadá, Austrália e Reino Unido.

O que significa a transferência de responsabilidade nas operações de CCS?

É um processo pelo qual a responsabilidade legal pelo armazenamento permanente de carbono capturado é transferida do operador do projeto, geralmente uma empresa, para uma entidade governamental ou outro órgão designado, após o encerramento das atividades de injeção de CO2.

Caminho alternativo à regulamentação

Para Fernando Luiz Zancan, presidente da Associação Brasileira do Carbono Sustentável (ABCS) – antiga Associação Brasileira de Carvão Mineral –, um outro caminho, além da regulamentação, seria votar o PL 1425/2022, de autoria do ex-presidente da Petrobras e ex-senador Jean Paul Prates (PT/RN), que inclui esses critérios e dispositivos que ficaram fora do texto.

Inclusive, o texto de CCS do Combustível do Futuro incorporou alguns elementos do PL 1425, como a própria definição da ANP como agência reguladora da atividade de estocagem geológica de dióxido de carbono e das etapas de captura e transporte, e a autorização pelo prazo de 30 anos.

No texto enviado à sanção, ficou mantido o papel do Ministro de Minas e Energia na resolução de conflitos envolvendo a estocagem de CO2 e atividades de exploração de hidrocarbonetos ou mineração. 

Caso não seja possível o desenvolvimento simultâneo dessas atividades em um mesmo bloco de armazenamento, caberá à pasta decidir o uso prioritário, após ouvir as partes interessadas.

À agência eixos, o presidente da ABCS disse que o parágrafo é suficiente para garantir que a Agência Nacional de Mineração (ANM) seja ouvida, em caso de disputa de áreas sob concessão de emperesas mineradoras.

“Isso já dá condições de que as partes interessadas sejam ouvidas”, disse Zancan.

A ABCS chegou a defender a inclusão nominal da ANM no texto, deixando claro o papel da agência junto da ANP na definição de prioridade em um caso de disputa por área para armazenar CO2.

Bastidores

Houve um entendimento de que a autorização da ANP será menos burocrática do que a assinatura dos contratos de permissão. Por outro lado, isso deixa mais decisões para serem tomadas e sustentadas por meio da regulamentação.

Durante a votação na Câmara, o governo não se opôs às mudanças no texto, entendendo que as brechas podem ser fechadas na regulamentação.

Entre os que defenderam autorização no lugar dos contratos está o setor de etanol. Hoje, o projeto de CCS mais avançado é o da produtora de etanol de milho FS.

O grupo está investindo R$ 350 milhões em um sistema para capturar, comprimir e transportar o CO2 emitido pela fábrica de Lucas do Rio Verde, no Mato Grosso, até um local de armazenamento subterrâneo, na Bacia dos Parecis.