RECIFE — O Banco Mundial calcula que serão necessárias três bilhões de toneladas de minerais estratégicos para expansão de energia limpa (solar, eólica e geotérmica, por exemplo). Nesse contexto, o Brasil tem um potencial mineral “mais pela diversidade do que pelo tamanho”, diz Edson Ribeiro, diretor de Exploração e Projetos Minerais da Vale.
Ele participou na última quinta (14/4) de um debate promovido pelo Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri) sobre a descentralização do desenvolvimento e investimento dos recursos minerais para a transição.
“Somos um dos poucos países do mundo com capacidade de produção de todos os minerais que são estratégicos. Não temos as maiores jazidas, as mais competitivas, isso é importante a gente saber”.
A transição energética aumenta a demanda por recursos minerais e, com ela, os desafios novos e antigos, como escalar a mineração de forma ambientalmente responsável e superar a dependência de alguns poucos países, já que a concentração geográfica pode colocar o suprimento em risco — a exemplo do que vem acontecendo desde a invasão russa à Ucrânia.
Segundo Ribeiro, o Brasil não será um líder mundial na produção de cobre, níquel ou lítio. E mesmo o nióbio, onde o país lidera, o mercado é muito pequeno. Mas o país pode se posicionar como produtor confiável.
“O Brasil tem uma oportunidade única de desenvolver uma nova mineração, a mineração que tem o ESG no coração”.
ESG é uma sigla em inglês para aspectos ambientais, sociais e de governança.
O diretor da Vale diz ainda que há uma “expectativa muito forte” dos investidores internacionais, de que o Brasil faça mineração na Amazônia de forma responsável e integrada. “Temos uma oportunidade e um desafio muito grande”, afirma.
A mineração na Amazônia é uma bandeira defendida pela gestão de Jair Bolsonaro.
Em 2020, o governo apresentou o Projeto de Lei 191/2020, que libera garimpo e mineração em terras indígenas.
Em março deste ano, a base do governo na Câmara aprovou a urgência do projeto por 279 a 180 votos e ele pode ser votado a qualquer momento. O PL é alvo de críticas de organizações ambientais, indígenas e segmentos do setor produtivo.
Para o diretor de Sustentabilidade em Assuntos Regulatórios do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), Júlio Nery, apesar de não existir previsão legal de mineração nas terras indígenas, é possível realizá-la de forma sustentável na Amazônia, desde que haja concessão dos povos originários.
“É possível minerar de forma responsável nas terras indígenas, respeitando os povos originários. Temos que ter o consentimento deles, mas acreditamos que é possível sim realizar esse processo. O que vimos hoje é uma atuação por parte do garimpo, que é ilegal”, afirma Nery.
Desenvolvimento descentralizado
Segundo os especialistas, hoje os grandes desafios giram em torno dos altos custos da transição com minerais sustentáveis e da necessidade de descentralização geográfica, o que vai demandar parcerias público-privadas.
Além da pressão sobre os preços minerais como lítio, cobre e níquel, a concentração geográfica em poucos países na exploração e beneficiamento dessas matérias-primas acende um alerta em relação à segurança energética das fontes renováveis.
China, Austrália e República Democrática do Congo, por exemplo, controlam mais de três quartos da produção global de lítio, cobalto e terras raras.
O nível de concentração é ainda maior em relação ao refino, sendo a China responsável por 35% do processamento global de níquel, 50 a 70% para lítio e cobalto e quase 90% para terras raras.
O relatório da Agência Internacional de Energia (IEA, sigla em inglês), divulgado em 2021, apontou que a demanda por lítio deve crescer mais de 40 vezes nas próximas duas décadas.
Grafite, cobalto e níquel terão uma demanda entre 20 e 25 vezes maior, na comparação com o mercado atual.
Segundo a agência, há recursos minerais suficientes para suprir o crescimento esperado da demanda, “mas isso não é garantia de disponibilidade e preços acessíveis”.
A IEA calcula que um carro elétrico típico requer seis vezes mais recursos minerais que um convencional. Da mesma forma que uma eólica offshore necessita 13 vezes mais recursos minerais que uma planta a gás com capacidade similar de produção.