Opinião

Avanço da transição energética esbarra em desafios regulatórios

Expansão de renováveis, geração distribuída e hidrogênio verde esbarra em lacunas regulatórias, escreve Luiz Vianna

Luiz Vianna é COO da Thymos Energia (Foto Divulgação)
Luiz Vianna é COO da Thymos Energia (Foto Divulgação)

A transição energética é uma meta global e o Brasil destaca-se por já ter uma matriz elétrica predominantemente renovável, com 90% de sua capacidade instalada proveniente das energias hidrelétrica, eólica, solar e biomassa. Com esse potencial, nosso país tem condições de sobra para atrair novos investidores e liderar esse processo de transformação no mundo. No entanto, para este cenário se concretizar ainda são necessários avanços regulatórios.

Atualmente, as fontes eólica e solar correspondem a 40% da capacidade instalada e estão em ritmo de crescimento acelerado.

Por outro lado, com esta conquista surgiu o curtailment, a nova preocupação do setor. Trata-se da redução forçada da geração de energias renováveis quando a produção supera a demanda ou a capacidade de transmissão do sistema elétrico.

Essa questão lembra o imbróglio do GSF (Generation Scaling Factor, em inglês), que durante anos prejudicou o setor elétrico brasileiro devido à ausência de mecanismos regulatórios adequados para lidar com o risco hidrológico. No caso do GSF, a descompensação entre geração hidrelétrica e contratos firmados levou geradores a prejuízos bilionários e longas disputas judiciais.

Da mesma forma, o curtailment gera insegurança financeira ao impor perdas aos geradores eólicos e solares, desincentivando investimentos e expondo a desconexão entre o ritmo da expansão da geração renovável e a infraestrutura de transmissão necessária.

O aprendizado do GSF aponta para a urgência de medidas preventivas, como compensações financeiras e regras claras para gestão de cargas, que poderiam evitar danos futuros e fortalecer a confiança no mercado.

Além disso, a geração distribuída (GD), especialmente a partir de sistemas solares fotovoltaicos, tem crescido exponencialmente no território nacional. Porém, a regulamentação atual não acompanha esse ritmo, o que justifica a implementação de diretrizes claras sobre as responsabilidades entre consumidores e distribuidoras de energia.

O crescimento da GD traz oportunidades para descentralizar a produção de energia, mas o marco regulatório precisa contemplar esse movimento.

Paralelamente, a mobilidade elétrica, embora ainda incipiente no Brasil, demanda uma estrutura regulatória que incentive a adoção de veículos elétricos e a expansão da infraestrutura de recarga, aspectos essenciais para a descarbonização do setor de transportes e para a redução das emissões urbanas de poluentes.

A regulação precisa considerar também que os recursos descentralizados e distribuídos cresçam de forma que sejam inseridos na rede com segurança.

“A modernização e a criação de marcos legais que acompanhem as inovações tecnológicas e as demandas do mercado são essenciais para garantir a integração eficiente de novas fontes de energia, a expansão da geração distribuída, o avanço da mobilidade elétrica e o desenvolvimento de setores emergentes como a eólica offshore e o hidrogênio verde.”

Outro ponto crucial é a necessidade de regulamentação para fontes emergentes como a energia eólica offshore e o hidrogênio verde, que representam fronteiras promissoras para a matriz energética brasileira. As notícias já dão conta de uma série de memorandos de entendimento para a produção destas fontes.

Se pegarmos o recorte do hidrogênio, a Thymos calcula US$ 28 bilhões de investimentos potenciais para o Brasil até 2030. Já em relação a geração de energia por meio dos ventos em alto mar, a Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica) calcula que cada 1 GW pode representar de US$ 2,5 bilhões a US$ 5,4 bilhões de investimentos.

Mas essas tendências não têm legislação que contemple seu desenvolvimento no Brasil. É urgente aprovar o arcabouço regulatório para viabilizar que tais aportes saiam do papel. A ausência de diretrizes que definam critérios de licenciamento, responsabilidades de operação e incentivos financeiros limita o potencial da transição energética.

A modernização e a criação de marcos legais que acompanhem as inovações tecnológicas e as demandas do mercado são essenciais para garantir a integração eficiente de novas fontes de energia, a expansão da geração distribuída, o avanço da mobilidade elétrica e o desenvolvimento de setores emergentes como a eólica offshore e o hidrogênio verde.

Somente assim o Brasil poderá consolidar sua posição de destaque na transição energética e contribuir ainda mais para a mitigação das mudanças climáticas.

Este artigo expressa exclusivamente a posição do autor e não necessariamente da instituição para a qual trabalha ou está vinculado.


Luiz Vianna é COO da Thymos Energia. Com mais de 25 anos de experiência, é membro do Conselho Fiscal do IPD Eletron, do Conselho Administrativo do Cigré Brasil, do Conselho Consultivo da Amcham e do World Energy Council.

Foi presidente do Lactec e da Associação Brasileira das Instituições de Pesquisa Tecnológica e Inovação (Abipti) e integrou também o Conselho de Energia da Fiep, o Conselho Consultivo da Finep, o Conselho de Administração do CGEE e o Comitê Técnico Científico da ANP.

Possui especialização pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT Sloan School of Management) em Desafios de Liderança de Equipes (Challenges of Leadership in Teams, em inglês), e é formado em Administração de Empresas pela Universidade Tuiuti do Paraná.

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