RECIFE — A Alemanha anunciou na quarta (6/6) a atualização da sua política energética e determinou que, até 2030, 80% da eletricidade consumida no país terá que vir de fontes renováveis, com meta de crescimento para 100% a partir de 2035.
O anúncio foi feito dois dias após o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) informar que as políticas públicas voltadas para o clima, adotadas pelos países até o final de 2020, contribuem para um aquecimento de 3,2ºC até o fim do século, mais do que o dobro do limite do Acordo de Paris.
Apelidada de Pacote de Páscoa (Osterpaket, em alemão), a nova legislação afirma que “o uso de energias renováveis é de interesse público primordial e serve à segurança nacional”.
Cumprir as novas metas do governo alemão até 2030 significa dobrar a capacidade eólica onshore para 115 gigawatts (GW) e triplicar a energia solar para 215 GW, juntamente com uma expansão da energia eólica offshore para 30 GW.
A mudança vai demandar uma enorme mobilização para substituir as fontes fósseis, que em 2021 responderam por 47% da eletricidade gerada no país, de acordo com a última Revisão Global de Eletricidade do think tank Ember — enquanto a participação de eólica e solar foi de apenas 29%.
“As novas medidas de política energética e climática são urgentes não apenas por causa da guerra na Ucrânia, mas sobretudo porque devemos fazer nossa parte para combater a mudança climática global e conduzir nosso país a um futuro sustentável”, afirmou Andreas Kuhlmann, chefe da Agência Alemã de Energia (Dena, em alemão).
Como líder do encontro do G7 em 2022, a Alemanha deve trabalhar na campanha de investimento em energia limpa e, politicamente, reafirmar a independência energética em relação à Rússia.
“Os efeitos da guerra na Ucrânia são apenas um terrível desenvolvimento adicional que fez com que até o mesmo último cético se desse conta”, reforçou Andreas.
O levantamento do Ember aponta que a energia eólica e solar atingiu, em 2021, um décimo da eletricidade global, mas a transição global da eletricidade precisa sustentar taxas de crescimento muito altas para substituir o carvão e reduzir as emissões.
“Governos como os dos EUA, Alemanha, Reino Unido e Canadá estão tão confiantes na eletricidade limpa que planejam mudar 100% da sua rede na próxima década e meia. Mas, com o carvão ainda aumentando e a demanda por eletricidade crescendo, todos os governos com redes intensivas em carbono agora precisam agir com a mesma ousadia e ambição”, apontou o estudo.
Agências alertam sobre urgência de acelerar a transição
Para estar em um caminho que mantenha o aquecimento global em 1,5ºC, a energia eólica e solar precisam sustentar altas taxas de crescimento composto de 20% a cada ano até 2030. Essa é a mesma taxa de crescimento da média na última década.
A Ember também alerta que todas as fontes limpas de eletricidade geraram 38% da energia mundial em 2021, apenas 2% a mais do que o carvão (36%).
Já a Agência Internacional de Energia Renovável (Irena, em inglês) estima que para atingir zero emissões líquidas até 2050, o investimento anual em energia limpa em todo o mundo precisará mais que triplicar até 2030, para cerca de US$ 4 trilhões.
As mudanças exigem um grande aumento na flexibilidade do sistema elétrico — como baterias, resposta à demanda, combustíveis à base de hidrogênio e energia hidrelétrica, por exemplo — para garantir suprimentos confiáveis.
Também será necessária uma cooperação internacional maior entre os países, diz a Irena, para cumprir as metas estabelecidas na última conferência climática, a COP26.
A Irena chama a atenção para a garantia de que as economias emergentes recebam financiamento e tecnologias para chegar a zero líquido a tempo.
“A Alemanha está entre várias economias líderes que estabeleceram metas tecnológicas ambiciosas para a descarbonização de seu setor energético. Entretanto, a transição energética não deve ser abordada de uma perspectiva puramente tecnológica”, alerta Rabia Ferroukhi, diretora do Centro de Conhecimento, Política e Finanças da Irena.
Confira as principais mudanças da lei do setor elétrico da Alemanha:
Fotovoltaica
- Metas e volumes serão adaptados para obter uma expansão anual de 22 GW;
- Telhados e áreas abertas devem proporcionar metade do espaço para painéis solares;
- Serão concedidos subsídios aos operadores privados e públicos para fomentar a rede de eletricidade;
- As empresas de energia alemãs estarão isentas de licitação pública uma vez a cada cinco anos, de acordo com os regulamentos da União Europeia, para que novos projetos de energia cidadã sejam realizados sem que antes haja necessidade de participar de um processo de licitação.
Eólica offshore
- Aumento das metas de expansão da energia eólica offshore para cerca de 30 GW até 2030; 40 GW até 2035; e 70 GW até 2045;
- Licitações com base em critérios qualitativos (rendimento energético das turbinas, compatibilidade com a conservação da natureza e proteção das espécies, por exemplo);
- 70% da receita dos pagamentos da licitação destinado para a taxa da rede offshore, 20% para a conservação da natureza e 10 % para a pesca ecológica.
Eólica onshore
- Metas e volumes serão adaptados para obter uma expansão anual de 10 GW;
- Cada estado federal deverá destinar 2% de sua área de superfície para localização de turbinas — atualmente a média é de 0,8%;
- As turbinas eólicas podem ser construídas em áreas de conservação da paisagem (o nível mais baixo de áreas protegidas) e nas proximidades de instalações para radares de navegação por rádio e meteorologia .
Biomassa
- Utilização da biomassa em centrais elétricas com pico de cargas flexíveis;
- Os volumes licitados para biomassa serão gradualmente reduzidos e os para biometano aumentarão para 600 MW por ano a partir de 2023;
- O recurso da biomassa deverá ser utilizado apenas em setores de difícil descarbonização, como transporte e indústria.
Com informações do ClimaInfo