newsletter
Diálogos da Transição
eixos.com.br | 13/05/22
Editada por Nayara Machado
[email protected]
Estudo da TransitionZero divulgado esta semana mostra que a precificação do carbono torna mais interessante economicamente fazer a transição direta do carvão para energias renováveis, do que usar o gás natural como combustível de transição.
Segundo a organização, que usa ciência de dados e modelagem financeira para traçar cenários, o preço do carbono necessário para incentivar a mudança de carvão para energia renovável e armazenamento de baterias está em média em -US$ 62/tCO2 em 2022. Já na mudança para o gás o valor sobe para US$ 235/tCO2.
A análise também aponta que o custo da energia renovável diminuiu 99% desde 2010, e que o gás natural — diante dos conflitos geopolíticos atuais — deixou de ser viável para a transição energética.
No cenário de emissões líquidas zero até 2050 da Agência Internacional de Energia (IEA, em inglês), nenhuma energia de carvão ou gás fóssil deve ser gerada até 2035 nas economias avançadas e globalmente até 2040.
O estudo da TransitionZero inclui um projeto de dados abertos, o Índice de Preço do Carvão para o Carbono Limpo (C3PI), que indica o preço do carbono necessário para pular “o gás de transição” direto para um sistema elétrico predominantemente renovável, com energia eólica onshore e fotovoltaica solar combinadas ao armazenamento de baterias.
O índice leva em conta uma série de fatores que influenciam o resultado em cada geografia, incluindo interrupções na cadeia de fornecimento, geopolítica e regulamentações de mercado.
No caso da insegurança energética associada ao carvão e ao gás fóssil, afirma que as volatilidades percebidas agora provavelmente continuarão.
“Apesar de algumas variações regionais, nossa análise mostra uma clara tendência deflacionária no custo de mudar da eletricidade do carvão para a eletricidade renovável e põe em questão os 615 GW de gás e 442 GW de carvão propostos e em construção globalmente”, afirma Matt Gray, co-fundador e analista da TransitionZero.
Cobrimos por aqui:
- Capacidade global de usinas a carvão cresceu 18 GW em 2021
- Mercado global de armazenamento deve chegar a US$ 37 bi em 2030, projeta Honeywell
- Demanda de eletricidade coloca sistemas de energia sob pressão e eleva emissões
Diferenças regionais. Na Europa, o preço da troca é negativo devido ao aumento dos preços do carbono com as reformas políticas para o ETS (o mercado de carbono europeu), décadas de apoio político para as energias renováveis e a invasão russa à Ucrânia, que resultou em um aumento acentuado do preço do carvão térmico, avalia Jacqueline Tao, analista da TransitionZero.
“O Japão, por outro lado, tem os preços mais altos de troca devido a regulamentações discriminatórias e restrições ao uso do solo, enquanto que na China e nos EUA, apesar de serem líderes mundiais em energia renovável, os preços mais baixos do carvão nacional compensam parcialmente as vantagens do carvão”, explica Tao.
Já no sudeste asiático, os custos são influenciados por subsídios para o carvão e o gás, já que a indústria de renováveis é incipiente em comparação com outros países.
O Brasil não aparece na análise, pelo perfil de sua matriz energética, que tem forte participação de hidrelétricas e o carvão mineral responde por 4,9% da geração do país, segundo a EPE.
Mas vale dizer que o país vem sujando sua matriz.
Em janeiro, Jair Bolsonaro (PL) sancionou, sem vetos, a lei 14.299/22, que cria uma política de ajuda ao setor carbonífero de Santa Catarina. O texto determina que a União prorrogue a autorização do Complexo Termelétrico Jorge Lacerda, em Santa Catarina, por 15 anos, a partir de 1º de janeiro de 2025.
Neste período, o Ministério de Minas e Energia (MME) deverá assinar um contrato de compra de energia de reserva da usina a carvão — a mais poluente das fontes de energia.
No final do ano passado, o governo também realizou o primeiro leilão de reserva de capacidade de energia aberto apenas a termelétricas.
O resultado foi a contratação de 5,1 GW de potência, com predominância de térmicas a gás natural e combustível fóssil, com início de suprimento previsto para 2026 e 2027, com contratos de 15 anos de duração.
Junte-se a isso a lei de privatização da Eletrobras, que obriga a contratação de 8 GW de geração termelétrica, e o Brasil tem pela frente um caminho fóssil.
O próprio Plano Decenal de Energia (PDE) 2031 aprovado em abril pelo MME mostra que as políticas atuais vão beneficiar energias fósseis, mudando a composição da matriz a um “maior custo de operação para o sistema”.
A estimativa é que quase 60% do total de expansão da capacidade instalada em 2031 seja de usinas a gás natural, carvão mineral e nuclear.
- Veja também: Entrevista com Maurício Tolmasquim, professor do Coppe/UFRJ, ex-secretário executivo do MME e ex-presidente da EPE
Enquanto isso, o governo “bate cabeça” na definição de um marco legal para eólica offshore e hidrogênio.
Na expectativa de atrair investimentos bilionários em eólicas offshore e hidrogênio verde, o Ceará cobra uma resposta do governo federal sobre o marco regulatório dos dois setores.
Em entrevista à agência epbr, o secretário de desenvolvimento econômico do estado, Francisco Maia Júnior, afirma que o mercado busca sinalizações que garantam segurança jurídica, mas que os diferentes ministérios do governo federal “batem cabeça” e têm dado sinais contraditórios aos investidores.
A expectativa do governo cearense é que a regulamentação das eólicas offshore e a Estratégia Nacional do Hidrogênio ajudem a dar celeridade aos investimentos no Porto de Pecém (CE) — que desponta como potencial destino de investidores interessados na corrida pelas novas energias.
“Precisa regulamentar para oferecer aos investidores as garantias necessárias. São investimentos de cifras realmente muito robustas”, afirma o secretário. “Existe uma grande expectativa no mundo do Brasil em se posicionar em relação a isso. O Brasil não pode perder essa oportunidade”.
Artigos da semana
— Geração distribuída demanda uniformidade de regras tributárias: Avanço dado pelo Marco Legal da Geração Distribuída não é suficiente para eliminar dificuldades da tributação da GD, escreve Einar Tribuci, diretor Jurídico e de Tributação da Associação Brasileira de Geração Distribuída (ABGD).
— Perspectivas nacionais para o futuro mercado regulado de carbono: Luciana Gil Ferreira e Patrícia Mendanha Dias, sócias do Bichara Advogados, comentam as propostas em discussão para o mercado regulado de carbono do Brasil.
— Aprimoramentos na regulação devem impulsionar o uso do biogás e biometano: o colunista Felipe Boechem escreve sobre os efeitos das novas regulações e dos debates legislativos específicos para o mercado de biogás.