Por Karoline Cabral e Adrianno Lorenzon
O estado do Rio de Janeiro assinou, em 2004 e 2005, o 1º e o 2º Termos Aditivos contratuais com as concessionárias CEG e CEG Rio com o objetivo de expandir a rede de distribuição de gás natural para municípios fluminenses não atendidos pelas distribuidoras, como Maricá, Mangaratiba, Angra dos Reis e Saquarema.
As concessionárias não realizaram a construção dos novos ramais e redes de alta pressão, cujo prazo para conclusão expirou 2008. A Agenersa determinou, então, na 3ª revisão tarifária (RTQ) realizada em 2013, a devolução aos consumidores dos montantes não investidos, assim como a aplicação de multas pelo não cumprimento das obrigações.
Posteriormente, em maio de 2013, foi promulgada a Lei Estadual n° 6.448/13, com objetivo de estimular a interiorização da distribuição por meio de gás natural comprimido (GNC), bem como promover tratamento semelhante aos clientes abastecidos, seja pela rede de distribuição seja por projetos estruturantes de GNC. Neste contexto, no final de 2014, o estado do Rio de Janeiro celebrou com as concessionárias de gás o 3° Termo Aditivo para a substituição das obrigações de investimentos pactuados anteriormente com o 1° e o 2° Termos Aditivos.
Os municípios seriam abastecidos através dos chamados “gasodutos virtuais” – via GNC ou gás natural liquefeito (GNL). Em contrapartida, as distribuidoras pagaram ao Poder Concedente outorga compensatória correspondente ao valor dos investimentos não realizados (R$ 391 milhões), que seriam incorporados na base de ativo intangível das distribuidoras.
Recentemente, no processo da 4º RTQ, em curso há mais de um ano, foi pleiteada pelas distribuidoras a incorporação do montante da outorga compensatória à base de ativos.
Nas controvérsias expostas em audiências públicas, a consultoria contratada pela Agenersa apresentou dois cenários para o reposicionamento tarifário para o ciclo 2018-2022: com e sem os efeitos do 3º Termo Aditivo. A diferença exposta entre os cenários é de 3,8 pp para CEG e 23,3 pp para CEG Rio. O resultado final sem os efeitos do termo aditivo aponta para uma redução da margem de distribuição: – 35% para a CEG Rio e -2,5% para CEG.
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Diante dos fatos apresentados, percebemos com apreensão os impactos que seriam causados aos consumidores fluminenses pela proposta da concessionária. Simplificando o entendimento do último Termo Aditivo celebrado, ele repassa ao consumidor uma conta de R$ 391 milhões por uma infraestrutura que não foi construída, um gasoduto fantasma.
A outorga cobrada recompensaria as distribuidoras por não terem conseguido viabilizar a construção dos novos ramais. Adicionalmente, substitui-se os gasodutos não construídos por caminhões, cujos custos operacionais, superiores aos da rede por dutos, são repassados aos consumidores.
Caso o pleito das concessionárias seja acatado, teremos um monopólio “mais-que-perfeito”, que remunera uma infraestrutura que não foi construída. A agência reguladora tem o difícil papel de pacificar este imbróglio até o fim da revisão tarifária em curso, prevista para fevereiro.
O regulador deve preconizar o equilíbrio econômico-financeiro da concessão, sem atribuir, contudo, custos criados em papel aos consumidores. Ao mesmo tempo, evitar nova judicialização, que, no caso de São Paulo, arrasta a revisão tarifária da Comgás há quatro anos.
A competitividade do gás natural deve ser buscada em todos os elos da cadeia produtiva. No setor de distribuição, é imperativo o empoderamento das agências reguladoras estaduais, para que estes agentes tenham independência e competência e possam coibir manobras criativas, que oneram o consumo e bonificam governos e concessionárias. Pensar no longo prazo traz o setor para um ciclo virtuoso, onde todos os elos da cadeia capturarão o potencial de valor do gás natural.
Karoline Cabral e Adrianno Lorenzon são, respectivamente, analista e coordenador de gás natural da ABRACE.