RIO — O Tribunal de Contas da União (TCU) recomendou nesta quarta (25/1) que o Ministério de Minas e Energia avalie a possibilidade jurídica de não contratar parte das termelétricas a gás natural imposta pela lei de desestatização da Eletrobras.
A área técnica da corte de contas concluiu que, apesar de prevista em lei, a contratação compulsória dos 8 GW, a serem instalados em regiões específicas do interior do país, sobretudo em áreas não atendidas por gasodutos, não tem respaldo técnico. Além disso, fere princípios legais e constitucionais que regem a administração pública e o setor elétrico — como os da eficiência, defesa do consumidor e livre concorrência.
O relator Benjamin Zymler citou, dentre outros pontos, a carência de estudos sobre as consequências tarifárias da contratação das térmicas e sobre os efeitos ambientais da construção dos gasodutos que atenderão às usinas.
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Além disso, contestou a falta de critérios claros na divisão de quantos gigas serão contratados em cada região. E destacou que, atualmente, não existe estudo oficial indicando a necessidade sistêmica para contratação dos 8 GW na modalidade energia de reserva para início de suprimento entre 2026 a 2030, como previsto na lei.
“O Poder Legislativo acabou adentrando num terreno técnico que incumbe ao MME, à Aneel [Agência Nacional de Energia Elétrica]: a ideia de regulação do setor de energia elétrica”, argumentou Zymler.
Ao TCU, cabe apenas recomendar
O relator afirmou que o TCU tem limites de competência para lidar com o assunto. E citou o entendimento do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, de que não cabe ao Tribunal de Contas exercer o controle difuso de constitucionalidade nos processos sob sua análise. Daí a decisão de apenas recomendar o MME.
“Eu, me colocando na posição do MME, estaria absolutamente tentado a buscar em cada caso concreto a não aplicação da literalidade da lei. Mas não posso impor a eles isso que imagino que faria”, comentou Zymler, em seu voto.
Zymler também mencionou que dará ciência ao Ministério Público Federal (MPF) e associações de consumidores de energia para que eles avaliem a possibilidade de entrar com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) no STF questionando a lei de privatização da Eletrobras.
A análise do TCU é uma resposta a um pedido do deputado federal Elias Vaz (PSB/GO), encaminhado por meio da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara.
No radar do governo
A contratação compulsória dos 8 GW térmicos previstos na lei sofre oposição das associações de consumidores e ambientalistas.
O assunto esteve no radar também do gabinete de transição de governo, no fim de 2022. O programa de governo de Lula, aliás, faz oposição à própria privatização da Eletrobras.
Nas discussões do grupo de energia do gabinete de transição, o coordenador do grupo de trabalho de Minas e Energia, Maurício Tolmasquim, defendeu diversas vezes que é preciso rever a contratação compulsória de térmicas — que tendem a encarecer a tarifa, na visão dos grandes consumidores.
Durante os debates do gabinete, foi feita uma defesa pela edição de uma medida provisória revogando a obrigação com as térmicas inflexíveis. Essas informações foram antecipadas em novembro, pelo político epbr.
“Na energia elétrica, a principal preocupação diz respeito à mitigação das consequências negativas da privatização da Eletrobras sobre as tarifas do setor elétrico, em função do processo de “descotização” e da concentração de poder de mercado em uma empresa privada”, diz o relatório do grupo de transição.