Agendas da COP

Primeiros 100 dias de governo devem priorizar redução de emissões, avalia sociedade civil na COP27

Desmatamento zero e agricultura de baixo carbono são as principais medidas para Brasil conter emissões de gases do efeito estufa até 2030

Primeiros 100 dias de governo devem priorizar redução de emissões, avalia sociedade civil na COP27. Na imagem, Abertura da programação do Brazil Climate Action HUB, na COP27 (Foto: Eduardo Carvalho/Brazil Hub)
Abertura da programação do Brazil Climate Action HUB, na COP27 (Foto: Eduardo Carvalho/Brazil Hub)

BRASÍLIA — Organizações da sociedade civil avaliam que os primeiros 100 dias do novo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) devem priorizar o desmatamento zero e a agricultura de baixo carbono para que o Brasil consiga cumprir a meta de reduzir emissões de gases do efeito estufa até 2030.

Esse foi o tom dado por pesquisadores nesta quarta (9/11) no Brazil Climate Action Hub, espaço da sociedade civil na COP27, em Sharm El-Sheikh, Egito.

A meta brasileira no Acordo de Paris prevê redução das emissões líquidas em 37% até 2025 e em 50% até o início da próxima década, tendo como base as emissões do país em 2005.

Diferente de outros países, em que a maior fonte de emissão é a queima de combustíveis fósseis, no Brasil, o problema — e a solução — está nos setores de mudanças de uso da terra e agropecuária, que respondem por quase 75% das emissões nacionais.

Dados do Seeg, divulgados no início de novembro, registraram em 2021 o maior aumento em 19 anos das emissões no Brasil, puxadas pelo avanço do desmatamento, arroto do boi, manejo e degradação do solo.

Soluções à mão

Para os pesquisadores, a saída para a redução das emissões no país estaria mais “à mão” com a implementação e a retomada de medidas ambientais já existentes para zerar o desmatamento e com o investimento em agricultura de baixo carbono.

“Olhar para essa realidade é a maneira mais barata e eficiente de reduzir as emissões no Brasil”, observa Ane Alencar, diretora de Ciência do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) e coordenadora do MapBiomas Fogo.

“A Amazônia representa 77% das emissões brasileiras por mudanças de uso da terra, sendo que 91% dessas emissões está diretamente associado à conversão da floresta para a agropecuária, e têm como principal frente de expansão a ocupação de terras públicas por meio da grilagem”, completa.

Entre as medidas sugeridas para reverter o desmatamento, ela elenca a retomada de um papel fortalecido do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis); o resgate do PPCDAm (Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal); e o restabelecimento do Fundo Amazônia, como determinado pelo STF na última semana.

Para a redução das emissões na agropecuária, seriam necessários investimentos financeiros com foco na ampliação do Plano ABC (Agricultura de Baixa Emissão de Carbono), indica Marina Piatto, diretora executiva do Imaflora.

“71% de todo metano emitido no Brasil vem da agricultura, então, se a gente ataca o metano e o desmatamento, já resolve muito do nosso problema. Acabar com o desmatamento reduziria 50% das emissões brasileiras, e se eliminar o metano, são outros 25% a menos”.

Além disso, a pesquisadora afirma que há espaço para a aprimorar o manejo do gado.

“Com melhoria da digestibilidade animal, por exemplo, para diminuir a fermentação [que resulta no arroto do boi]. O desafio do agro é o investimento para essa transição tecnológica descarbonizada”.

Distante da meta

O Brasil é o 4° país que mais emitiu gases do efeito estufa desde 1850. Sua meta de redução de emissões na Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC, na sigla em inglês) ao Acordo de Paris tem como ano base 2005, quando o Brasil liberava 2,4 bilhões de toneladas líquidas de poluentes.

Quando assinou o acordo, em 2015, o país emitia 1,4 bilhões de toneladas líquidas de carbono equivalente ao ano.

“Hoje, estamos em 1,7 bilhões de toneladas [líquidas] emitidas por ano e a meta para 2025 é reduzir para 1,6 bilhões. Neste momento, o Brasil está se distanciando do objetivo”, aponta Tasso Azevedo, coordenador técnico do Observatório do Clima e coordenador geral do Seeg.

Ele explica que quando foi estipulada a meta para 2025, o Brasil já estava abaixo dela.

“Ou seja, essa meta previa, na verdade, aumentar a emissão e não reduzir. Para alcançar o compromisso de 2030 estamos mais distantes ainda. Isso significa que o Brasil precisa fazer um esforço importante agora”.

As metas do Acordo de Paris têm o objetivo em comum de limitar o aumento da temperatura média do planeta em 1,5°C em relação aos níveis pré-industriais — hoje, o aquecimento global está em 1,1°C.

Cientistas das Nações Unidas alertam que a falta de progresso nas ações climáticas coloca o mundo no caminho de uma elevação de até 2,8°C.

Apesar das projeções pessimistas, Azevedo acredita que ainda é possível cumprir uma meta alinhada ao limite de 1,5ºC até 2100.

“[O Brasil] pode chegar a 1 bilhão de toneladas em emissões líquidas se conseguirmos atender às metas de redução do desmatamento e da agricultura de baixo carbono. A agricultura de baixo carbono no Brasil tem que ser tratada como regra e não como a exceção.

Outra iniciativa para guiar as ações pelo clima no Brasil é a Política Nacional sobre Mudança do Clima. Desde a implementação em 2010, o país aumentou em 43% as emissões de gases do efeito estufa, “especialmente por conta do desmatamento”, lembra o coordenador.