Armazenamento de CO2

Regras para CCS no Combustível do Futuro diminuem riscos para projetos no Brasil, avalia setor

Pela proposta aprovada no Senado, ANM e ANP terão que definir juntas as prioridades para uso de blocos de armazenamento de CO2; emenda atende indústria do carvão

Regras para CCS no Combustível do Futuro diminuem riscos para projetos no Brasil, avalia setor (Foto: Jonas Pereira/Agência Senado)
Plenário do Senado Federal durante sessão deliberativa ordinária (Foto: Jonas Pereira/Agência Senado)

CORREÇÃO: A emenda do senador Esperidião Amin (PP/SC) foi acolhida apenas parcialmente, sem o compartilhamento de papeis da ANP e ANM na definição de prioridades para uso de áreas para armazenamento de CO2.


RIO – O Projeto de Lei 528/2020, conhecido como PL do Combustível do Futuro deixou para o Ministério de Minas e Energia a responsabilidade de definir prioridades para o uso de áreas destinadas ao armazenamento de CO2 no Brasil.

O capítulo que trata das regras para captura e armazenamento de carbono (CCS) incorporou ainda elementos do PL 1425/2022, de autoria do ex-presidente da Petrobras e ex-senador Jean Paul Prates (PT/RN), como a transferência de responsabilidade de longo prazo pelo CO2 armazenado e a outorga no prazo de 30 anos.

O PL de Prates, dedicado ao CCS, passou pelo Senado e comissões da Câmara, o que motivou o aproveitamento de trechos já debatidos e com apoio de parlamentares e indústria.

Segundo agentes do setor, as mudanças incorporadas no Combustível do Futuro trazem mais segurança jurídica para projetos de armazenamento de CO2 no país, ao dar mais clareza sobre as responsabilidades nas operações de CCS. 

Setor de carvão buscou inclusão da ANM

O texto aprovado pelos senadores acolheu parcialmente uma emenda de Esperidião Amin (PP/SC), que buscava incluir a Agência Nacional de Mineração (ANM) no compartilhamento com a ANP da responsabilidade de definir quem teria prioridade em um caso de disputa por área para armazenar CO2.

A ANM ficou fora da versão final, no entanto. Quando houver mais de uma empesa interessada na mesma área, caberá ao MME decidir, após ouvir as diferentes partes — o que pode incluir a agência reguladora do setor mineral.

A emenda atendia a um pedido da indústria carbonífera, majoritariamente concentrada em Santa Catarina, estado de Amin. 

“Precisávamos de um texto mais claro para evitar conflitos futuros”, afirmou à agência eixos Fernando Luiz Zancan, presidente da Associação Brasileira do Carbono Sustentável (ABCS) – antiga Associação Brasileira de Carvão Mineral –, que estava otimista com a inclusão da ANM no processo de desempate. 

O objetivo era evitar impasses futuros em áreas onde tanto atividades de mineração quanto de exploração de hidrocarbonetos estejam em andamento.

“O operador das minas de carvão é quem conhece os reservatórios e suas características, por isso a ANM precisava estar envolvida”, defende o presidente da ABCS.

Para Isabela Morbach, cofundadora e diretora da CCS Brasil, o novo texto traz maior clareza nessa definição, caso haja pedidos de injeção de CO2 para um área que já esteja sob concessão. 

“Isso estabelece uma governança na escolha de quem tem prioridade em determinadas áreas”, afirma.

O texto também traz critérios de desempate, caso haja mais de um interessado no bloco de armazenamento. 

Na hipótese de inviabilidade de compatibilização da demanda entre os requerentes, a ANP deverá priorizar propostas com maior capacidade de remoção de CO2 e descarbonização de suas atividades. 

Transporte de CO2

Outra mudança no texto foi a troca do termo “transporte de CO2” para “movimentação de CO2”. 

“Havia uma preocupação de confundir transporte de CO2 com transporte de gás natural e todos os problemas que o transporte de gás natural já enfrentou”, explica a diretora da CCS Brasil.

A mudança foi resultado de um pedido da Petrobras que, segundo apuração do eixos PRO (serviço de assinatura exclusivo para empresas), chegou a dizer que a manutenção do termo “transporte” inviabilizaria seus futuros projetos de hubs de CCS

Entretanto, fontes consultadas pela agência eixos entendem que a mudança não tem um efeito real.

Transferência de responsabilidade 

Para Isabela Morbach, uma das principais inovações do texto é a clareza sobre a transferência de responsabilidade de longo prazo pelo CO2 armazenado, o que diminui os riscos para os operadores.

Ela ressalta que tal medida já é uma prática comum em países como Noruega, Canadá, Austrália e Reino Unido.

A transferência de responsabilidade nas operações de CCS é um processo pelo qual a responsabilidade legal pelo armazenamento permanente de carbono capturado é transferida do operador do projeto, geralmente uma empresa, para uma entidade governamental ou outro órgão designado, após o encerramento das atividades de injeção de CO2.

Essa etapa ocorre uma vez que o local de armazenamento foi fechado e se considera que o CO2 armazenado está seguro e confinado, minimizando o risco de vazamentos.

Reforço da ANP 

Morbach ainda elogiou a decisão de definir a ANP como a autoridade reguladora, mas alertou para a necessidade de reforço da agência.

“As competências da ANP estão sendo muito alargadas, porque possui um corpo técnico com expertise que consegue compreender essas novas tecnologias, mas ao mesmo tempo são muitas novas atividades sob competência da agência”, diz Morbach.

“Existe uma preocupação geral. Essas novas resoluções vão demandar um esforço muito grande da ANP. Precisamos fortalecer o orçamento e reforçar os recursos humanos. Por mais boa vontade, eles têm um limite físico”, completa.

O presidente da ABCS também demonstrou preocupação sobre o aumento da carga regulatória sobre a agência, que além do CCS, e outros temas do Combustível do Futuro, também ficará incubida de regular o hidrogênio.

“A ANP já tem uma sobrecarga de responsabilidades e precisará de mais recursos e pessoal para lidar com as regulamentações,” defende Zancan.