A Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (Proteste) ajuizou ação civil pública pedindo a suspensão do leilão de reserva de capacidade (LRCAP 2025), marcado para 27 de junho.
A entidade questiona principalmente a inclusão do “fator A” no cálculo de preços, que considera prejudicial para usinas termelétricas em ciclo combinado.
O processo foi protocolado na 17ª Vara Federal do Distrito Federal e pede que todos os atos sejam refeitos desde a portaria 100/2025 (que inseriu o critério no cálculo), conforme noticiado pelo site Megawatt.
“Fator A”
As diretrizes publicadas pelo MME para o LRCAP preveem um cálculo para determinar o nível de flexibilidade de operação das usinas, o chamado “fator A”. Trata-se de uma variável do preço que avalia o início (despachabilidade) e o término de funcionamento de uma usina (duração de despacho). Quanto maior o fator A — usinas mais rápidas e confiáveis em atender à demanda quando acionada — maior será o preço de disponibilidade, que é pago às usinas para que elas fiquem prontas para gerar energia quando o sistema precisar (como um “seguro” contra faltas de energia). Usinas com alta flexibilidade operativa (alto Fator A) serão mais competitivas no leilão, mas o custo para o sistema (e consumidor) será maior.
Segundo a publicação, a Proteste argumenta que o fator A reduz artificialmente a competitividade das termelétricas em ciclo combinado, que, de acordo com a associação, são “mais eficientes, ambientalmente adequadas e operacionalmente baratas que as usinas termelétricas que operam em ciclo aberto”.
Com os questionamentos e ações judiciais recentes, a Associação Brasileira de Grandes Consumidores de Energia (Abrace) enviou na segunda-feira (31/3) um ofício ao Ministério de Minas e Energia sugerindo o adiamento do certame e a abertura de nova consulta pública.
“Avançar nessas condições representa um risco significativo, podendo resultar em custos bilionários desnecessários que serão repassados aos consumidores de energia”, alerta a carta da representante dos grandes consumidores.
A Abrace propõe dividir a contratação em duas etapas. “Seria prudente dividir a contratação de potência em dois momentos distintos: um certame ainda neste ano para contratação dos produtos de 2025 e 2026, e um segundo leilão no próximo ano, com regras mais bem definidas, otimizando a contratação dos demais produtos planejados”, defende.
A entidade destaca a necessidade de ajustes no fator A; comprovação mais rigorosa da cadeia de suprimentos sobretudo para biocombustíveis; possíveis impactos no transporte de gás natural, e consequentemente na cadeia de energia elétrica; e o risco de baixa contratação de produto hidrelétrico.
Segundo a associação, ajustes nas regras são necessários para evitar distorções no longo prazo.
Tanto a Proteste quanto a Abrace defendem maior participação da sociedade nas decisões sobre o modelo de contratação do leilão.
Questionamentos e ações judiciais
Até agora, o certame já enfrentou duas liminares no Superior Tribunal de Justiça (STJ) que questionaram as diretrizes elaboradas pelo MME.
Após pedido da Eneva, o STJ concedeu liminar para suspender os critérios de flexibilidade do leilão de reserva de capacidade na sexta-feira (28/3).
O ministro Gurgel de Faria entendeu que a introdução do fator A pode causar desequilíbrios ao certame.
Na ação judicial, a Eneva afirma que a inclusão desse mecanismo é inédita e não deveria ter ocorrido sem uma consulta pública para debater o tema.
Em uma primeira liminar, de 13 de março, o ministro Sérgio Kukina decidiu favoravelmente aos geradores e derrubou o teto do Custo Variável Unitário (CVU) para usinas a biodiesel, revertendo o valor de 1.711,18 reais por MWh para 2.639,99 reais por MWh, preço inicialmente previso.
O LRCAP 2025 está estruturado em seis rodadas, cada uma correspondendo a um ano entre 2025 e 2030. As três primeiras rodadas contratarão apenas potência termelétrica, enquanto as últimas incluirão também hidrelétricas.
Na semana passada, a própria Abrace havia criticado as ações judiciais contra o leilão, por entender que “mais uma vez, pequenos grupos insistem em buscar benefícios específicos que comprometem o funcionamento do setor”.
A associação dos grandes consumidores lembra que o primeiro leilão do tipo, realizado em 2021, já enfrentou problemas semelhantes de judicialização, quando usinas fora do escopo original foram habilitadas por decisões judiciais.
O MME ainda não se pronunciou sobre os pedidos de revisão das regras.